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Informação e análise
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De lapso em lapso, Bolsonaro se exibe em flertes com a derrota

No debate com Lula, se disse "pronto para mais um mandato de deputado". Antes, no Rio, falou sobre eventual candidatura à prefeitura carioca em 2024

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 29 out 2022, 10h00

Jair Bolsonaro merece ser estudado. Candidato à reeleição, terminou assim o debate de ontem na Rede Globo: “Muito obrigado, meu Deus, e se essa for a sua vontade, estarei pronto para cumprir mais um mandato de deputado federal… presidente da República.”

Erros acontecem, naturalmente, depois de duas horas e meia de confronto com um adversário com 33 anos de experiência nesse tipo de embate político. Bolsonaro passou 27 anos na Câmara, mas, como costuma dizer, era um deputado do baixo clero sem audiência, discursava “para as paredes”.

Foi, porém, o seu segundo lapso nesta semana decisiva. Três dias antes, em comício no Rio, criticava o prefeito carioca Eduardo Paes, quando avisou: “Ele vai ter o troco lá em 2024.”

Os aliados se surpreenderam com Bolsonaro anunciando, na reta final da eleição presidencial, a disposição de disputar com Paes a prefeitura do Rio dentro de dois anos.

Na cidade que é sua base política, ele liderou o primeiro turno deste ano com 1,6 milhão dos votos (47% do total). Perdeu 500 mil votos em relação à primeira rodada de 2018.

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Ontem, o prefeito Paes divulgou um video em resposta às críticas, com uma ironia sobre o desafio para a próxima disputa municipal: “Presidente, não estou preocupado com 2024, não. Mas eu te garanto, quando a gente chegar lá, pode ter certeza que eu não vou pedir voto impresso, que eu não vou querer processar institutos de pesquisa e, muito menos, pedir para adiar as eleições. Deixa eu te falar uma coisa: como você vai perder [amanhã] domingo, você disputará contra mim aqui em 24. Vamos ver se a gente se enfrenta na urna. E vamos ver quem vai ganhar.”

Lapso ou não, Bolsonaro termina a campanha de reeleição mencionando duas possibilidades sobre o próprio futuro: se candidatar à prefeitura carioca dentro de 48 meses ou a um mandato de deputado em 2026.

As duas hipóteses embutem um flerte, talvez involuntário, com o risco de derrota amanhã. Se acontecer, disse à repórter Renata Lo Prete, da Globo, não há motivo para supor que irá hesitar na proclamação do resultado: “Não há a menor dúvida, euem tiver mais voto leva. É isso que é democracia.”

No primeiro turno, Bolsonaro superou as próprias expectativas ao extrair das urnas 51 milhões de votos – 1,8 milhão a mais do que obteve na primeira rodada eleitoral de 2018.

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Não é pouco para um candidato à reeleição prisioneiro da memória coletiva sobre o desastre governamental na pandemia, com mais de 688 mil mortes conhecidas até ontem à noite.

Foi uma proeza para um presidente cuja palavra já havia perdido o crédito da maioria, informam as pesquisas, e que atravessou os últimos 15 meses rejeitado por mais da metade do eleitorado, principalmente mulheres e pobres — majoritários nas urnas.

Na campanha do segundo turno, porém, Bolsonaro perdeu o foco, a bússola, o rumo e o objetivo.

A sucessão de trapalhadas cometidas nos últimos 26 dias sugere um candidato decidido a trocar a meta principal — ganhar a eleição — pela transmissão de uma insólita mensagem ao eleitorado: seu nome é Messias e tem a missão de “resgatar” a nação, ainda que pelo tumulto, a subversão do processo eleitoral, testando limites de uma ruptura institucional, para garantir a permanência no poder.

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Não contestou os 51 milhões de votos obtidos no domingo 2 de outubro. Em silêncio, rendeu-se ao sistema de votação eletrônica sobre o qual semeou desconfiança quase diariamente, durante três anos.

