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Coluna da Lucilia

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A alma dos mercados

Mais do que cartões postais, mercados centrais são uma festa para os sentidos.

Por Lucília Diniz
Atualizado em 2 fev 2023, 16h53 - Publicado em 2 fev 2023, 16h01
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  • Desde menina me encanto com mercados gastronômicos. Deve estar no DNA: meu pai, Valentim Diniz, fundou, a partir de uma doceria, a maior rede varejista de alimentos da América Latina. É um ambiente que me transporta à infância, quando percorria com curiosidade e alegria cada cantinho dos supermercados pioneiros da família em São Paulo –o primeiro na avenida Brigadeiro Luís Antônio, o segundo na rua Maria Antônia.

    A atividade de negociar alimentos remonta à Antiguidade, precede mesmo o comércio formal e está na raiz das relações de compra e venda. Não é à toa que a palavra “mercado” ganhou uma conotação tão diversa, designando desde os espaços físicos até o sistema de investimentos financeiros. O lugar onde nos primórdios tudo isso ocorria se tornou um grande ponto de encontro das cidades.

    Mercados centrais são uma festa para os sentidos. Cores, cheiros, sabores e o vaivém frenético de pessoas tornam única a experiência de frequentá-los. Mais que cartões-postais da cultura gastronômica de uma cidade, eles me fascinam porque são sempre opção de comida fresca e saudável. Se o desenvolvimento da agropecuária foi motor da evolução dos primeiros centros de compras, podemos dizer que a busca por produtos mais sustentáveis e nutritivos marca a nova geração de mercados.

    Assim, a cada nova viagem, elejo a ida a esses locais como programa inevitável. O Bazar de especiarias de Istambul me transporta para outro tempo e espaço por meio dos cheiros e cores –de pimentas e cominho, ao sumac. O mercado de peixes de Tóquio, que ficava em Tsukiji e em 2018 se mudou para Toyosu, tem como atração o fabuloso leilão de atum. Para assisti-lo, tive que agendar com antecedência, pois é um programa concorrido – e ainda assim acordar cedo (começa por volta das cinco da manhã).

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    No La Boqueria, em Barcelona, a estrutura em ferro emoldura a opulência da cultura e da gastronomia catalãs. O Chelsea Market, em Nova York, instalado numa antiga fábrica de biscoitos, tem bagels deliciosas e me marca pessoalmente porque meu filho morou ali ao lado. De Lisboa vem um bom exemplo de unir tradição à modernidade: o velho Mercado da Ribeira abriu espaço para restaurantes estrelados, e a revista Time Out, que investiu na iniciativa, passou a dar nome ao novo mercado.

    O recém-festejado aniversário de São Paulo lançou luzes sobre o cada vez mais visitado mercado central da cidade, que chegou aos 90 anos. São muitos os desafios para modernizar de vez o nosso Mercadão: garantir segurança e facilidade de acesso, coibir o assédio aos turistas, os abusos em alguns preços e as famosas armadilhas para os que vêm de fora. Mas ao mesmo tempo o potencial é imenso.

    Explorar sem pressa as espaçosas alamedas do antigo Mercado da Cantareira contemplando os majestosos vitrais de Conrado Sorgenicht Filho permite descobrir, para além dos megasanduíches turísticos, açougues com todo tipo de carne, empórios que oferecem uma infinidade de temperos, cereais, farinhas, conservas, queijos, embutidos, peixarias com vieiras e muitos pescados frescos, boxes com histórias que atravessam gerações. Em suma, como qualquer lugar do tipo no mundo, o Mercadão cumpre com mais plenitude sua vocação quando comerciantes e frequentadores percebem que mercados têm alma.

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