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Natureza biônica: as ideias tecnológicas que imitam os recursos da fauna

Drones que conseguem percorrer variados terrenos e 'narizes ópticos' que podem cheirar doenças estão entre elas

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 22 jul 2023, 08h00

Único planeta do sistema solar que abriga vida, a Terra é lar de uma variedade de minúsculos organismos há 3,8 bilhões de anos. Muito antes, portanto, do surgimento do Homo sapiens, há cerca de 300 000 anos, e de suas posteriores ações danosas à biodiversidade terrestre — exemplo recente é o aquecimento global. Acontece que a natureza, sempre sábia, já havia se adaptado a outras adversidades, como as várias eras glaciais e as repetidas extinções em massa. Muitas dessas soluções naturais estão, portanto, disponíveis para designers, engenheiros e inventores emprestarem delas ideias que podem ser aplicadas ao cotidiano. Com o avanço da tecnologia, muitas se sofisticam cada vez mais, como um drone que se inspira em capacidades animais para superar diversos tipos de terreno ou um aparelho que mimetiza a capacidade olfativa de um cão de caça.

Descrito em um estudo publicado recentemente na prestigiosa revista Nature, o Morphobot (M4) é um robô capaz de transformar seus membros em rodas, hélices, pernas ou mãos para percorrer vários tipos de superfície, em terra ou no ar. Com habilidades “emprestadas” de animais como pássaros, suricatos e focas, o autômato pode executar diferentes movimentos para navegar no ambiente, incluindo voar, rolar, rastejar, agachar, equilibrar e cair. Com apenas 6 quilos de peso, terá utilidade na busca e resgate depois de desastres naturais, exploração espacial e entrega automatizada de pacotes. “Podemos beber de sistemas biológicos e usá-los como modelos para resolver desafios de engenharia”, diz o professor Alireza Ramezani, da Northeastern University, nos Estados Unidos, principal autor do estudo.

SOLUÇÃO ÓBVIA - A bióloga americana Janine Benyus: criadora de um termo inovador, a biomimética
SOLUÇÃO ÓBVIA - A bióloga americana Janine Benyus: criadora de um termo inovador, a biomimética (//Divulgação)

Há outras boas surpresas, como um nariz óptico “tão sensível quanto o de um cão de caça e tão seletivo quanto o de um inseto”, desenvolvido pela professora Judith Su, da Universidade do Arizona. Ele tem a vantagem de evitar o risco de pôr bichos reais em situações potencialmente perigosas. Como exercício de comparação, na criação de máquinas que mimetizam a fauna: o nariz humano tem 6 milhões de receptores olfativos e pode distinguir entre pelo menos 1 trilhão de odores diferentes. Os cães têm cerca de 300 milhões desses receptores, com alguns cientistas estimando que seu olfato é até 100 000 vezes mais poderoso que o dos humanos. Isso permite que os cachorros detectem o cheiro de materiais perigosos, como bombas e substâncias ilícitas, bem como condições médicas como a Covid-19 e o Parkinson.

Há beleza nesse movimento científico, em que problemas reais pedem soluções naturais, e elas estão diante de nossos olhos. “Existe um mundo funcional que foi inventado muito antes de nós e já foi testado pelo tempo”, disse a VEJA a bióloga americana Janine Benyus, que cunhou um termo — a biomimética — para definir a prática que, agora, ganha velocidade e visibilidade. É o caso do trem-bala japonês, que nos anos 1980 estava criando poluição sonora grave. Até que o engenheiro Eiji Nakatsu teve uma ideia ao observar pássaros martins-pescadores mergulhando na água para pegar suas presas. Os pequenos não faziam um barulho sequer. Então, Nakatsu projetou um “bico” de aço de aproximadamente 15 metros de comprimento para os trens de alta velocidade, a fim de reduzir o impacto sonoro. Isso não apenas resolveu o problema, mas também aumentou a eficiência do Shinkansen em 10% a 15%. E ele não parou nisso. O engenheiro nipônico também redesenhou a forma do pantógrafo do trem, dispositivo instalado no teto que permite a coleta de eletricidade da linha de contato, para imitar as asas de uma coruja. Além disso, traçou peças para o amortecimento de ruído, dentadas, semelhantes a penas.

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É UM PÁSSARO! - O engenheiro japonês Eiji Nakatsu e sua invenção, o trem-bala (acima): inspiração no bico do martim-pescador
É UM PÁSSARO! - O engenheiro japonês Eiji Nakatsu e sua invenção, o trem-bala (acima): inspiração no bico do martim-pescador (David Vêluz/Divulgação)

Há uma fascinante lição desse casamento do progresso das máquinas com a pureza do mato: ao olhar para a natureza não mais como um ambiente selvagem e perigoso, mas sim como fruto de um riquíssimo processo de evolução (Charles Darwin sabia das coisas), o ser humano estabelece um duplo passo: aprende com o que vê e, a um só tempo, trata de proteger o que não pode ser destruído.

Publicado em VEJA de 26 de julho de 2023, edição nº 2851

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