A alfabetização deixa marcas – é o que mostra um estudo publicado na Revista Científica Mind, Brain and Education, em junho deste ano, assinado por eminentes neurocientistas, entre eles Stanislas Dehaene, do Collège de France, e a brasileira Lucia W. Braga, do Hospital Sarah Kubitschek.
O estudo envolveu um adulto que estava internado no hospital Sarah Kubitschek e que foi submetido a um programa de alfabetização. Por meses, os neurocientistas procuraram as marcas esperadas no cérebro – já que sabemos que quando uma pessoa se alfabetiza, há uma ativação mais intensa da chamada área da forma visual da palavra, localizada no córtex esquerdo occipito-temporal. Até que, depois de 16 semanas de resultados frustrantes, o experiente Dehaene perguntou aos seus colegas brasileiros que método vinha sendo usado para alfabetizar. Diante da resposta – método global inspirado em Paulo Freire, associado com um método silábico –, Dehaene instruiu seus colegas a utilizar o método fônico. O resto da história está documentado no artigo – a ativação cerebral ocorreu da forma prevista rapidamente, nos locais previstos. A alfabetização realmente deixa marcas. Agora não dá mais para enganar.
Hoje, 8 de setembro, o mundo é convidado a celebrar o Dia Internacional da Alfabetização. Não há mais razão para tergiversar sobre três questões. Primeiro, é necessário e possível alfabetizar as crianças no primeiro ano do Ensino Fundamental. Segundo, é danoso ao cérebro e ao desenvolvimento atrasar o processo de alfabetização. Sempre é possível aprende a ler, mas havendo atraso, o processo é mais penoso e acarreta prejuízos que podem ser irrecuperáveis. Além disso, pode atrasar também o diagnóstico dos disléxicos. Terceiro, existem métodos comprovadamente mais eficazes para alfabetizar – e não há porque deixar de utilizá-los.
As autoridades brasileiras na área de educação poderiam aproveitar a oportunidade da elaboração da Base Nacional Comum Curricular para realizar um debate verdadeiro sobre alfabetização com quem conhece e estuda o assunto, tendo como referências as evidências científicas e as melhores práticas dos países onde a educação dá certo. A julgar pelo que temos visto até agora na condução da BNCC, ainda vamos amargar muitos anos de atraso nessa área.