O ministro da Justiça, Torquato Jardim, afirmou neste sábado que o indulto de Natal publicado ontem, que abrandou as condições para condenados em corrupção obterem perdão, foi uma “posição política” do presidente Michel Temer. Segundo ele, Temer “entendeu que era o momento político adequado para uma visão mais liberal da questão do indulto”.
O decreto de indulto de Natal assinado por Temer provocou reações de procuradores e representantes da Operação Lava Jato. O texto ignorou solicitação da força-tarefa e recomendação das câmaras criminais do Ministério Público Federal que pediam, entre outros pontos, que os condenados por crimes contra a administração pública – como corrupção – não fossem agraciados pelo indulto. O decreto também reduziu o tempo necessário de cumprimento de pena para receber o benefício. O tempo mínimo passou de um quarto para um quinto da pena, no caso de não reincidentes, nos crimes sem violência – caso da corrupção.
Após as reações, o ministro da Justiça convocou uma coletiva de imprensa neste sábado, na qual fez ponderações sobre as razões que levaram o governo a editar o texto. Segundo ele, sugestões do Ministério Público foram ouvidas, assim como de outras pessoas e instituições e as recomendações foram apresentadas a Temer.
“O presidente Michel Temer é um professor de direito constitucional, foi duas vezes secretário de segurança pública. Conhece esse assunto como ninguém e entendeu, como posição política, que reflete uma visão mais liberal do direito penal sem dúvida alguma, que manter o apenado em regime fechado não é necessariamente a melhor solução. Basta ver que dois terços são reincidentes”, afirmou Torquato Jardim.
O ministro afirmou que a superpopulação carcerária e os índices de reincidência foram levados em conta para diminuir o tempo de cumprimento de pena. “O Brasil na sua história não venceu o desafio de trazer o apenado de volta à sociedade em larga escala”, disse Jardim, afirmando que a diminuição do tempo de pena “tem a ver com essa realidade”.
O benefício de Natal é previsto na Constituição e concede supressão das penas todos os anos, se atendidos determinados requisitos como cumprimento de parcela da punição.
Em novembro, os integrantes da força-tarefa em Curitiba estimaram que ao menos 37 condenados pelo juiz federal Sérgio Moro poderiam ser beneficiados pelo indulto. O coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, considerou o texto um “feirão de Natal para corruptos”. Para o subprocurador da República Mario Bonsaglia, responsável pela Câmara de Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional do MPF, o texto atual assinado por Temer foi um “retrocesso”, pois não acolheu as sugestões e recuou nos aperfeiçoamentos de 2016.
Teoria
O Ministério não avaliou casos concretos que seriam beneficiados, segundo o ministro. Para ele, é “difícil explicar para a sociedade” o texto e necessário “apelar pelo bom senso”. “Não é fácil explicar à opinião pública no momento político em que dezenas de personalidades ou já foram condenadas ou estão sendo investigadas. Compreendo muito bem que o senso de justiça do cidadão comum fica um pouco abalado. Talvez seja teoria demais para explicar”, afirmou.
Ao justificar a não exclusão dos crimes de corrupção do indulto, Torquato afirmou que a norma precisa ser “abstrata, impessoal e com tendência à universalidade”. “Escolher a quem perdoar ou punir antecipadamente é retorno ao arbítrio, a um Brasil superado pela constituição cidadã de 1988”, afirmou Torquato. Ele argumentou ainda que há outros temas que desafiam a segurança pública, além dos crimes financeiros – conhecidos como os crimes de colarinho branco.
“Como priorizar um sobre outro? Essa que é a pergunta ética. Eu vou excluir categoricamente os crimes financeiros? Porque não vou excluir o crime organizado das drogas? Por que não vou excluir o terrorismo? Como hierarquizar esses seis (temas) para dar preferência a um e permitir outro? Proibir o indulto do crime financeiro e permitir por drogas, armas e tráfico humano? Como hierarquizar?”, disse ele.
Questionado se isso significa que o combate à corrupção não é uma prioridade no governo, Torquato respondeu que “é uma das seis prioridades no governo”. As demais na área de segurança pública, segundo o ministro, são combates aos tráficos de drogas armas, tráfico humano, crimes cibernéticos e terrorismo.