Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana
Continua após publicidade

Fim da contagem de curtidas no Instagram gera polêmica nas redes

Mudança mostra que as mídias sociais podem se preocupar com o bem-estar do usuário — mas também querem lucrar com isso

Por Filipe Vilicic, André Lopes Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 15h15 - Publicado em 26 jul 2019, 07h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • “É uma coisa bizarra para mim essas pessoas que vivem no Instagram. Viraram até empreendedores dentro do app. A gente não imaginava isso.” Em tempos de preocupações — vá lá — “compartilhadas” sobre o potencial das redes sociais para viciar os usuários, influir no seu comportamento e alimentar maquinações políticas, seria razoável esperar que tal afirmação viesse de algum acadêmico dedicado ao estudo desse que é o fenômeno mais ruidoso da era da internet. A frase, contudo, foi dita por ninguém menos que um dos fundadores do próprio Instagram, o empreendedor paulistano Michel “Mike” Krieger — que em 2010 lançou o aplicativo ao lado do colega americano Kevin Systrom —, durante um evento recente para empresários realizado no Vale do Silício, Califórnia. O desconcerto de Krieger com sua criação ganha ainda mais peso quando se leva em conta o modo como ele definiu o app, em entrevista a VEJA, dias antes de vendê-lo ao Facebook por 1 bilhão de dólares, em 2012: “Uma rede de visual limpo, exclusivamente para o compartilhamento de fotos”. De lá para cá, o Instagram passou por diversas transformações que o agigantaram e alteraram para valer sua proposta inicial (veja o quadro ao final da reportagem). A mais barulhenta ocorreu no último dia 17: o fim da contagem de curtidas (likes) nos posts.

    Ao criticar, no encontro californiano, a forma como algumas pessoas abusam do tempo gasto na rede social, Krieger se referia àquelas que a utilizam para vender produtos — incluindo a si mesmas, no caso de modelos, atores e dos chamados influenciadores digitais. A publicidade no Instagram é um negócio gigante, do qual a plataforma não tira um centavo. Entre os que mais cobram de anunciantes está a celebridade americana Kylie Jenner: 1 milhão de dólares por post. Krieger e Systrom mantiveram-­se na companhia por seis anos depois da compra pelo Facebook, mas abandonaram suas hostes em 2018, por conflitos com as novas diretrizes. “Queria ter visto o app seguir em direção diferente. Crescemos, mas ao custo da falta de autonomia”, explicou o brasileiro. Especula-se que a dupla teria se incomodado com o modo como o Instagram passou a ficar cada vez mais similar às outras mídias sociais — inclusive em relação à cacofonia do ambiente virtual, infestado de radicalizações que contribuíram para a ascensão de discursos extremados e para a projeção de populistas como Donald Trump e Jair Bolsonaro.

    O projeto, ainda em fase experimental, de acabar com a contagem dos likes no Instagram — agora, só quem fez o post vê quantas pessoas curtiram sua foto — teve início em maio, no Canadá. Após vingar por lá, foi implementado no Brasil. O país é o segundo maior mercado do aplicativo, praticamente empatado com a Índia e atrás dos Estados Unidos, onde há 110 milhões de usuários. Em torno de 70 milhões de brasileiros estão cadastrados no Instagram — o dobro da população canadense. Segundo comunicado da empresa, o objetivo da iniciativa é fazer com que “os seguidores se concentrem mais nas fotos e nos vídeos que são compartilhados do que na quantidade de curtidas”. O aplicativo fala ainda em promover maior bem-estar na comunidade: “Não queremos que as pessoas sintam que estão em uma competição”.

    Nos últimos anos, estudos comprovaram os malefícios do tempo excessivo dedicado a sites e apps. Em 2017, uma pesquisa da Universidade de Seul, na Coreia do Sul, revelou que o abuso produz alterações químicas no cérebro, com reações e síndrome de abstinência semelhantes às sofridas por dependentes de drogas. Há consenso entre médicos de que permanecer acima de três horas diárias conectado pode tornar o hábito prejudicial. No Brasil, onde 62% da população tem perfil em mídias sociais, a média é de nove horas on-line — quatro delas dedicadas à navegação pelas redes. Levantamento realizado no ano passado pelo órgão inglês Royal Society for Public Health apontou o Instagram como a mídia social com o pior impacto na saúde mental, responsável por sentimentos de ansiedade, depressão e solidão.

    Antes do fim das curtidas, o Instagram já adotara, principalmente desde 2017, outras medidas que visam a transformar o ambiente virtual em uma ágora de conversas mais, digamos, saudáveis. “As redes têm testado mudanças de design que significativamente contrariam o que faziam antes. O objetivo aparente é terem um impacto social mais positivo, tornando-se assim, elas mesmas, melhores ‘cidadãs corporativas’ ”, diz o engenheiro americano Aviv Ovadya, fundador do Centro de Responsabilidade para Mídias Sociais da Universidade de Michigan.

