Brasil e Argentina, Real Madrid e Barcelona, que nada… Poucas rivalidades são tão mercuriais quanto a das franquias de games Fifa Football e Pro Evolution Soccer (PES, outrora conhecido como Winning Eleven). Há quase três décadas, suas desenvolvedoras — EA Sports e Konami, respectivamente — lutam pela supremacia entre os simuladores de futebol, leiloando licenças de clubes e ligas e aprimorando as experiências virtuais. Agora, a partida esquentou ainda mais, com briga entre os — digamos assim — cartolas. Depois de anos de parceria, a Fifa (a Federação Internacional de Futebol) rompeu com a EA Sports e quer ter seu próprio game. E outros títulos estão chegando para desafiar o duopólio dos líderes do mercado.
Em 2023, depois de um casamento aparentemente perfeito, a EA Sports e a Fifa não chegaram a um acordo de renovação. A entidade máxima do futebol pediu mais do que o dobro do valor atual para que a série levasse sua chancela, o que acabou com o relacionamento. A versão atual, Fifa 23, será a última do acordo. Com isso, a franquia passará a se chamar EA Sports FC. Ao que tudo indica, as transformações no game não serão tão impactantes — vale a máxima de que em time que está ganhando não se mexe. A produtora americana, que faturou o equivalente a cerca de 25 bilhões de reais em 2022, corre para assegurar os mesmos contratos com jogadores e clubes que já tinha (um de seus pontos mais fortes). Só para a inglesa Premier League, os valores giram em torno de 3 bilhões de reais. Além dela, o jogo reúne 19 000 atletas, 700 equipes e trinta campeonatos licenciados, incluindo representantes do futebol feminino.
Soa inacreditável, mas esse universo não abrange os times brasileiros, dada a desestruturação da “liga” nacional, embora ofereça competições da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) para as telas. “Meu maior receio era a perda da influência ao não ter o nome Fifa”, diz o streamer MuuhPro, que produz conteúdos sobre games de futebol e tem mais de 3,6 milhões de inscritos em seu canal no YouTube. “Mas, conversando com os criadores, não deve mudar muita coisa. O título deve perder poucos eventos.” Quem corre por fora é a própria federação comandada por Gianni Infantino. O presidente da Fifa já alardeou que a entidade terá seu próprio jogo em 2025. Por ora, espalham-se mais especulações do que dados a respeito.
Enquanto isso, a arquirrival Konami implementou mudanças mais profundas. A partir de 2020, para incentivar ainda mais o e-sport em sua plataforma e repaginar a franquia que vinha numa decrescente, a empresa japonesa adotou a marca eFootball, aposentando o nome PES e trazendo mais inovações em comparação às edições passadas. Até então, a série havia vendido cerca de 111 milhões de cópias, além de 400 milhões de downloads para smartphones. E a tática surtiu efeito, a ponto de a produtora atingir lucro próximo de 10 bilhões de reais. Uma das apostas da casa foi o jogo grátis, manobra para atrair fãs e consolidar as microtransações nos modos on-line. Só que a franquia parece ter emperrado depois disso. Em 2021, o jogo não passou de mera atualização no software. E a sequência, de 2022, também teve resultados aquém do esperado. Um lançamento cheio de bugs que pioraram a resolução das imagens, a ponto de a Konami emitir um pedido público de desculpas.
Desde então, atualizações significativas foram feitas, com o retorno de módulos clássicos e apreciados pelos jogadores, como Master Liga e Rumo ao Estrelato, bem como uma versão especial para celular. O atual eFootball 2023 subiu um pouco o sarrafo, pois não quer perder de goleada dos velhos e novos adversários. Até porque, pela tangente, correm ingressantes no mercado. A Strikerz, uma produtora bem menor, vem trabalhando no desenvolvimento do UFL, um jogo gratuito e “justo”, sem transações on-line, de acordo com os criadores. Cristiano Ronaldo, Lukaku e De Bruyne são alguns dos craques que embarcaram na proposta e se tornaram embaixadores. Contudo, o título está atrasado no cronograma. Apesar da propaganda, ainda passa por melhorias e aguarda lançamento. Será que vai arranhar o duelo entre EA Sports e Konami? E com a Fifa no páreo? O apito soou, e há muito jogo pela frente.
Publicado em VEJA de 5 de Julho de 2023, edição nº 2848