Nos últimos dias, o PSDB até tentou vender a tese furada de que tudo estava pronto para a votação de domingo e que o partido estava a algumas horas de iniciar um processo de pacificação. Como num passe de mágica, vencedor e derrotados dariam as mãos no fim da tarde de domingo em nome de uma causa maior: criar uma terceira via para enfrentar a polarização entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não era preciso ir muito longe para enxergar o viés fantasioso desse plano.
Na tarde de domingo, o tweet mais recente no perfil do PSDB datava de sexta-feira e trazia uma foto de João Doria, Eduardo Leite e Arthur Virgílio de mãos dadas, com a frase “PSDB unido pelo Brasil!”. Não dava para ser mais fake news que isso. Na mesma sexta-feira, mensagens de assessores e aliados de Doria e Leite pipocavam nos telefones celulares de jornalistas, inclusive desta colunista. Eram pedidos de “correção” de declarações, comentários irritados e alfinetadas. Entre um e outro xingamento.
A falha no aplicativo das prévias, que empacou o processo de escolha do candidato à Presidência, não teria sido tão dramática se não fosse o clima de guerra instaurado no PSDB. A situação chegou ao ponto de render cenas como a da deputada Mara Rocha, (PSDB-AC) flagrada aos berros pelo repórter do Poder360 Guilherme Waltenberg, acusando o time de Doria de tentar comprar seu voto. A mesma deputada saiu anunciando que iria se filiar o PL e votar no presidente Jair Bolsonaro. Ou seja, um barraco muito bem calculado. Resumindo, o PSDB pagou a câmera, a luz e o som para que uma de suas filiadas fizesse campanha em rede nacional para o presidente da República.
O fiasco nas prévias tucanas expõe muito mais do que uma briga entre os governadores João Doria e Eduardo Leite. Expõe um PSDB frágil, desunido e desprovido de lideranças capazes de conciliar as diferenças internas. E quem mais perde é o próprio PSDB. É difícil imaginar que um partido nessas condições seja capaz de se unir em torno de um único candidato para enfrentar uma disputa que promete ser uma das mais difíceis do passado recente da legenda. No passado, uma disputa interna muito mais velada já contribuiu para jogar o desempenho do partido no chão na última corrida presidencial. Mais precisamente para pouco mais de 4% obtidos nas urnas por Geraldo Alckmin em 2018.
De fato, o PSDB viu seus líderes mais experientes derrubados um a um. Após várias derrotas, José Serra foi escanteado aos poucos da tomada de decisões e, mais tarde, viu sua saúde se deteriorar ao ponto de tirá-lo da política. Aécio Neves nunca se recuperou do envolvimento em denúncias da Lava Jato. Assim como Geraldo Alckmin não se recuperou do baque da derrota em 2018. Esse foi o destino dos últimos candidatos à Presidência pelo PSDB.
Pode até ser que João Doria tenha chegado onde chegou colecionando desafetos. Mas o fato é que hoje é ele quem comanda o governo de São Paulo, maior colégio eleitoral do País. E isso o torna de maneira incontestável um dos líderes mais expressivos que restam ao PSDB. Também não há dúvidas de que Eduardo Leite desponta como um nome novo no partido, com potencial de angariar apoio interno. Mas se não houver alguém capaz de construir pontes entre os dois pré-candidatos, é bem provável que ambos tenham cacos de sobra para recolher depois das eleições do ano que vem.