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Atraso da vacina e votação na Câmara põem reeleição de Bolsonaro em risco

O favoritismo do presidente é um dado da realidade, mas será colocado à prova por uma série de desafios nos próximos meses

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 14h35 - Publicado em 8 jan 2021, 06h00

Até a oposição reconhece que Jair Bolsonaro provavelmente conquistaria um novo mandato se a eleição fosse realizada hoje. O favoritismo do presidente é um dado da realidade, mas será posto à prova por uma série de desafios nos próximos meses. O mais urgente deles é a vacinação contra o novo coronavírus. Com reputação internacional de negacionista, Bolsonaro sempre desdenhou da gravidade da pandemia e desrespeitou o isolamento social. Revelando desprezo pelo conhecimento científico, adotou o mantra da “gripezinha” sob a alegação de que era preciso evitar o colapso da economia. Se essa preocupação era de fato verdadeira, torna-se uma evidente contradição a demora do governo para iniciar um programa consistente de imunização da população. A explicação é simples. Como bem observou o ministro Paulo Guedes em entrevista a VEJA, a vacinação em massa é fundamental para a retomada da produção, do emprego, da renda e do consumo. É uma iniciativa imprescindível tanto do ponto de vista sanitário quanto do econômico — e, a depender da forma como for executada, pode ter importantes impactos eleitorais.

De início, Bolsonaro fez pouco caso das vacinas, contestando a sua eficácia e pregando contra a sua obrigatoriedade, numa retórica destinada a entreter a sua claque mais radical. O recrudescimento da Covid-19, que já matou 200 000 pessoas no Brasil, e o apoio da maioria da população à imunização fizeram o presidente mudar de estratégia. Na terça-feira 5, ele orientou sua equipe a iniciar a vacinação rapidamente e a usar todos os imunizantes disponíveis no mercado, inclusive a CoronaVac, antes demonizada e tratada de forma pejorativa como a “vacina chinesa”. “Compraremos o mais rápido possível todas as vacinas que estejam registradas e tenham segurança comprovada”, determinou o presidente ao ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello. Numa tentativa de demonstrar que de agora em diante haverá um empenho verdadeiro no tema, o governo agiu em duas frentes. Na quarta-feira 6, editou uma medida provisória que facilita a compra de vacinas ao, entre outras coisas, dispensar a exigência de licitação. No mesmo dia, Pazuello prometeu, em rede nacional de rádio e televisão, vacinas gratuitas para todos e garantiu que não faltarão insumos, como seringas, para aplicá-las.

Em seu roteiro mais otimista, o governo acha que a vacinação pode ser iniciada até o próximo dia 20. Numa versão mais realista, trabalha com 10 de fevereiro. A primeira data não foi estipulada à toa. Cotado como adversário de Bolsonaro na futura sucessão presidencial, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), declarou no ano passado que começaria a vacinação no estado no próximo dia 25. O presidente, portanto, quer se antecipar ao rival. O problema é que a questão central não está em quem terá a primazia da imunização, mas quem executará o programa mais eficiente. Por enquanto, o governo federal tem nas mãos apenas um esboço do que fazer. A administração Bolsonaro garantiu, em regime de emergência, o recebimento de 2 milhões de doses da vacina produzida pelo laboratório AstraZeneca na Índia. A meta é que esse lote dê a largada na campanha de vacinação, que seria celebrada num grande evento nacional, e seja distribuído para todos os estados em voos comerciais e da Força Aérea Brasileira. Profissionais de saúde e idosos com mais de 75 anos terão tratamento prioritário. Como de costume, falta o que interessa: o detalhamento do programa de vacinação. Governadores estaduais, por exemplo, querem saber quando receberão suas doses e em qual quantidade. Até o fechamento desta edição, continuavam sem resposta.

