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Empresas aéreas preparam o relançamento dos supersônicos

Quase duas décadas depois do fim do Concorde, empresas projetam aviões ainda mais rápidos, de olho nos muito ricos e nos altos executivos que têm pressa

Por Caio Saad Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 15h29 - Publicado em 4 set 2020, 06h00

Nos anos 1980 e 1990, quando viajar de avião era um luxo, nada se comparava ao glamour de uma passagem no Concorde, a aeronave supersônica de desenho avançado, capaz de percorrer a rota Londres-Nova York em três horas e meia (menos da metade das oito regulamentares). Com o tempo, o fascínio e as pessoas dispostas a bancar o bilhete aéreo caríssimo foram diminuindo, os problemas se acumularam e, em 2003, o Concorde foi aposentado e virou peça de museu. Os supersônicos, no entanto, continuam vivos em pelo menos seis projetos que pretendem fazer renascer, nos próximos anos, as viagens intercontinentais ultrarrápidas. O anúncio mais recente veio da Virgin Galactic, braço da empresa de aviação britânica que também desenvolve um foguete para passeios espaciais. No início de agosto, ela firmou parceria com a Rolls-­Royce, fabricante dos motores do Concorde, para a criação de um modelo comercial capaz de voar a três vezes a velocidade do som — o Mach 3, equivalente a alucinantes 3 700 quilômetros por hora, que reduziria o itinerário Londres-Nova York a uma hora e meia. “Vamos abrir uma nova fronteira nos trajetos em alta velocidade”, prometeu o chefe de operações da empresa, George Whitesides.

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A Boeing, por sua vez, vem trabalhando há dois anos em um projeto ainda mais ousado: operar a Mach 5 — ou a 6 100 quilômetros por hora —, baixando o tempo do voo transatlântico para uma horinha. “Esse avião permitirá que uma pessoa cruze o oceano, ida e volta, em um dia”, diz Kevin Bowcutt, chefe do setor de hipersônicos da Boeing, que prevê o voo inaugural para aproximadamente 2030. Também a Lockheed Martin está desenvolvendo um projeto supersônico, em parceria com a Nasa. O ponto central das pesquisas é como atenuar o tremendo “buuum” que ressoa ao se cruzar a barreira do som. “Definitivamente, o barulho é o mais importante”, afirma Paulo Greco Jr, professor de engenharia aeronáutica na Escola de Engenharia da USP em São Carlos. Por causa dele, o Concorde foi proibido de alcançar velocidade máxima sobre continentes — só podia fazê-lo sobre o mar. Uma das soluções em estudo é mudar a posição dos motores — em vez de estarem embaixo das asas, eles ficariam em cima delas, e sua estrutura funcionaria como um escudo para impedir a propagação do som.

Os novos supersônicos são, em geral, para poucas pessoas. Enquanto o Concorde acomodava de noventa a 120 passageiros, o projeto da Boeing permite no máximo 100 e o da Virgin, dezenove. O Overture, projetado pela Boom, startup em parte financiada pela Virgin, comportará 55 passageiros, atingirá velocidade parecida com o Mach 2 do Concorde e deve entrar em teste em 2025. Os dois mais lentos (Mach 1.4), se é que se pode usar o termo, são o Aerion AS2, com capacidade prevista de doze assentos e estreia estimada em 2027, e o Spike S-512, para dezoito pessoas, esperado em 2025. “Com a eliminação da primeira classe em muitas companhias aéreas, os novos supersônicos têm chance de atrair a clientela muito rica. Mas o grande mercado deve ser o de altos executivos que não podem perder tempo”, diz Guilherme Machado, da consultoria em aviação executiva Asa Consulting.

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APOSENTADO - Concorde: design avançado e rejeição ao estrondo sônico – (Daniel Janin/AFP)
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O Concorde fez o primeiro voo comercial em 1976, de Paris ao Rio de Janeiro, com escala em Dacar. Tempo de percurso: seis horas, metade do usual. Valor da passagem: cerca de 90 000 reais (ainda não há previsão de preço para os novos supersônicos). Seu interior lembrava muito a classe econômica de hoje. A diferença estava nos serviços, com refeições à base de caviar e champanhe. “Pilotei um voo da British Airways para o Rio de Janeiro em 5 de abril de 1985. A recepção foi fenomenal, animada, viva, simpática. Na partida, sobrevoei a Praia de Copacabana e o Cristo Redentor. Lembro como se fosse hoje”, disse a VEJA o piloto inglês Mike Bannister, que também comandou a última viagem do Concorde, Nova York-­Londres, em outubro de 2003. A martelada supersônica da pandemia sobre a aviação pode atrapalhar os prazos da nova aeronave ultrarrápida, mas, nos EUA, já está em movimento projeto de lei para autorizar os voos acima de Mach 1. Depois disso, o céu não terá limite.

Publicado em VEJA de 9 de setembro de 2020, edição nº 2703

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