Ano novo, estatal nova. Entrou em operação, em Brasília, a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional S.A. (ENBPar), do Ministério das Minas e Energia.
É a segunda criada por Jair Bolsonaro em três anos — a primeira foi a NAV Brasil Serviços de Navegação Aérea S.A.
A EBNPar assume o controle da Eletronuclear, dona das usinas de Angra, e da metade brasileira na hidrelétrica Itaipu, empreendimento binacional em parceria com o Paraguai.
Vai gravitar nas órbitas da Marinha, responsável pelo desenvolvimento de tecnologia nuclear, e da burocracia barrageira da Eletrobras, que em junho completa 60 anos de existência.
A EBNPar e NAV Brasil passam a integrar a constelação de empresas públicas. O número companhias varia conforme o método de cálculo.
Em dezembro de 2019, por exemplo, o Ministério da Economia informou a existência 46 empresas e 152 subsidiárias sob controle direto da União.
Além dessas, existiam 218 sob “influência significativa” do governo, “mas sem ter o controle”. E ainda 208 outras “com mera participação” da União entre os acionistas.
O governo era recém-nascido, e o então secretário de Desestatização, Salim Matar, explicava: “Em janeiro, quando assumimos, encontramos 134 estatais. Fizemos uma revisão nos números e, decorridos esses primeiros nove meses, encontramos mais de 600 negócios nos quais o governo tem participação.”
A investigação interna, alegou, tinha a transparência como objetivo “para que a sociedade saiba onde o dinheiro do pagador de impostos foi investido”.
Empresário e patrono do Instituto Liberal, Mattar calculava em 470 mil o número de funcionários nessas empresas e em R$ 1,2 trilhão o valor dos ativos da União passíveis de privatização — nessa conta incluía as ações do Tesouro na Petrobras. Seis meses mais tarde, estava de volta à sua empresa de aluguel de carros.
Abandonou Brasília, porque desistiu de Bolsonaro, contou na época: “O governo não é liberal. Eu acreditei no candidato Bolsonaro, no candidato que falava em privatizar a ‘TV da Dilma’, a empresa do trem-bala. Mas foi só um discurso de campanha”.
Em 2018, duas semanas antes do primeiro turno eleitoral, Bolsonaro embalava ilusões neoliberais de seus eleitores, magnetizados pela solidariedade com o candidato vitimado num atentado à faca.
Às 6h17 do domingo, 23 de setembro, usou uma rede social para revalidar promessas: “Assumi compromisso de reduzir número de ministérios, extinguir e privatizar grande parte das estatais que hoje existem. São gastos desnecessários que devem atender à população. Recusar acordões que negociam cargos em troca de apoio já faz parte deste objetivo.”
Dezessete meses depois, o secretário de Desestatização jogou a toalha: “Não querem privatizar para continuar o toma lá dá cá”, disse Mattar.
Bolsonaro chegou ao último ano de mandato com 23 ministérios e sem uma única privatização. Ao contrário, criou duas novas empresas, a EBNPar e NAV Brasil, e uma autarquia, a Autoridade Nacional de Segurança Nuclear.
Vai à luta pela reeleição esgrimindo com a mesma carta de intenções que encantou liberais como o empresário Mattar em 2018 – era anexo uma desbotada lista de ativos para venda (Eletrobras, Correios, Casa da Moeda, Telebras, Codesp, EBC, Lotex, Serpro, Dataprev, CBTU, Trensurb…).
Se tiver sorte, consegue levar a Eletrobras à leilão ainda neste ano, e ainda assim o ritual de contrato somente seria concluído em 2023, sob novo governo.
O clima, hoje, é de insegurança. Bolsonaro derrete nas pesquisas e o PT de Lula, líder nas sondagens, tem anunciado a intenção de desfazer privatizações.
Como Bolsonaro não fez nenhuma, sobram aquelas privatizadas pelo próprio PT: foram 18 as estatais vendidas no ciclo Lula-Dilma. Seria uma revogação do próprio passado.