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O paradoxo da estatística

Os números contam boas histórias escondidas, mas podem mentir

Por Claudio Moura Castro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 24 jul 2020, 11h21 - Publicado em 24 jul 2020, 06h00

A Mariquinha está em casa? Chove? Como alertou Bob Dylan, não é preciso ser meteorologista para saber a direção do vento. Mas se perguntarmos se choverá amanhã, se a Covid-19 foi controlada ou se aumenta a obesidade dos brasileiros, a resposta estará escondida dentro de uma montanha de números. Decifrá-los é a missão da estatística.

Proponho aqui uma indagação. Qual das duas afirmações a seguir está certa? (1) Com a estatística extraímos informações escondidas e (2) A estatística é a arte de mentir com números. Paradoxalmente, as duas. Na primeira, apenas batizamos um conjunto de técnicas. Na segunda, trata-se de uma real possibilidade, diante da ignorância ou vontade de enganar.

Há antídoto? Claro. Basta conhecer os meandros da estatística para não ser iludido. De fato, ela só engana a quem não decifrou as suas manhas. Infelizmente, como poucos a entendem, fica-se à mercê do que a imprensa revela. Alguns, muito corretos. Mas existem os ingênuos e os mentirosos. Ilustremos o tema com a pandemia. Comparar números absolutos de mortes é erro primário. Países como Andorra e Mônaco seriam os maiores sucessos de controle do surto. Brasil e Estados Unidos, grandalhões, seriam escabrosos líderes mundiais. Mas tomando óbitos per capita, muda tudo. Reino Unido, França, Itália e Chile têm maior letalidade per capita do que o Brasil.

“Juntar tudo é como tomar a média de temperatura de todos os pacientes de um hospital. Para quê?”

Consideremos a Itália, Inglaterra ou França, países geograficamente circunscritos. Neles, a curva com a evolução da epidemia conta uma história. Pode mostrar aceleração, arrefecimento ou decréscimo. Ou até uma nova onda. Mas Brasil e Estados Unidos são continentes. Nova York desce, Arizona sobe. A curva agregando todos os estados é uma montoeira de dinâmicas superpostas. Nada diz. No Brasil, a cidade de São Paulo começou a se estabilizar, o interior cresce. Outros estados sobem ou descem. Juntar tudo é como tomar a média da temperatura de todos os pacientes de um hospital e desse controle tirar alguma conclusão interessante. Para quê?

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Qual a letalidade do coronavírus? É simples, basta dividir os óbitos pelos infectados. Simples, mas errado. Se os testes são escassos, apenas quem aporta aos hospitais os fazem. Ou seja, o denominador são os casos sérios, e não a totalidade real de casos. Falecem 4% no Brasil? Não, pois esse número mede mais a disponibilidade de testes do que a mortalidade. Em um país que testa poucos, o denominador é pequeno, superestimando a letalidade. As únicas pesquisas brasileiras que medem a real incidência são as da Universidade Federal de Pelotas. Mostram que, para cada registro oficial, há seis infectados que não fizeram testes. Usando esses números, não discrepamos da média mundial. Mas isso não dá manchetes.

A identificação dos óbitos é politizada. Estados “de mal” com a Presidência registram como coronavírus os casos indefinidos. Quem está “de bem” exclui os ambíguos. Mas há uma alternativa: estimar o acréscimo de mortes, comparadas com as do ano anterior. Se a sociedade fosse mais versada em estatística, estaria mais a salvo das interpretações — inocentes ou culposas — disseminadas pelo governo e redes sociais.

Publicado em VEJA de 29 de julho de 2020, edição nº 2697

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