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Jorge Pontes foi delegado da Polícia Federal e é formado pela FBI National Academy. Foi membro eleito do Comitê Executivo da Interpol em Lyon, França, e é co-autor do livro Crime.Gov - Quando Corrupção e Governo se Misturam.
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Cassação de Deltan: o insólito e o Brasil de ponta-cabeça

Por que Bolsonaro é o grande responsável por este cenário atual, de profundos retrocessos, muito mais do que Lula

Por Jorge Pontes
Atualizado em 18 Maio 2023, 17h47 - Publicado em 18 Maio 2023, 17h23

Nesta última terça-feira, 16 de maio, o Brasil assistiu boquiaberto à cassação do mandato do deputado federal eleito Deltan Dallagnol, ex-procurador da República e ex-chefe da força-tarefa da Operação Lava-Jato em Curitiba.

Sabemos que, pela Lei da Ficha Limpa, são inelegíveis por oito anos os membros do Ministério Público que pedirem “exoneração ou aposentadoria voluntária” enquanto estiverem submetidos a Processo Administrativo Disciplinar (PAD).

Ocorre que, quando pediu desligamento do Ministério Público Federal, Deltan Dallagnol não era alvo de nenhum PAD por parte do Conselho Nacional do Ministério Público Federal (CNMP). Havia, sim, algumas reclamações e queixas que efetivamente não eram processos. Esses expedientes, alguns já em fase de sindicâncias, que poderiam (ou não) se transformar em PADs, traziam tão somente a expectativa ou possibilidade de gerar alguma sanção. Enfim, não havia nenhum processo disciplinar instaurado em desfavor do então procurador quando de sua exoneração.

Por outro lado, qualquer estudante de direito sabe que não podemos interpretar extensivamente em matéria sancionatória, a que pune, isto é, que impõe uma pena – no caso em tela, uma cassação. A interpretação extensiva amplia o entendimento sobre aspectos factuais do processo, e acaba alcançando condutas não previstas nos textos legais. Tal interpretação só pode ser utilizada em prol do acusado.

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Se, por exemplo, um determinado dispositivo de lei penal considera como agravantes as lesões corporais cometidas com uso de faca, sabre, peixeira ou espada, um ataque com a utilização de uma lâmina de barbear ou de um canivete não poderia ser enquadrado nesse texto específico. Não se estenderia a interpretação de uma regra para incluir um outro objeto cortante que não se encontra no rol — fechado — descrito pela lei sob utilização. É um preceito consolidado: normas restritivas dos direitos fundamentais não comportam interpretação extensiva. Ponto final.

Logo, no caso examinado pelo TSE, a existência de uma sindicância ou uma reclamação formal jamais poderia ser interpretada extensivamente, de forma a equipará-la a um Processo Administrativo Disciplinar, para punir Deltan. Ou há um PAD, ou, definitivamente, não se pode punir o ex-procurador.

Também é descabido o julgador entender — prospectivamente — que as reclamações e sindicâncias existentes se tornariam processos administrativos disciplinares, e, se isso viesse a ocorrer, que as respectivas punições seriam severas o suficiente para enquadrar Deltan na Lei da Ficha Limpa. Contorcionismos interpretativos não cabem em matéria penal, muito menos para condenar…

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Dito isso, vamos ao aspecto insólito do que se seguiu à notícia da cassação. O deputado Deltan Dallagnol pronunciou-se numa coletiva no Congresso Nacional, e, com razão, queixou-se da injusta decisão do TSE. Cercado por parlamentares bolsonaristas, declarou que os corruptos certamente estavam em festa com sua derrocada. Logo atrás dele, de papagaio de pirata Eduardo Bolsonaro abria um largo sorriso. Todos fingiam ignorar — inclusive Deltan — que três ministros que votaram pela cassação foram nomeados por Bolsonaro. A cena foi um espetáculo de nonsense…

Não podemos deixar de lembrar que a Lava-Jato começou a adernar após 2019. Foram os quatro anos de Jair Bolsonaro na Presidência da República que decretaram o fim do enfrentamento à corrupção no Brasil. O ex-presidente enganou e escorraçou Sergio Moro de seu governo e traiu grande parte dos seus eleitores, que o elegeram em razão de suas promessas de combate à corrupção. Bolsonaro fez ainda péssimas escolhas tanto para a Procuradoria-Geral da República como para o Supremo Tribunal Federal. Bolsonaro foi o túmulo da Operação Lava-Jato.

Em suma, Bolsonaro é o grande responsável por este cenário atual, de profundos retrocessos. Muito mais do que o próprio Lula.

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