Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, acha que “não existe combate ao crime sem efeito colateral”. Foi como traduziu — e justificou — o banho de sangue na Baixada Santista.
São Paulo é o Estado com recorde de mortes de policiais civis e militares em situação de confronto: foram 7 vítimas em 2021 e 17 mortos no ano passado — aumento de 148%, informa o recém-lançado anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Com a matança na Baixada Santista (14 mortos na contagem até a noite desta terça-feira), a polícia paulista se aproxima do empate com as baixas que sofreu no ano passado na guerra permanente contra facções do crime organizado.
A lógica do governador aplicada à situação permite outras leituras. Uma é a da licença para matar — a revanche da matança sempre é ilegal, mas eventualmente palatável à liderança em zonas “especiais” de combate, como no Haiti, por onde o governador passou quando servia como engenheiro ao Exército brasileiro na missão da ONU.
Outra interpretação possível é a da incapacidade do comando de organizar, planejar e realizar a captura dos assassinos de policiais, acusá-los com as provas necessárias e obter a condenação em julgamento.
Quando acontece, aumentam as chances de um “efeito colateral” mais duradouro — a afirmação do Estado, no exercício do monopólio da força, como provedor de lei e ordem na proteção comunitária.
Dá trabalho, exige sangue-frio da liderança da tropa armada, civil ou militar. Mas, como Tarcísio sabe, até pelo exemplo de alguns dos seus antecessores no Palácio dos Bandeirantes, essa é a rota mais longa e acidentada para obter reconhecimento num eleitorado fatigado pela rotina de violência do crime organizado em confronto permanente com uma polícia desregrada.
Os efeitos colaterais no campo de batalha da Baixada Santista foram uma escolha do governador paulista. Na política, a força costuma suprir a escassez de inteligência.