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Saneamento básico tem que ser feito de forma justa, diz especialista

De passagem pelo Brasil, expert em recursos hídricos falou sobre os desafios e a necessidade da universalização do serviço

Por Jennifer Ann Thomas Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 13 dez 2019, 14h19 - Publicado em 13 dez 2019, 12h57
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  • Na quarta-feira 11, a Câmara dos Deputados aprovou o texto-base do projeto que estabelece o novo marco legal do saneamento básico. Um dos principais pontos é a maior facilidade para a entrada do setor privado na prestação do serviço. No Brasil, os números são vergonhosos: apenas 46,3% do esgoto gerado é tratado, e o abastecimento de água atende 83,6% da população. Em evento realizado em São Paulo pelo Pacto Global, iniciativa da ONU para engajar empresas e organizações na promoção da garantia aos direitos humanos, o especialista em recursos hídricos, presidente do Pacific Institute e responsável pelo The CEO Water Mandate, o americano Jason Morrison, falou sobre o papel das empresas neste cenário. Em entrevista exclusiva, Morrison versa sobre os desafios e as soluções para sanar esse problema.

    O ministro da Economia, Paulo Guedes, prometeu universalizar o saneamento básico nos próximos sete anos. É possível? O trabalho que pode ser feito em uma década, ou sete anos, é enorme. Exemplo é a Índia. Quando a prioridade foi o saneamento básico, o compromisso foi ambicioso, para lidar com a crise de saneamento no país. Muitos investimentos foram feitos em infraestrutura de esgoto e, agora, quase uma década depois, 200 milhões de indianos têm acesso a saneamento básico. Não acho que o governo federal agiu sozinho. Foi uma mobilização de esforços, com a sociedade civil e o setor privado.

    Qual é o papel das empresas? Quando falamos das empresas, há aquelas que estão no setor de água, com tratamento e entrega, e negócios que produzem tênis, roupa ou refrigerantes. Na Índia, há um paralelo para incentivar negócios com a lei para investir nas comunidades. Exige que os grandes negócios invistam 2% dos lucros nas comunidades. Para muitas empresas, porque elas sabiam que o acesso à água e ao saneamento era um desafio, a decisão foi a de investir nesse setor por saberem da importância para a sociedade como um todo.

    O acesso a água e ao saneamento básico deve ser tratado como um negócio, ao permitir a privatização do serviço? Essa é uma questão de décadas e que vem sendo debatida globalmente. A importância é a entrega do serviço, seja público ou privado. Uma das conclusões da nossa instituição é a de que não há como fazer uma afirmação sobre qual segmento fará um trabalho melhor. Tudo se resume à competência de cada provedor. Construir uma infraestrutura é diferente de ser dono do recurso natural. E nunca se deve priorizar alguém para ser dono de água. A questão é: existe uma instituição que consegue operar um contrato com responsabilidade? Esse é o ponto.

    Qual é o maior desafio? A urgência da questão. Com o surgimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, em 2015, que prevê a agenda até 2030, a ambição é ter acesso à água tratada dentro de casa, em qualquer momento em que for necessário. Por esse padrão, 2,1 bilhões de pessoas ainda não são alcançadas pelo mínimo, 4,4 bilhões de pessoas não têm saneamento básico, dois terços da população mundial. O debate pode ser ideológico sobre como deve ser atingido, mas todos têm que se envolver. Se for uma mistura entre público e privado, que assim seja. Neste momento, não estamos no caminho certo para atingir o objetivo até 2030. Temos que entrar no ritmo. Logo.

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    O senhor acredita em uma universalização literal, incluindo regiões remotas da Amazônia e no semiárido? Quando as pessoas vivem em áreas rurais, normalmente o acesso à água é mais perto de onde ela é acessível. A dificuldade é construir a infraestrutura tradicional de uma forma economicamente viável. Esses sistemas menores não são sustentáveis. Além disso, áreas remotas normalmente não têm a mão de obra adequada para administrar os equipamentos. Pode ser feito, mas não se contarmos que aquela comunidade arcará com os custos totais. É preciso encontrar uma outra forma de subsidiar as obras.

    Quais outras mudanças estão por vir? Há espaço para inovação. Teremos que revisitar alguns modelos que são tradicionais hoje em dia. A maior parte da água que usamos hoje não é para consumo humano. Por que precisamos de água potável para dar descarga ou irrigar plantas? As mudanças que estão acontecendo são no sentido de circuitos circulares.

    Falta pressão popular para avançar no acesso à água e ao saneamento básico? Conforme os países conseguem ter crescimento econômico, com uma nova classe média, a população exige que água tratada e saneamento sejam serviços providos pelo governo. A exigência vem da sociedade e se torna uma questão política. No Brasil, tenho a sensação de que a sociedade entende que o saneamento é algo importante. Está no discurso político neste momento. A questão não é se deve ser feito ou não, mas como fazer de uma forma justa.

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    Qual é o tipo de pressão que o setor privado poderá desempenhar? Acredito que a comunidade empresarial pode desempenhar um papel de liderança. Governos vão e vêm dentro dos ciclos políticos, e a visão de longo prazo nem sempre é atrativa para os representantes públicos. Quem está no setor privado tem muito a perder com o passar do tempo. Eles estão dispostos a investir em segurança hídrica. Se os investidores não sentirem que um determinado local terá a capacidade de manter o abastecimento hídrico, levarão o dinheiro para outro lugar.

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