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Na fascinante ‘The Little Drummer Girl’, espionar é seduzir

A minissérie tem direção mesmerizante de Park Chan-wook e a afiada Florence Pugh à frente

Por Isabela Boscov Atualizado em 22 jul 2020, 15h15 - Publicado em 3 jul 2020, 06h00
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  • Muito jovem, Charmian Ross, conhecida como Charlie, já é uma atriz de dotes muito maiores do que as peças encenadas em pequenos teatros londrinos poderiam acomodar. Charlie está também aprimorando o personagem que encarna nas horas em que não está vivendo outros personagens, e o de mulher sexualmente liberada e politicamente radical se encaixa à perfeição com seu temperamento direto. A certa altura, ela explica seu método: tem de viver aquilo que o papel pede, para que ele se torne a verdade absoluta. Charlie, em suma, tem a habilidade singular de acreditar inteiramente no momento presente; quando está dentro de uma ficção, esta é a sua realidade. Por isso, embora ela não faça ideia, há tempo o Mossad, o serviço de inteligência israelense, a vem observando. Está-se em 1979, e o terror árabe começou a se valer de jovens europeus radicalizados para realizar atentados em cidades como Munique ou Londres — e o agente do Mossad Martin Kurz (Michael Shannon) decidiu que Charlie tem o perfil e os talentos ideais para se fazer passar por um desses recrutas e, assim, infiltrar-se na célula comandada pelo misterioso Khalil e seu irmão mais novo, Salim (Amir Khoury). Será uma grande produção, diz faceiramente Kurz, e o melhor papel da vida de Charlie — que, como é de seu feitio, cede de imediato à imaginação.

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    Dirigida com virtuosismo pelo Park Chan-wook de Oldboy — juntamente com o Bong Joon-ho de Parasita, um dos principais motores do fervilhante cinema sul-coreano —, firmemente apoiada em um elenco superlativo e adaptada do livro homônimo publicado em 1983, a minissérie em seis episódios The Little Drummer Girl (Inglaterra/Estados Unidos, 2018), produzida pela BBC e pelo canal AMC e já disponível na íntegra na plataforma Starzplay, é uma tradução fabulosa do universo do escritor John le Carré — que, aos 88 anos, é o mais informado e arguto tradutor do mundo da espionagem, da Guerra Fria até o presente. Le Carré era ainda funcionário do Serviço Secreto de Inteligência britânico quando começou a escrever, em 1961, e os intrincados jogos de espelhos que retrata em seus romances são o contraponto verídico aos martínis e ao glamour de James Bond: em Le Carré, a espionagem é um trabalho de paciência, exatidão e dissimulação, e de leitura das entrelinhas. Tem de ser praticada como um teatro, enfim, e uma sedução — uma ideia que The Little Drummer Girl põe com mais clareza do que qualquer outra de suas obras, e que aqui se materializa em todas as suas camadas: com precisão impecável e um tino mesmerizante para enquadrar cada fotograma da maneira mais eficaz, Park cria a sensação de um teatro que os personagens encenam uns para os outros, e não para o espectador — mas no qual o perigo é muito real.

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    É no desempenho espetacular de Florence Pugh, porém, que a ideia adquire tração e atração. Como tem de acreditar que foi amante de Salim, Charlie ganha um parceiro de cena: o soldado e agente israelense Gadi (Alexander Skarsgard) “interpreta” para ela o terrorista, seduzindo-a e desvendando-lhe cada aspecto de sua vida. Nem Charlie nem Gadi, nem muito menos Kurz, saberiam dizer por quem ela está se apaixonando, se pelo palestino ou pelo israelense — nem podem garantir que, uma vez infiltrada, ela não vá se deixar absorver com igual facilidade pelo outro lado. Florence, de Lady Macbeth e Midsommar, é uma dessas atrizes que surgem uma vez a cada geração, se tanto. É um deslumbre ver como ela se destaca e se funde no conjunto, sem nunca perder o controle dos múltiplos personagens que interpreta, guiando o espectador por um mundo que é tão escorregadio e fugidio que a noção de identidade, nele, não passa mesmo disso — de uma decisão, e uma ficção.

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    O ESCRITOR QUE NÃO SAI DE MODA

    Algumas das melhores adaptações de John le Carré para o cinema e a TV

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    (Paramount Pictures/Divulgação)

    O Espião que Saiu do Frio (1965)

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    Com uma atuação brilhante de Richard Burton e direção do americano Martin Ritt, de outros clássicos como O Indomado e A Grande Esperança Branca, a história do espião que se recusa a deixar a linha de frente durante a Guerra Fria é considerada o padrão ouro das versões de Le Carré para o cinema

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    (Jack English/Divulgação)

    O Espião que Sabia Demais (2011)

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    Outra tradução perfeita do mundo do escritor, o filme do sueco Tomas Alfredson acompanha George Smiley, o espião descolorido que tem a missão de identificar um traidor no alto escalão. Gary Oldman lidera o elenco fabuloso, completado por John Hurt, Benedict Cumberbatch, Mark Strong, Ciarán Hinds e outros notáveis

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    (Columbia Pictures/Divulgação)

    O Alfaiate do Panamá (2001)

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    Baseada em um livro de 1996, a trama dirigida por John Boorman traz Pierce Brosnan, afiado como navalha, no papel de um espião malcomportado que provoca uma crise internacional envolvendo o Canal do Panamá ao acossar um veterano do ramo que se reinventou como alfaiate dos poderosos — Geoffrey Rush, também excelente

    (Des Willie/The Ink Factory/AMC/Divulgação)

    The Night Manager (2016)

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    Tom Hiddleston, todo suavidade e lábia, é um ex-membro das Forças Especiais que trabalha em um hotel no Cairo e recebe a tarefa de criar uma armadilha para um negociante de armas (Hugh Laurie), no enredo impecavelmente dirigido pela dinamarquesa Susanne Bier. A excelente e estatuesca Elizabeth Debicki completa o triângulo

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    Publicado em VEJA de 8 de julho de 2020, edição nº 2694

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