Um deles está bem vivo, e pode ser visto montando o cavalo da PM na Esplanada dos Ministérios, em meio aos seus apoiadores, bravateando sobre um suposto apoio incondicional das Forças Armadas ao seu governo, em desfavor do STF e do Congresso Nacional; o outro existe apenas como lembrança, nas mentes dos seus fidelíssimos militantes, que se recusam a perceber seu total desaparecimento do mundo real.
Foi o candidato antiestablishment que melhor vocalizou o anti-petismo na campanha de 2018. Foi o candidato que mais alto bradou contra a corrupção sistêmica e, após vencer as eleições, convidou e integrou ao seu governo o ex-juiz Sergio Moro, símbolo do combate aos esquemas criminosos institucionalizados pelos governos anteriores, e personagem-mor da Operação Lava Jato.
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Clique e AssinePois bem: iniciado o governo Bolsonaro, o ano de 2019 foi um desfile de retrocessos e omissões por parte do presidente, tanto nas ações como na retórica.
Aparentemente por conta de problemas com Flavio Bolsonaro, que envolveriam esquemas de lavagem de dinheiro, que por sua vez teriam conexões com a rasteira e desonesta prática de “rachadinhas” (levadas a cabo por seu respectivo gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), o presidente começou a mudar seu comportamento.
Entre inúmeras posturas e medidas que conflitaram frontalmente com a plataforma do candidato Bolsonaro, tivemos sua omissão e silêncio quando o Coaf foi retirado da órbita do Ministério da Justiça de Sergio Moro, a promulgação do pacote anticrime do ministro Moro sem o veto da terrível figura do juiz de garantias, as inúmeras tentativas sem fundamentos de trocar o titular da unidade da Polícia Federal do Rio, a obsessão indisfarçada de exonerar o diretor geral da PF e, por fim, a escandalosa distribuição para o Centrão, de cargos em setores do serviço público com orçamentos bilionários.
Em suma, o Bolsonaro candidato sumiu, dando lugar a um presidente que começa a repetir as mesmas práticas, sem tirar nem pôr, daqueles grupos políticos que seus eleitores se propuseram a apear do poder em 2018.
Todas as intervenções de Bolsonaro na pasta de Moro representaram retrocessos no combate à corrupção.
Moro, que chegou ao governo depois de 23 anos de serviços prestados à magistratura federal, tendo em seu currículo a bem sucedida atuação como juiz da transformadora Operação Lava Jato, aceitou virar ministro do candidato Bolsonaro. Seus objetivos principais eram a implementação de uma agenda anticrime e a consolidação dos avanços do combate à macro-corrupção, evitando riscos de retrocessos. Não conseguiu avançar.
O desfecho já é História: Moro desistiu de malhar em ferro frio e pediu exoneração de seu cargo de ministro, sendo imediatamente tachado de traidor pela turba bolsonarista, que não consegue enxergar que defendem um projeto enterrado pelo próprio presidente, ou melhor, que reverenciam um Bolsonaro que ficou em 2018, e que já não existe mais.