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Que vida vale a pena viver? O curso famoso de Yale agora em livro

Coluna estreia publicação de trechos exclusivos de obras no prelo. Leia um capítulo de 'Sobre a vida e o viver', baseado em aulas de professores americanos

Por Miroslav Volf, Ryan McAnnally-Linz e Matthew Croasmun (tradução: Ivanir Calado)*
30 jan 2024, 14h27

Até que ponto somos livres para moldar nossa vida? E quanta responsabilidade temos por ela?

Existe um jogo de baralho muito popular entre as crianças chamado jogo da guerra. No início da partida, você recebe cartas aleatórias. O mesmo acontece com todo mundo à mesa. Você não sabe quais são as suas cartas e também não pode ver as dos outros.

Cada jogador vira a carta de cima da sua pilha. Quem tirar a mais alta pega todas as cartas que foram viradas e as coloca na base da sua pilha. Se dois jogadores ou mais empatarem no valor da carta mais alta, eles viram outra… e outra… e outra… até que um deles mostre uma carta de valor mais alto.

O jogo continua – inexoravelmente, implacavelmente – até que um jogador tenha todas as cartas. Não existem decisões no jogo da guerra. Só um procedimento.

Qualquer máquina capaz de reconhecer quais cartas têm valor mais alto ou mais baixo poderia jogar tão bem quanto um ser humano. Ninguém é responsável pelo resultado do jogo.

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No início de uma rodada de pôquer, como no jogo da guerra, você recebe uma mão de cartas aleatória. O mesmo acontece com todo mundo à mesa.

Você não pode ver as cartas dos outros, mas pode ver as suas. À medida que o jogo continua, os jogadores apostam e cartas são viradas na mesa
para todos os jogadores combinarem com as que estão segurando. A ideia é conseguir montar a melhor mão de cinco cartas.

Existem regras que dizem quais mãos são melhores. E existem regras sobre como você pode reagir a cada momento da rodada. Pode haver limites em relação a quanto e com que frequência você pode apostar. Você não pode jamais virar cartas de outros jogadores, não pode reembaralhar as cartas aleatoriamente… Esse tipo de coisa.

Quando joga pôquer, você não está totalmente no controle. Não escolhe suas cartas. Nem as dos seus oponentes. Nem o modo como eles apostam. Ou como eles reagem às suas apostas. Nem as regras do jogo. A maior parte dessas coisas está fora do seu controle.

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Mesmo assim você é responsável pelo modo como joga. Você não pode determinar o resultado. Isso sempre depende do acaso e do desempenho dos outros jogadores. Mas você também tem alguma influência no resultado.

O modo como as coisas acontecem depende em parte do que você faz com suas opções. Você é um participante. E é responsável por como participa. O jogo da guerra e o pôquer têm uma diferença muito nítida. No jogo da guerra você aparentemente não tem escolhas nem responsabilidades, ao passo que no pôquer você tem algumas escolhas restritas e algumas responsabilidades reais.

Sobre a vida e o viver

sobre a vida e o viver

Mas o negócio é o seguinte: mesmo no jogo da guerra, você tem algum tipo de responsabilidade. Você não é responsável nem de longe pelo resultado, claro, mas é responsável pelo modo como joga. Você vai ser gentil com a menininha que está se divertindo à beça do outro lado da mesa?

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Ou vai se ressentir porque ela arrastou você para esse inferno determinístico? Vai seguir as regras? Ou vai disfarçadamente mudar de lugar para pegar uma pilha melhor enquanto seu oponente saiu para comer um biscoito? (Um de nós já tentou fazer isso aos 4 anos. Não deu certo.)

A vida é mais parecida com o pôquer ou com o jogo da guerra? Quanta margem de manobra as “regras” da vida nos dão? É difícil dizer. Existem bons argumentos dos dois lados.

Mas, independentemente de onde está a verdade no espectro que vai do pôquer ao jogo da guerra, há dois pontos importantes. Primeiro, você tem alguma responsabilidade pelo formato da sua vida (e isso inclui seus ganhos, suas perdas e o modo como você joga).

Segundo, essa responsabilidade não é ilimitada. É restrita. Você não determinou o lugar onde nasceu. Um mundo enorme, absurdamente complicado, está sempre moldando as situações em que você se encontra. E você não determina os resultados. (O trabalho duro e a determinação não garantem o sucesso. Isso é uma ficção. E é uma ficção nociva.)

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Você não determina nem mesmo quem você é. Todas as pessoas passam por situações transformadoras que, se tivessem escolha, elas evitariam. Em níveis realmente importantes, simplesmente nos descobrimos sendo quem somos.

Você não é um ditador onipotente. Não dá todas as ordens. Isso é bastante óbvio.

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Mas, voltando ao primeiro ponto, você também não é uma pedra. Uma pedra não reage se alguém a pega, a cinzela um pouco e a usa para enfeitar o jardim. Já você reage, de um jeito limitado mas muito real, ao que acontece com você e ao seu redor. Você joga a sua cartada.

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Você também não é um hamster. Um hamster reage se alguém o pega. Talvez seja até capaz de escolher como reagir. Mas um hamster não pode perguntar como deveria reagir. Você pode. E, já que pode, você é responsável por fazer isso ou não.

Mesmo aqui existem restrições. Os antigos maias não podiam simplesmente decidir que o sentido da vida era buscar a iluminação, seguir Jesus ou lutar pela justiça racial. Para eles, essas possibilidades nem eram cogitáveis.

Mas mesmo assim a responsabilidade era real. Só porque existe um caminho normal a seguir, isso não significa que você não seja responsável por segui-lo ou não. Só porque existe uma visão padronizada do que seria uma boa vida para alguém como você, isso não significa que você não seja responsável por adotá-la ou não.

Essa é a essência da responsabilidade restrita que caracteriza a sua vida. É a responsabilidade de discernir, do melhor modo possível, que tipo de vida realmente vale a pena buscar: a responsabilidade de enxergar a pergunta e responder a ela.

* Autores do livro Sobre a Vida e o Viver – Reflexões para Descobrir o que Realmente Importa, a ser publicado pela editora Sextante

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