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Vítimas da poluição

Texto publicado no site !sso não é normal!. No Serviço de Verificação de Óbitos do Hospital das Clínicas (SVO), cerca de 14.000 corpos são autopsiados por ano. Por lá, passam os casos de morte natural, porém com causa indefinida ou aqueles que não tiveram assistência médica no momento da morte. Há mais de 30 anos, […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 15h03 - Publicado em 17 jun 2010, 13h14

Texto publicado no site !sso não é normal!.

No Serviço de Verificação de Óbitos do Hospital das Clínicas (SVO), cerca de 14.000 corpos são autopsiados por ano. Por lá, passam os casos de morte natural, porém com causa indefinida ou aqueles que não tiveram assistência médica no momento da morte. Há mais de 30 anos, João Teixeira é um dos técnicos que cuidam do serviço: abre o corpo, retira o que é necessário para análise, envia para o laboratório e fecha. João pediu que a gente não deixasse de dizer que ele não é médico, nem especialista. “Mas é a experiência do dia a dia, né?”, conta. “Os médicos já confiam na gente. Chegam perguntando qual é a causa da morte.”.

Nessas três décadas, João viu muita coisa mudar em São Paulo e na rotina de trabalho. “Antigamente você abria o caso e olhava o pulmão. Se estava escurecido, a gente já classificava aquela pessoa como um fumante. Hoje já fica dificil você classificar se essa pessoa morreu por problemas relacionados ao vício do fumo ou da poluição”. Além disso, diz que conforme a garoa foi diminuindo e começaram estas variações extremas entre dias quentes e frios o número de mortes aumentou. “Normalmente você vem pra sala e tem cinco, seis cadáveres para serem autopsiados, mas, nas épocas de frio, chega a 12, 15. A maioria idosos”.

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O que acontece no SVO é reflexo do que acontece em toda a capital. Diariamente, 35 pessoas são internadas em hospitais públicos e 12 pessoas morrem por doenças relacionadas à poluição. As principais são as respiratórias (como asma e bronquite), cardiovasculares (como arritmia e enfarto), e câncer do pulmão. Entre os mais vulneráveis às consequências de respirar um ar que possui, na média, três vezes mais o nível de partículas finas tolerado pela Organização Mundial da Saúde (10 microgramas por metro cúbico) estão os idosos acima de 65 anos, crianças abaixo de 5 anos e os mais pobres. “Na Zona Leste de São Paulo morre-se seis vezes mais do que na Cidade Jardim por doenças relacionadas à poluição”, atesta Paulo Saldiva, Coordenador do Laboratório de Poluição da Faculdade de Medicina da USP.

Sérgio Branco Mituo, 71 anos, é morador há mais de 42 anos da rua General Olimpo e dono de um comércio localizado a três quarteirões da residência, de onde viu o elevado Costa e Silva, o Minhocão, ser construído. “Cortinas, janelas, é tudo preto em casa. E é uma sujeira grossa, parece óleo mesmo. O cheiro e o barulho também são horríveis”, relata. Há três meses, Mituo abandonou o apartamento, que fica de frente para a via, por onde passam cerca de 40.000 carros diariamente, segundo dados da CET. “Minha esposa faleceu de edema pulmonar e nunca fumou um cigarro. Não quero mais ficar aqui.”

Quanto maior a exposição a vias expressas e corredores de ônibus, maior o risco. Paula Ferreira, 28 anos, morava em uma rua sem saída. Vinte dias após se mudar para uma rua de grande tráfego, localizada no extremo oeste de São Paulo, no distrito do Jaguaré, as idas ao Pronto Socorro da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo se tornaram frequentes. Duas semanas morando lá e meus dois meninos começaram a ter problemas repiratórios”. Mãe de Fernando, 7 anos, e Claudio, 1 ano, a empregada doméstica já precisou faltar diversas vezes no trabalho e investiu em um aparelho de inalação para evitar a extensa fila dos hospitais. “Agora, quando vejo que vai começar a dar crises já faço uma inalação de manhã e outra à noite”.

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Para quem não está acostumado, os efeitos são ainda mais agressivos. Angélica Neres de Lima, 21 anos, veio de Ubatuba, litoral paulista, acompanhando o marido que arrumou emprego na capital. Em menos de um mês, sua filha de 3 anos, Yngrid Neres, já fez sete inalações e precisou utilizar bombas para asma durante o dia. Já a mais nova, Jheamy Lee Neres, de 1 ano, ficou internada por dois dias com pneumonia. Segundo o médico que atendeu as pacientes, Dr. Victor Lion, do Pronto Socorro da Santa Casa de Misericórdia, além dos medicamentos, é preciso esperar que o organismo das crianças se adapte com as mudanças de clima e qualidade do ar.

Quem mora em São Paulo ainda enfrenta problemas de médio e longo prazo que não são contabilizados, conforme salienta Saldiva. “Se o ar condicionado do carro está desligado, você chega em casa moído. Por quê? Isso tem explicação fisiológica: anos e qualidade a menos de vida”. Ricardo Laranjeiras, 43 anos, desde que nasceu é morador da rua Apa, esquina com a avenida São João, também pertinho do Minhocão. O comerciante tem uma característica comum entre os moradores do local: fala alto. Não é à toa. Diariamente convive com um ruído de 81 decibéis, quando o recomendado pela OMS é de até 75. “Em casa é assim, a TV é alta, a gente fala alto, tem que se adaptar, né?”. No prédio em que mora, todos os apartamentos tiveram suas sacadas fechadas com janelas de vidro. Onze e meia da manhã e apenas uma, dos dez andares, estava aberta. “Essa é a melhor forma de aguentar. Nos finais de semana a gente abre”.

Tosse seca, irritação nos olhos, nariz ou garganta e cansaço são efeitos comuns desse desgaste. Até a prática de exercício físico em locais inadequados pode ser um grande problema. “O Parque do Ibirapuera é um dos locais de maior concentração de poluentes devido ao entorno de veículos. Em dias secos, por exemplo, o atleta tem maior propensão para arritmia cardíaca, pois diminui a quantidade de oxigenação”, ressalta o Acary Souza Bulle Oliveira, médico da Unifesp.

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Assista à entrevista com o médico Paulo Saldiva, especialista em poluição atmosférica.

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