Câncer: congresso científico expõe sucesso de terapias personalizadas
Professor comenta as principais novidades apresentadas no maior evento internacional voltado ao controle do câncer
Os avanços da medicina não param. Prova disso está na oncologia, que vive uma verdadeira revolução. Evoluímos do tempo que tratávamos os tumores da mesma maneira. Agora dispomos de tratamentos personalizados, desenvolvidos a partir do perfil molecular de cada câncer.
Com os testes moleculares, recebemos mais informações sobre o que iremos tratar: como se fossem o nome, o sobrenome, o endereço e o telefone do tumor. A partir de então, podemos definir a melhor terapia.
O último Congresso da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO, em inglês), em Chicago, nos Estados Unidos, comprovou essa tendência. Em meio a tantas novidades, destaco aqui algumas abordagens terapêuticas para diferentes tipos de câncer que foram apresentadas no evento.
O estudo PROSPECT mostrou ser possível tratar alguns pacientes com câncer de reto localmente avançado sem usar a radioterapia. Para isso, é preciso intensificar a quimioterapia. A radioterapia é uma boa forma de tratamento, mas pode produzir efeitos colaterais na própria porção final do aparelho digestivo e na bexiga, podendo gerar disfunções sexuais e, principalmente na mulher, infertilidade.
A estratégia avaliada está restrita por ora a grupos que tenham câncer de reto mais inicial, com classificações específicas por exames de imagem (cT2N+, cT3N- e cT3N+).
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O congresso também trouxe boas perspectivas para pessoas com câncer de pulmão de não pequenas células com mutação no receptor do fator de crescimento epidérmico, o EGFR. Dados inéditos do estudo ADAURA revelaram que a aplicação de quimioterapia seguida de um medicamento chamado osimertinibe reduziu em 51% o risco de morte pela doença.
Um tratamento promissor para os casos de câncer de mama inicial foi apresentado no ASCO. Uma das características do tumor de mama é a presença (ou não) de receptores hormonais e a existência excessiva (ou não) da proteína denominada HER2. Um estudo apontou que a combinação de ribociclibe com a terapia hormonal habitual pode reduzir em 25% a taxa de recaída em mulheres com receptores hormonais positivos e HER2 negativo com alto risco de recidiva e tumores com mais de 2 centímetros sem o comprometimento de gânglios ou com metástase (disseminação) ganglionar. Cerca de 70% dos casos iniciais da doença têm essas características. São pacientes com risco de recorrência mesmo após cinco anos do diagnóstico.
Em outro departamento, assistimos a inovações para gliomas de baixo grau, um tipo de câncer que afeta o cérebro e a medula em adultos jovens. Boa parte dos tumores tem uma alteração molecular do gene IDH1 ou IDH2. O tratamento tradicional consiste em observar a evolução do quadro após cirurgia e, quando necessário, seguir com radioterapia.
Um estudo mostrou que o uso da medicação vorasidenibe posterga em 28 meses a necessidade de radioterapia. Não é a cura, mas melhora a qualidade de vida e o controle da doença.
Esses e outros exemplos evidenciam a evolução dos tratamentos oncológicos e confirmam o sucesso das terapias personalizadas. Dessa maneira, oferecemos abordagens ainda mais individualizadas com melhor perspectiva de eficácia para os pacientes.
* Paulo Hoff é oncologista, presidente da Oncologia D’Or, professor titular da Disciplina de Oncologia Clínica do Departamento de Radiologia e Oncologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e membro pregresso do Conselho Diretor da ASCO