    O Instagram já lançou uma ferramenta para controlar o tempo de uso e outra que funciona como filtro de comentários ofensivos, além de recursos que oferecem apoio a indivíduos que demonstrem sinais de depressão ou sejam alvo de ataques agressivos (o bullying vir­tual). O próprio Facebook tem seguido a tendência, com esforços para banir perfis considerados extremistas — como neonazistas —, diminuir a repercussão de notícias falsas e fomentar diálogos mais fraternais. Nos bastidores, comenta-se que, se der certo no Instagram, o fim da exibição do número de likes em um post também poderá ser adotado pelo Facebook.

    Interactive Keynote: Instagram Founders Kevin Systrom & Mike Krieger with Josh Constine – 2019 SXSW Conference and Festivals
    “COISA BIZARRA” - Krieger, cofundador do Instagram: desvios no projeto inicial (Chris Saucedo/SXSW/Getty Images)
    Continua após a publicidade

    Na esfera virtual, o fim dos likes ganhou aplausos e vaias (leia frases abaixo). De acordo com levantamento realizado pela agência Sprinklr, a pedido de VEJA, com base na análise de 570 000 tuítes, entre os comentários que expressaram alguma opinião, cerca de 60% apoiaram, enquanto 40% foram contra. A maioria dos influenciadores digitais que já conquistaram audiência está no primeiro grupo — caso do youtuber Felipe Castanhari, por exemplo. Do outro lado ficaram uma parcela dos microinfluenciadores — que têm alcance menor que o das celebridades estabelecidas e dependem, em parte, da exibição de curtidas para vender-se a marcas dispostas a patrociná-­los — e políticos como o vereador Carlos Bolsonaro (PSL-RJ), famoso por manifestações intempestivas nas redes.

    Por trás da imagem de bom-mocismo que agora esses gigantes do Vale do Silício querem passar, existem, é claro, interesses comerciais. “Se a relação com nossos produtos for mais positiva, é natural que as pessoas fiquem dispostas a ver conteúdo de qualidade neles”, diz a advogada Daniele Kleiner, gerente de bem-estar do Facebook na América Latina. Por “conteúdo de qualidade” entenda-se também “anúncios” — a fonte de lucro das mídias sociais. Avalia o psicólogo Rodrigo Nejm, diretor da ONG SaferNet, dedicada à promoção de um ambiente saudável na internet: “Essas plataformas podem fazer bem, desde que se consiga acessá-las com senso crítico. O fim da exibição das curtidas ajuda nisso”. O interesse financeiro das redes, afinal, pode coincidir com o bem-­estar dos usuários.


    ASLucas Feuerschütte Luba 1

    “Essa vida de rede social te suga. Suga o tempo, suga energia física e psicológica. Vicia.”
    Lucas Feuerschütte, conhecido como Luba, youtuber, no YouTube

    Continua após a publicidade

    Marcos Palmeira

    “Eu acho bom.”
    Marcos Palmeira, ator global, no Instagram


    SMAISA SILVA-SBT-2018-23

    Continua após a publicidade

    “Muito legal o Insta ter tirado as curtidas. Muitas pessoas vão se beneficiar.”
    Maisa Silva, atriz e apresentadora de TV, no Twitter


    SFelipe Castanhari youtuber 10
    (./.)

     

    “Viva o fim do LIKE! Já vi muitos se frustrando simplesmente por não ter um número ‘x’ de likes em determinada foto, e isso faz mal.”
    Felipe Castanhari, youtuber, no Twitter


    Deputa Carla Zambelli (PSL-SP)
    (Reprodução/VEJA)
    Continua após a publicidade

    “Tudo para a gorda feminista peluda do cabelo roxo não ficar deprimida ao ver o desempenho da coleguinha na rede.”
    Carla Zambelli, deputada federal (PSL-SP), no Twitter


    São José dos Campos (SP) 29/04/2018 – Politica / Economia

    “Não concordo com essa política porque os likes são importantes para os negócios.”
    Arthur do Val, youtuber e deputado estadual (DEM-SP), no YouTube


    Presidente exigiu interferência da PF para proteger o filho Zero Dois

    Continua após a publicidade

    “As justificativas usadas para não mostrar as curtidas no Instagram, como combate ao bullying e suas derivações, são apenas a certeza de que seguem a cartilha ideológica ‘progressista’. Querem limitar o interesse da informação e criar manipulados.”
    Carlos Bolsonaro, vereador (PSC-RJ), o filho Zero Dois do presidente Jair Bolsonaro, no Twitter


    1Maju Trindade-Youtuber 3
    (./.)

    “Não acho que a real intenção do Instagram é se preocupar de fato com a saúde dos usuários.”
    Maju Trindade, modelo e youtuber, no Twitter

    arte-instagram-iphone
    (ARTE/VEJA)

    Publicado em VEJA de 31 de julho de 2019, edição nº 2645

    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Semana Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    Apenas 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

    a partir de 35,60/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.