Os bichos — a quem hoje a humanidade entrega carinho e paixão — podem agradecer ao primatólogo holandês Frans de Waal. Ao longo da história, a civilização esteve ancorada em uma máxima do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804): “O fato de que o ser humano consegue ter a representação do ‘eu’ o eleva infinitamente acima de outros seres na Terra”. De Waal mudou um tantinho dessa percepção, a partir de estudos com macacos bonobos. Direto ao ponto: animais também têm consciência de si mesmos — golfinhos e primatas se reconhecem em espelhos. “Não podemos tratá-los como máquinas. Tanto que hoje existem leis que os protegem, como as que proíbem, nos Estados Unidos, testes com símios”, disse De Waal a VEJA, em 2018.
Aliás, numa de suas obras mais conhecidas, A Era da Empatia (2009), ele mostrou, por meio de pesquisas, que a maioria dos mamíferos tem habilidades cognitivas similares às dos humanos. Em Política dos Chimpanzés (1982), fruto de um estudo de seis anos, tinha revelado a capacidade da fauna de constituir sociedades. Seus trabalhos — associados aos de nomes como a americana Dian Fossey (1932-1985) e a inglesa Jane Goodall, ajudaram a consagrar descobertas que mostraram ao mundo como os animais, incluindo os domésticos, expressam comportamentos e sentimentos que, no passado, eram considerados exclusivamente humanos, como amar e odiar. Sim, temos mais semelhanças com os bichos do mar, do céu e da terra do que diferenças — e isso, em vez de nos diminuir, só nos engrandece. De Waal morreu em 14 de março, aos 75 anos, em Atlanta, nos Estados Unidos, em decorrência de câncer de estômago.
Para soltar a voz
Era uma vez um engenheiro de uma empresa de objetos de consumo que cantava mal, mas muito mal mesmo. Ridicularizado por amigos, ele teve um lampejo. E então, em 1967, o japonês Shigeichi Negishi pediu a um amigo sabichão que desenvolvesse um protótipo capaz de reproduzir músicas instrumentais com um amplificador de microfone e uma mesa de mixagem. O primeiro produto foi um cubo de 30 centímetros de lado com um painel de luzinhas coloridas que acendiam ao ritmo da melodia. Nascera, com pompa e circunstância, o karaokê. Da próxima vez que você for cantar Pense em Mim, de Leandro & Leonardo, pense nele. Negishi morreu aos 100 anos, de causas naturais, em 26 de janeiro — mas a notícia só foi divulgada na semana passada.
Carinho pelos livros
O negócio começou com a mãe, Eva, idealizadora de uma biblioteca circulante que funcionava na casa da família, em São Paulo. O passo seguinte, depois do sucesso inicial, foi a criação da Livraria Cultura, em 1969, comandada por Pedro Herz e um irmão. A Cultura chegou a ter dezoito lojas em todo o país e mais de 9 milhões de livros no catálogo. Era ponto obrigatório de quem buscava conhecimento e atendimento delicado, muitas vezes do próprio Herz. Mas o inchaço e alguns erros de gestão inauguraram uma crise sem fim. Em 2018, com uma dívida de 285 milhões de reais, a livraria entrou em recuperação judicial. A falência mostrou-se inevitável. Herz morreu em 19 de março, aos 83 anos.
Publicado em VEJA de 22 de março de 2024, edição nº 2885