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Jorge Pontes

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Jorge Pontes foi delegado da Polícia Federal e é formado pela FBI National Academy. Foi membro eleito do Comitê Executivo da Interpol em Lyon, França, e é co-autor do livro Crime.Gov - Quando Corrupção e Governo se Misturam.

Bolsonaro 2020: a tríplice coroa da desolação

Presidente falhou em três temas de muita importância para os brasileiros

Por Jorge Pontes
Atualizado em 31 dez 2020, 16h00 - Publicado em 31 dez 2020, 14h03

Difícil escolher qual o maior e mais profundo dos vários desastres promovidos por Jair Bolsonaro no ano que se finda hoje.

Mas há, em especial, três campos em que o presidente realmente caprichou na incompetência e na incapacidade. Testemunhamos um verdadeiro hat trick de gols contra, de ações e omissões descabidas, que tangenciarem perigosamente, em diversas oportunidades, condutas criminosas.

Essa tríplice coroa da desolação ocorreu exatamente na condução desastrosa da pandemia da Covid-19 (1), nos retrocessos ao enfrentamento à corrupção sistêmica (2) e, por último, no enfraquecimento e na sabotagem oficial do combate aos crimes ambientais na Amazônia (3).

Três temas que se imbricam e que, coincidentemente, trazem em seu âmago a vida (tanto de seres humanos como da Natureza em geral). Incrível como quando houve vida em jogo, foi exatamente onde mais vividamente aflorou a desfaçatez do presidente.

O primeiro desses fracassos se consubstanciou na insensibilidade constante e na falta de demonstração de um mínimo traço de empatia, a todo momento e a cada manifestação estapafúrdia, com quase duas centenas de milhares de brasileiros mortos pelo coronavírus. Na esteira dessa tragédia, tivemos a troca de dois ministros da Saúde – em meio ao pico da crise – e, agora, o fracasso do seu general pau mandado, o “especialista em logística”, que não conseguiu antever adequadamente a necessidade de aquisição de seringas e agulhas para a tão desejada e necessária vacinação em massa da nossa sociedade. Isso sem falar nas inúmeras vezes que o presidente expôs ao contágio e incentivou a aglomeração de pequenas multidões, promovendo péssimo exemplo para seus seguidores.

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No que tange ao combate à corrupção sistêmica, foram inúmeros os retrocessos – e traições às promessas de campanha – que acabaram provocando, inclusive, a saída precoce de Sergio Moro da pasta da Justiça, ministro que simbolizava exatamente a expectativa de mudanças e transformações nessa área. Entre várias posturas e condutas reprováveis de Bolsonaro, temos a intervenção suspeita na Polícia Federal do Rio de Janeiro, a escolha desastrosa do “Nosso Kassio” para o STF, a aproximação e distribuição de cargos para o Centrão, a utilização privada da ABIN, a presença constante do advogado – investigado – Frederick Wassef no Alvorada, e sua comprovada conexão com o ex-PM picareta Fabrício Queiroz. Tudo tendo como pano de fundo – e provavelmente relação de causa e efeito – com as trapalhadas do senador Flavio Bolsonaro e o processo que investiga a prática de rachadinhas, lavagem de dinheiro e enriquecimento ilícito, que provavelmente atingiria a família Bolsonaro como um todo, inclusive o próprio presidente.

No que diz respeito ao enfrentamento aos crimes ambientais, observamos um presidente da República que, com sua postura negacionista e avessa aos valores e conceitos de sustentabilidade, acabou por incentivar a degradação ambiental, cometida quase que orquestradamente por madeireiros, grileiros e garimpeiros. Bolsonaro, por intermédio de seu ministro do Meio Ambiente (sic), promoveu ainda um verdadeiro desmonte da capacidade fiscalizadora e repressora do Estado. O resultado dessas ações e omissões foram incêndios sem precedentes e devastação generalizada em dois dos mais ricos ecossistemas brasileiros: o Pantanal mato-grossense e a Floresta Amazônica, que sofreram perdas de cobertura vegetal e de recursos faunísticos que levarão décadas para serem recuperadas.

Encontramos a corrupção permeando e potencializando as atividades políticas que apoiam – e são apoiadas – pelas práticas comerciais ilícitas que promovem tanto a degradação ambiental sofrida pelos estados amazônicos, como também os inúmeros casos de fraudes em licitações nos contratos de compras de equipamentos para o enfrentamento à Covid-19.

Finalmente, se tivéssemos de escolher a pior das três tragédias bolsonaristas de 2020, cravaríamos nos retrocessos no combate à corrupção sistêmica, pois esse flagelo é simbiótico e, desgraçadamente, funciona como um eixo catalisador, comum aos outros dois. E a corrupção mata, seja ao patrocinar a destruição de enormes reservas de vida selvagem, seja ao enfraquecer o combate a uma pandemia devastadora.

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