Na semana seguinte voltou a insinuar fraude, sem provas como sempre, indicando que teria superado Lula nas urnas, embora tivesse perdido por uma diferença expressiva de seis milhões de votos – três vezes o eleitorado de Belo Horizonte.

Desenhou um roteiro de campanha norteado pela ideia de confronto. Foi a Belém no Círio de Nazaré sob protestos da hierarquia católica e em aberto desafio ao governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), que acabara de ser reeleito com 70% dos votos válidos. Isolado numa corveta da Marinha, divulgou uma fotografia com a estranha legenda: “Sírio”.

Enquanto isso, sua mulher, Michelle, fazia um tour eleitoral por comunidades evangélicas de cinco estados com a ex-ministra Damares Alves, senadora eleita pelo Distrito Federal. Em Goiânia, Damares se meteu em grande confusão ao tentar criar um “fato” novo para a campanha presidencial. Descreveu para uma plateia com crianças detalhes sórdidos de uma fantasiosa rede amazônica de pedofilia. Como sempre, ela não apresentou provas.

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Na sequência, Bolsonaro foi à festa de Aparecida. Criou agitação na basílica. Do lado de fora, seus apoiadores ofenderam sacerdotes e romeiros fiéis da padroeira do Brasil. O arcebispo Orlando Brandes cobrou-lhe identificação religiosa: “Ou somos evangélicos ou somos católicos.”

Viajou ao Recife para um comício em estacionamento de hotel, onde não juntou duas mil pessoas. Completou a quinzena contando em entrevista que “pintou um clima” quando encontrou adolescentes venezuelanas na periferia de Brasília.

Demorou na reação às notícias sobre o projeto governamental para, em caso de vitória, deixar o salário mínimo e a aposentadoria sem correção da inflação anual. O plano existia e sua divulgação provocou efeito corrosivo. As pesquisas captaram aumento nas intenções de voto do adversário Lula no eleitorado de baixa renda.

Sem a ajuda esperada do Ministério da Defesa, cuja “auditoria” não conseguiu demonstrar suposta fraude nas urnas eletrônicas, mobilizou o governo para desqualificar pesquisas eleitorais. Resultou num pedido de CPI na Câmara.

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Calou-se quando o antigo aliado Roberto Jefferson, até então dono do PTB, divulgou um video com ofensas à juíza Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal. No dia seguinte, Jefferson atacou a tiros de fuzil e granadas uma equipe de agentes federais que cumpria mandado de prisão ordenado pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Bolsonaro, primeiro, deu mais ênfase à crítica ao tribunal do que às tentativas de homicídio do aliado (dois policiais ficaram feridos). Enviou o ministro da Justiça para “negociar” a prisão, sob risco de crime de prevaricação. Cinco horas mais tarde, jogou a toalha e qualificou o aliado como “bandido”.

Estava em campanha em Minas, 48 horas depois, quando foi avisado sobre uma suspeita de fraude na veiculação da sua propagando eleitoral no Nordeste.

Convocou reunião de ministros e chefes militares para discutir o caso de oito das 5 mil rádios do país (0,16% do total). Um de seus filhos parlamentares pôs em circulação uma ideia exdrúxula advogada por uma ala do governo: adiamento da eleição.

Todos, Bolsonaro incluído, sabiam tratar-se de um delírio golpista. Seria preciso mudar a Constituição, lembraram chefes militares que ele consultou.

A suspeita sobre a conspirata radiofônica não durou 24 horas, acabou demolida em despacho do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes. Um dos ministros envolvidos, Fábio Faria (Comunicações), declarou arrependimento. Virou mico de fim de campanha.

Do debate “sem-e-nem”, sem pé nem cabeça, com o adversário Lula, restou o segundo lapso da semana de um candidato “pronto para cumprir mais um mandato de deputado federal… presidente da República.”

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