Elon Musk precisava mesmo mudar de assunto. O quadragésimo homem mais rico do mundo, de acordo com a tradicional lista da revista Forbes, foi processado por acionistas minoritários de sua empresa de carros elétricos Tesla, que alegam ter sido prejudicados por suas postagens nas redes sociais. A acusação veio na esteira de uma decisão judicial que autorizou a SEC, equivalente americana da Comissão de Valores Mobiliários, a punir o executivo pelos tais tuítes, que exageravam a quantidade de carros que a montadora conseguiria produzir em 2019 (o próprio Musk corrigiu a informação em novo post, quatro horas depois). A Tesla contra-atacou a SEC, com a qual nunca teve uma boa relação, afirmando que o órgão estaria extrapolando seus poderes ao negar a seu presidente a liberdade de expressão. Também pegou mal para a montadora o anúncio de que iria fechar todas as suas lojas físicas, o que obrigaria clientes a comprar seus carros sem vê-los de perto, que dirá fazer um test drive. Uma queda de 14% nas ações da companhia fez a montadora voltar atrás na decisão. Por tudo isso, veio em ótima hora o lançamento do Modelo Y, o primeiro utilitário compacto elétrico do mundo, revelado na quinta-feira 14. “Trata-se do segmento de carros que mais cresce no mundo, e a Tesla demorou até demais para oferecer um modelo elétrico”, afirma Michael Tracy, consultor do Agile Group.
A estratégia da Tesla é agressiva. Ela quer deixar de ser uma marca de luxo, a que apenas os mais abastados podem aspirar, para chegar às massas. O primeiro passo foi começar a vender, no mês passado, uma versão mais simples de seu Modelo 3 por 35 000 dólares — metade do valor das versões mais turbinadas do mesmo carro. Para a companhia conseguir comercializar o Modelo Y numa faixa de preço similar, ele dividirá 75% das peças com o Modelo 3, o que vai baratear sua produção. Mais do que conquistar os americanos, a Tesla quer seduzir os consumidores do maior mercado de carros do planeta: a China. Atualmente o governo de Pequim vem incentivando a população a adotar os modelos elétricos, muito menos poluentes. A Tesla quer aproveitar a situação para vender milhões de unidades.
Enquanto americanos e chineses disputam o mercado de veículos elétricos, os estados brasileiros despendem esforços hercúleos para segurar ou atrair montadoras de automóveis a gasolina ou etanol. O caso da Ford é emblemático: a empresa decidiu cessar a produção de caminhões em todo o mundo, e assim decretou o fechamento da fábrica de São Bernardo do Campo, especializada no segmento. Depois de reuniões da direção da Ford Brasil com governos municipal, estadual e federal, os executivos reafirmaram que a decisão é irreversível. Ainda assim, o governador de São Paulo, João Doria, anunciou benefícios fiscais para que as montadoras invistam no estado. A medida nem sequer foi discutida com os dirigentes do setor, e levou os executivos na sede da Ford nos Estados Unidos a reafirmar o que já havia sido reafirmado. Falta aos governantes locais olhar para a frente.
Publicado em VEJA de 20 de março de 2019, edição nº 2626
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