Politica
PROTAGONISTAS - Maia, Gleisi e Lira: peças centrais na disputa pela presidência da Câmara – (Luis Macedo/Câmara dos Deputados; Najara Araújo/Câmara dos Deputados; Maryanna Oliveira/Câmara dos Deputados/.)
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“Nós vamos comprar todas as vacinas disponíveis. É o Sistema Único de Saúde (SUS) que vai comprar e distribuir, de forma equitativa, ao Brasil e, inclusive, a São Paulo”, diz um auxiliar do presidente, externando a obsessão pela competição particular com Doria. Os 2 milhões de doses emergenciais da AstraZeneca são suficientes apenas para a largada da vacinação. Para não haver interrupção no processo, o governo federal tende a ser obrigado a recorrer a novas compras emergenciais — e aí o presidente pode voltar a ser um problema. Na reunião com os ministros, Bolsonaro reclamou dos fornecedores — de seus preços a suas exigências, tachadas de “abusivas”. Ele também ressaltou que a vacinação em outros países se dá a passos lentos. No encontro, argumentou-se que, com exceção de potências como Estados Unidos e China, a maioria das nações mantém uma imunização tímida, que nem sequer pode ser considerada uma campanha eficiente para controlar a doença. Por esse raciocínio autoindulgente dos governistas, o Brasil não estaria tão atrasado. É um senhor erro de avaliação.

A demora na imunização contribuiu para a recente explosão dos casos de contaminação e, como destacado pelo ministro Paulo Guedes, retarda a recuperação da economia. Não bastassem os danos coletivos, o presidente corre risco de um efeito colateral individual: ver a sua popularidade desgastada. “As pessoas entendem que os países ricos vacinem primeiro”, diz o cientista político George Avelino, professor da FGV de São Paulo. “Mas, quando as pessoas começarem a olhar países em situação parecida à do Brasil vacinando, como Argentina, México, Chile, ou em situação até pior, como países da América Central, vão culpar alguém. Eventualmente, o presidente.” O ingrediente político em torno da vacina é tão evidente que se tornou assunto da eleição para a presidência da Câmara. Ao lançar sua candidatura para o comando da Casa, o deputado Baleia Rossi (MDB) defendeu vacina gratuita para todos e deixou claro que, se o governo federal não se mover, o Congresso agirá a fim de assegurar a imunização da população.

Rossi é o candidato de Rodrigo Maia (DEM), considerado por Bolsonaro o seu principal adversário no Congresso. Até agora, o emedebista, que fez carreira no governismo (veja reportagem na pág. 36), recebeu o apoio de onze partidos, que reúnem cerca de 280 deputados. Até o PT — presidido por Gleisi Hoffmann, conhecida por chamar o MDB de golpista — faz parte da aliança, que foi sedimentada diante do desejo de todos os integrantes de derrotar o candidato de Bolsonaro na disputa, o deputado Arthur Lira (Progressistas-­AL). A votação ocorrerá em fevereiro e também consta do rol dos desafios cruciais de Bolsonaro. Não é à toa. Entre as atribuições do presidente da Câmara estão dar seguimento a pedidos de impeachment e decidir quais projetos serão postos em votação no plenário. Para o governo, Lira representa a certeza de que qualquer tentativa de destituição de Bolsonaro será arquivada e, de quebra, que projetos considerados prioritários serão analisados. Tanto aqueles da agenda conservadora (veja reportagem na pág. 26) quanto o pacote de reformas estruturantes, vital para tirar a economia brasileira do atoleiro.

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A pouco menos de dois anos da eleição, a equação é bem simples: uma campanha de vacinação bem-sucedida e a vitória de Lira na Câmara fortalecem a candidatura à reeleição de Bolsonaro. Já o contrário pode minar o seu favoritismo. Se falhar na essencial tarefa de imunizar a população, o presidente pode ser, mais uma vez, o seu principal adversário.

Colaborou Nonato Viegas

Publicado em VEJA de 13 de janeiro de 2021, edição nº 2720

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