Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana
Imagem Blog

José Casado

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Informação e análise
Continua após publicidade

Mudanças

Senado avança no projeto de novo código de leis para a vida em sociedade

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 3 jun 2024, 17h02 - Publicado em 5 abr 2024, 06h00

Terminava a aula na faculdade sobre direito de família quando viu um “zap” da mãe. Telefonou, e ouviu:

— Meu filho, eu recebi uma notícia sobre a reforma do Código Civil…

Não era uma especialista em direito, mas, como toda mãe, conhecia o sentido da palavra “maternidade” muito mais que juízes e professores de direito — caso do filho Pablo Stolze Gagliano, 50 anos, integrante da comissão do Senado responsável pela revisão do Código Civil.

— Sim — ele respondeu, intrigado.

— Aborto, meu filho?

— Minha mãe… — apelou com acento baiano. — Não. Não, não tem aborto, não há nenhum tipo de reconhecimento de aborto.

Continua após a publicidade

— Meu filho, casamento poligâmico? Três pessoas vão casar?

— Não, minha mãe, não há nada em relação a isso.

— Mas, Pablo, e essa “família multiespécie”?

Fez um breve silêncio e replicou suave:

Continua após a publicidade

— Minha mãe, a senhora sabe o que é “família multiespécie”?

— Não.

Era mais uma vítima das notícias falsas sobre o trabalho da comissão do Senado. Ele explicou: a novidade sociocultural dos laços afetivos de humanos com seus animais requer normas claras no direito de família, e isso é parte da discussão no projeto para os senadores.

Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, reuniu 38 juristas para rascunhar uma consolidação de leis, preceitos, normas e regulamentos sobre direitos civis. Depois de 16 190 horas de debates, na contagem da semana passada, chegaram a um consenso sobre o texto básico com meio milhar de artigos. Não foi fácil. A certa altura dos debates, alguém lembrou do sábio aviso do maestro Quincy Jones pendurado na porta do estúdio durante a gravação do hit We Are the World: “Deixe seu ego do lado de fora”. O resultado superou expectativas.

Continua após a publicidade

“Senado avança no projeto de novo código de leis para a vida em sociedade”

Prepara-se uma espécie de constituição do direto privado para brasileiros, estrangeiros ou asilados, sintonizada com os tratados internacionais subscritos pelo país. São normas para a sociedade. Abrangem desde os embriões ao nascimento; das famílias (em pluralidade de modelos) ao casamento; das relações de consumo, negócios e patrimônio aos contratos empresariais; dos chamados neurodireitos (privacidade mental e liberdade cognitiva) ao uso e abuso de inteligência artificial. Enfim, regulam diretos e deveres dos indivíduos durante a vida nos mundos real e virtual e, também, depois da morte encefálica, com regras sobre doações de órgãos e herança digital.

A versão atual do Código Civil reflete usos e costumes de um mundo de cinco décadas atrás, quando o regime militar exterminava opositores, roqueiros estreavam no Festival de Woodstock (EUA) e o professor Miguel Reale com seis juristas começavam a trabalhar no projeto. A rádio corredor espalhou a notícia na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Giselda Hironaka tinha 19 anos e ouviu na sala de aula. Especialista em direito sucessório familiar, agora integra a comissão do Senado que revisa o código inspirado por Reale e equipe: “Eram sete e levaram mais ou menos cinco anos para entregar o anteprojeto. Hoje, somos 38 e vamos entregar a proposta em 180 dias”, lembrou numa das reuniões. A internet mudou tudo. E, pela primeira vez, mulheres têm voz e vez nas normas sobre a vida em sociedade, da gravidez à herança.

Os juristas levam o texto ao presidente do Senado na semana que vem. A partir daí começa o debate legislativo, incerto na duração, no conteúdo e com previsível mobilização da miríade de grupos de interesses nos novos “mandamentos” sociais. Evidentemente, o rascunho do novo código não é perfeito (está acessível na página da comissão do Senado). Mas tem virtudes. Uma delas é a atualização dos limites do Estado e da lei em relação ao indivíduo e seu comportamento. Num mundo onde é impossível conhecer todas as regras de direito, propõe a regulação social essencialmente a partir de princípios e valores. Por exemplo, na redefinição do que é família na legislação — do casal aos núcleos de pais e mães “solo” ou de parentes, com base no afeto e sem vínculos sanguíneos.

Continua após a publicidade

O grande desafio é a arquitetura de um código para a vida de fácil compreensão coletiva. Alemanha, França e Argentina já fizeram. Agora a vez é do Brasil. Em todos os lugares a ambição é sempre a mesma, o impossível: chegar perto do modelo de linguagem simples e acessível dos Dez Mandamentos.

Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

Publicado em VEJA de 5 de abril de 2024, edição nº 2887

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.