Desde que a Times Square foi fechada para os carros e entregue aos pedestres, em 2009, a área se trasnformou em um tubo de ensaio da convivência urbana. Primeiro, foi tomada por quem queria apenas sentar e ver a vida passar, com cadeiras e mesinhas que deram um clima quase praiano a uma das maiores metrópoles do mundo. Turistas também se beneficiaram. Podiam andar, parar, andar e parar de novo e tirar fotos à vontade. A descontração foi aumentando até beirar o carnavalesco. Músicos de rua ganharam a companhia de artistas performáticos e, aí é que vem a polêmica, moças passaram a fazer topless, desfilando com os seios pintados em troca de gorjetas.
A cena, que não chegaria a ruborizar brasileiros e passistas de escola de samba, parece ter sido a gota d’água para o prefeito Bill de Blasio. Agora, para acabar com “essa pouca vergonha”, nas palavras de seus aliados, ele ameaça reabrir o trecho aos carros e jogar no esquecimento um dos projetos mais simbólicos de seu antecessor Michael Bloomberg e que custou 27 milhões de dólares.
Blasio é o primeiro prefeito democrata de Nova York e se orgulha de ter proposto uma pauta que ele classifica de progressista. Dela fazem parte um programa de redução de acidentes de trânsito, a criação de ciclovias e de praças para pedestres. Nesse contexto, acabar com a farra na Times Square é um contrasenso ainda maior. Mas o fato é que Blasio vem sofrendo a pressão de empresários, lojistas e políticos receosos de que esse comportamento mais liberal afugente os turistas e atrapalhe os negócios. Pelo menos, é o que alegam.
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É arriscado quando um prefeito tentar interferir no interferível, o fato de que as pessoas são livres para viver como acharem melhor. A liberdade de expressão deve prevalecer sempre, desde que, é claro, sejam respeitadas as regras do jogo. E isso está sendo feito. Uma dúzia de moças receberem uns trocados por pintarem seus corpos e andarem quase sem roupa não configura crime. Legalmente, Blasio não tem o que alegar para proibir a atividade ou tirá-las de circulação.
Ainda assim, ele está tão irritado com a situação que parece disposto a punir não só as moças, mas todos os pedestres e transformar aquele espaço novamente em avenida. Mais razoável seria apresentar um projeto de lei que restringisse comportamentos que a população como um todo considerasse abusivos. Mas, para isso, Blasio teria de vencer a resistência dos defensores da liberdade de expressão, que já avisaram não estar dispostos a ceder nenhum milímetro. Assim como acontece na maioria das cidades do mundo, quando ninguém está disposto a fazer concessões em nome da convivência, a corda estoura do lado mais fraco, o dos pedestres.
Por Mariana Barros
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