A Apple passa por maus bocados. Não duvido que logo se reinvente a célebre capa da revista Wired com o logo da empresa envolto por uma coroa de espinhos e com a chamada “Pray” (reze). Apenas nos últimos três meses, a marca perdeu em torno de 400 bilhões de dólares em valor de mercado (ou o equivalente a um Facebook), como detalhado em reportagem de VEJA desta semana, assinada por mim. Por que tamanha crise? O motivo é: você.
A pior queda da companhia se deu na semana passada, quando o CEO Tim Cook antecipou que a receita do último trimestre seria até 10% menor que o previsto. Trataria-se da primeira decepção do tipo desde 2002. Aí Cook veio com umas justificativas esfarrapadas. A principal: a culpa seria da China.
Logo o executivo expôs a desculpa. Falou que o mercado daquele país está desaquecido (o que é verdade) e que por isso a Apple não anda bem (o que não é bem assim). Ocorre que a Apple nunca se deu bem na China, por mais que tentasse. Lá é apenas a quinta maior vendedora de celulares. A razão para a recente crise é outra: applemaníacos não são mais applemaníacos.
Logo após o lançamento do iPhone, em 2007, pelo genial Steve Jobs, era comum que clientes, como eu e você, comessem as unhas de ansiedade na espera do próximo modelo do então cobiçadíssimo smartphone. Logo, o regular era que se trocasse de iPhone praticamente todo ano. Até 2015, a média de mudança de um aparelho antigo para um mais moderno era de dois em dois anos.
Pois essa ansiedade acabou. Ninguém mais tá muito aí para se atualizar a cada novo iPhone(coloquequalquernúmeroaqui, saca?). Tanto que hoje a média de troca subiu para de três em três anos, sendo que a tendência é aumentar mais e mais. São muitos os motivos para a falta de empolgação com a nova fase da Apple. Mas tudo se resume a: você.
Você, consumidor, parece ter sacado que não muda muito ter um iPhone do ano passado, ou um deste ano. Você talvez tenha percebido como os aparelhos da antes idolatrada marca da maçã gradualmente perderam sua antes inegável identidade. Novidades apresentadas a cada novo modelo também não são mais, bem, novidades, mas praticamente simulacros do que a concorrência já vinha fazendo. Você, em resumo, não vê tantos motivos para desembolsar pequenas fortunas anuais, de milhares e milhares de reais, tão-somente para se exibir pelas ruas com um celular de carcaça brilhante.
No fim da década de 1990 / início da de 2000, a Apple passava por uma gravíssima situação. No entanto, estava sob seu comando, após anos afastado, o brilhante Steve Jobs (1955-2011). O gênio então prometeu que reverteria a crise trazendo novidades maravilhosas. Com o sucesso do iPod, do iPhone, do iPad, cumpriu com o que falou.
Cook já provou ser um hábil executivo. Porém, parece que a Apple desta vez carece de figuras geniais como Jobs. Não só capazes de tocar as finanças, o marketing etc. Também eficientes em prever o que as pessoas querem ter, antes mesmo delas expressarem esse querer.
São de sacadas do tipo, como as várias tidas na era Jobs, que surgem aqueles produtos revolucionários, que definem o comportamento de gerações. Por enquanto, nada indica que a nova Apple tenha novidades maravilhosas na manga. Ao menos não daquelas que poderiam inverter seu atual fluxo (para baixo).
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