Entender água doce é importante para vida na Terra, diz geógrafo americano
Alex Tait, da National Geographic Society, mostra como projeto de mapa mundial pode ajudar a criar políticas de sustentabilidade para o recurso natural
A National Geographic Society lançou recentemente o Mapa Mundial da Água, como parte de sua Iniciativa Global de Água Doce. Criado em cooperação com a Universidade de Utrecht, na Holanda, e com a empresa americana de tecnologia Esri, identifica pontos críticos de disponibilidade de água doce, visualiza oferta e demanda global e registra como as pessoas usam esse recurso. A cartografia é baseada em um modelo de código aberto que rastreia essa disponibilidade em diferentes partes do mundo. O projeto tem duração prevista de cinco anos.
“Nossos recursos globais de água doce são insubstituíveis e usar o mapeamento para contar sua história – e como as pessoas, a vida selvagem e a natureza a usam – faz parte de nosso compromisso”, diz Alex Tait, geógrafo da National Geographic Society. Em entrevista a VEJA, Tait fala sobre o projeto e como pode ajudar em ações para controlar o seu uso e compensar sua falta em alguns lugares como o Vale Central, na Califórnia, Java, na Indonésia, o Delta do Rio Nilo, no Egito, e a Bacia do Rio Indo, no Paquistão. A seguir, trechos da conversa, que foi editada para melhor compreensão.
Quais são os principais desafios na preservação da água doce no mundo?
A água doce é um dos elementos críticos para a vida na Terra. É um sistema global, importante para todos em todos os lugares. Em alguns locais, identificamos escassez de água, em outros, abundância ou superabundância de água. Um dos maiores desafios, para nós [da National Geographic Society], foi apresentar isso tanto ao público em geral quanto aos cientistas, formuladores de políticas e governos de uma forma que fosse muito compreensível, baseado na ciência. Com algo que realmente alcançasse as pessoas para que entendessem que este é um problema global, e que precisamos administrar esse recurso juntos.
Como funciona o Mapa Mundial da Água?
Este Mapa Mundial da Água é um balanço global de cada gota de água doce, de todas as demandas e dos suprimentos. Ele permite enxergar uma lacuna, se houver uma. As pessoas podem ver sua própria bacia hidrográfica, sua própria área. Não só isso. Mas se o que está causando a falta é a agricultura, a irrigação ou o uso doméstico.
Como preservar esses bens que são fundamentais para a humanidade?
A forma como abordamos isso, na National Geographic, é financiar pessoas, como nosso explorador, Mark Durkins, da Universidade de Utrecht, na Holanda, que é o cérebro por trás da modelagem e dos dados que entram neste mapa. Nós financiamos a ciência. Mas também entendemos que é preciso conectar a ciência da hidrologia com a arte de contar histórias para que as pessoas sejam trazidas para o processo e entendam como funciona.
Como essas histórias podem ajudar?
Temos 22 pontos críticos diferentes em todo o mundo onde há falta de água significativa? O que é essa lacuna? O que está causando isso? E como está afetando a comunidade local? Vemos a narrativa como um elemento-chave para estimular a ação dos governos e dos gestores de recursos hídricos em escalas mais locais.
Quais são as questões mais prementes em relação a esses pontos críticos?
Como geógrafo, sei que o Brasil tem toneladas de água, enquanto o México tem escassez. Portanto, os problemas variam. Mas acho que um elemento muito importante, em todos os lugares, é a água subterrânea. Assim como os sistemas fluviais, porque conectam a terra ao oceano — todo sistema fluvial termina no oceano.
Qual o perigo de tentar transformar a água doce em commoditie?
É preocupante. O que temos feito [na National Geographic] é olhar para as demandas, para a contabilidade da água. Outra maneira de olhar para a água é como um recurso internacional. Não se pode apenas olhar localmente para a oferta e demanda, porque parte da demanda está sendo gerada para produzir coisas como alimentos ou roupas que serão consumidos em outro lugar. É um sistema muito complexo. Estamos fazendo o possível para trabalhar com cientistas e contadores de histórias para que as pessoas entendam que a água está em toda parte. E está se movendo de muitas maneiras diferentes. Não é apenas atravessando rios.
As alterações climáticas e a água, qual a relação entre os dois? Isso é algo que vai nos afetar a curto prazo?
Estamos procurando projetar as demandas de água para o futuro. Também estamos financiando pesquisadores, por exemplo, na Amazônia, que estão olhando desde a nascente do rio até o mar. E eles estão tentando estabelecer uma linha de base para que possamos medir como tudo isso está mudando. Um de nossos pesquisadores é o brasileiro Thiago Silva, baseado em uma universidade na Escócia, que está fazendo um trabalho realmente excelente nas florestas inundadas para entender melhor como elas funcionam e como as mudanças climáticas contribuíram para esse fenômeno.
Quais são os próximos passos?
Estamos comprometidos com um plano de financiamento de cinco anos para este mapa. O trabalho que está sendo feito na Universidade de Utrecht, na Holanda. Outro aspecto importante disso é que disponibilizamos para especialistas uma versão desse mapa com mais recursos para visualização de dados. Quando dizemos especialistas, queremos dizer qualquer pessoa que queira mergulhar nos dados. São cientistas, formuladores de políticas e governos, mas também jornalistas.