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Ariadne Ribeiro, 36, pedagoga: logo no parto, a pulseira rosa

Após o ‘sinal’ na maternidade, vieram a violência, o preconceito e a convivência tumultuada com a família; hoje doutoranda pela Unifesp, sonha com Harvard

Por Fernanda Bassette
Atualizado em 14 dez 2017, 18h53 - Publicado em 13 out 2017, 09h00
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  • Desde os primeiros minutos após o parto, um sinal inesperado já dizia à professora Silvia Ribeiro Ferreira, então com 19 anos, que ela acabara de dar à luz uma menina. Ariadne Ribeiro, hoje com 36 anos, nasceu de um complicado parto normal, um mês depois de seu pai morrer. Silvia não sabia o sexo do bebê e, ao receber a filha no colo, logo imaginou tratar-se de uma menina – ela fora identificada com uma pulseira cor-de-rosa. “Parabéns, você é mãe de um lindo menino”. Mas como explicar a pulseira rosa? “A enfermeira me disse que as azuis tinham acabado, então, todas as crianças estavam sendo identificadas com pulseiras rosa”, lembra Silvia.

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    Ariadne, na verdade, era um menino, mas desde muito cedo já dava sinais de que não se identificava com o seu sexo biológico. Aos 4 anos, quando sua irmã nasceu, Ariadne queria assumir os cuidados da menina para poder ficar mais tempo perto dela. Aprendeu com a avó materna, Neusa Laporta, a costurar vestidos de boneca para conseguir brincar com a irmã.

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    Os problemas começaram a surgir na adolescência, com o início da puberdade. A convivência familiar foi se tornando difícil, pois naquela época o padrasto não a aceitava e as brigas eram constantes. A mãe, sem saber o que era transexualidade, tinha vergonha do filho afeminado e, para piorar, um familiar muito próximo praticava abusos sexuais com Ariadne constantemente. “Eu sofria abuso sexual, físico e psicológico dia após dia”, conta a hoje pesquisadora do Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas (Cratod), ligado à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.

    Aos 13 anos, iniciou sua transição de gênero por conta própria, saiu de casa e foi morar com a avó. “Ela foi o meu porto seguro. Me abriu os braços e me deu o amor incondicional de que eu tanto precisava”, diz Ariadne. Aos 14, foi espancada por um grupo de alunos da escola em que estudava. Ficou com o rosto desfigurado e foi no colo da avó que se recuperou. Nessa época, abandonou os estudos. Aos 16, desesperada com a existência do pênis, tentou cortá-lo, trancada no banheiro. Mais uma vez, a avó estava lá para socorrê-la.

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    Também foi com o apoio e incentivo de Neusa que Ariadne procurou o Hospital das Clínicas, em São Paulo, para dar continuidade à sua transição de gênero por meio da cirurgia de transgenitalização. Era 1997, a jovem ouviu no rádio a notícia de que o Conselho Federal de Medicina havia aprovado o início da prática cirúrgica no Brasil. “Ficamos tão felizes que dançamos abraçadas ao som da música Bandolins [de Oswaldo Montenegro], que tocou logo em seguida.”

    Quando Ariadne tinha 18 anos, Neusa morreu em decorrência de um câncer agressivo. “Um pedaço de mim morreu junto”, diz, ao descrever que, sem o apoio da avó, voltou a “perder o chão”. “Comecei a usar drogas. Na minha primeira bebedeira por causa da morte dela, fui estuprada”, diz, com a voz embargada.

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    Nas ruas, Ariadne viveu o pior dos mundos e descobriu que não era aquilo que ela queria para a sua vida. Aos 21, decidiu voltar com os estudos a distância e, de novo, esbarrou no preconceito de gênero. Fez a prova final, conferiu o gabarito e, para sua surpresa, seu nome não aparecia entre os aprovados. “Eles cancelaram a minha prova porque a assinatura com nome social não batia com o nome de registro”, conta. Mas Ariadne não desistiu. Completou o ensino médio, fez faculdade e se livrou das drogas graças a sua força de vontade.

    Ficamos tão felizes [ela e a avó, ao saber da autorização para cirurgia de mudança de gênero no Brasil] que dançamos abraçadas ao som da música Bandolins, que tocou logo em seguida

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    Aos 28 anos, fez a cirurgia de mudança de sexo. É o protocolo número 20 do HC, pioneiro na área. Anos depois, em um trabalho, conheceu Leonardo, com quem se casou e viveu por três anos, até a sua morte. É a ele que Ariadne atribui o incentivo para continuar estudando e não desistir de seus sonhos. Ela fez mestrado e agora cursa o doutorado na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com o sonho de fazer o PhD em Harvard, nos Estados Unidos. “O Léo foi o grande amor da minha vida.”

    A reaproximação com a família aconteceu aos poucos, depois da completa transição de Ariadne. Hoje, ela é considerada um exemplo de vida pelos irmãos e sobrinhos e se dá muito bem com a mãe – a quem ela também declara amor eterno. “Hoje eu vejo que para ela também não foi fácil passar por isso. Deixar eu ir morar com minha avó foi um ato de amor pleno, para me proteger. Se não fosse o amor dela, talvez hoje eu não estivesse aqui.”

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    Imagens captadas com Samsung Gear 360

    Conheça a história de dez transexuais


    Ariadne Ribeiro
    36 anos, pedagoga


    Bruna Coutinho da Silva
    52 anos, professora

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    Erick Barbi
    38 anos, músico, empresário e publicitário


    Gabriel Graça de Oliveira
    51 anos, psiquiatra e professor


    Jordhan Lessa
    50 anos, guarda civil


    Laura de Castro Teixeira
    36 anos, delegada

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    Leona Jhovs
    30 anos, atriz, produtora e apresentadora


    Luca Scarpelli
    27 anos, publicitário


    Luiza Coppieters
    38 anos, professora


    Matthew Miranda Gondin
    25 anos, auxiliar de escritório e empresário

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