O Hospital Oswaldo Cruz e o Grupo Fleury acabam de iniciar um dos mais importantes projetos feitos até agora sobre a saúde do coração do brasileiro. As instituições realizarão o primeiro levantamento do perfil genético da população associado as doenças cardiovasculares, principais causas de mortes no país. Hoje, as informações usadas nesse tipo de avaliação são baseadas em análises executadas nos Estados Unidos, Europa e Ásia. Embora boa parte do material genético relacionado às enfermidades seja universal, é fundamental identificar as características específicas dos nossos habitantes, tendo em vista, inclusive, a enorme heterogeneidade resultante da miscigenação de raças que marca o povo do Brasil. Só assim finalmente será possível criar um score de risco genético sob medida para atender também as especificidades nacionais, ferramenta importante na prevenção e diagnóstico mais preciso. “Estamos dando um passo inédito para validar um score de risco para as doenças cardiovasculares que traduzirá a variabilidade genética do brasileiro”, afirma Álvaro Avezum, diretor do Centro Internacional de Pesquisa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e principal pesquisador do projeto.
A pesquisa examinará o DNA de 3,8 mil indivíduos que estão em recrutamento em 45 centros de 19 estados distribuídos nas cinco regiões. Metade dos participantes será composta por pessoas que sofreram infarto, acidente vascular cerebral ou doença arterial periférica. O restante são voluntários saudáveis, que integrarão o grupo controle. Os primeiros resultados são esperados para 2024. Os dados serão integrados ao Programa Nacional de Genômica e Saúde de Precisão – Genomas Brasil, do Ministério da Saúde, já que o projeto faz parte da parceria do Oswaldo Cruz com o Executivo Federal por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS), constituído por seis hospitais de excelência sem fins lucrativos e o ministério. O programa consiste no desenvolvimento e adoção de iniciativas que melhorem a assistência à saúde pública, pelas instituições, em troca de imunidade fiscal no valor correspondente ao projeto. Nesse caso, haverá ainda investimento do Grupo Fleury. Do total de vinte milhões de reais, oito milhões serão de responsabilidade do hospital e doze milhões, do Fleury.
O levantamento trará à luz fatores genéticos ainda desconhecidos associados aos elementos de risco para doenças cardiovasculares – LDL (colesterol ruim) elevado, diabetes, hipertensão e obesidade – e sua relação com fatores de risco comportamentais, como tabagismo e sedentarismo, e também aqueles cujo impacto ocorre de forma independente. Além de servirem de base para a criação do score, as informações também poderão ser usadas em diversos estudos epidemiológicos, o que aumentará a compreensão de como se dá a manifestação das enfermidades de acordo com regiões, grupos sociais ou faixa etária, por exemplo. “Será possível fazer recortes segundo o objetivo dos trabalhos”, diz Haliton Alves de Oliveira Junior, gerente de Pesquisas e Projetos do Oswaldo Cruz.
O retrato a ser obtido possibilita que o cuidado à saúde cardiovascular do brasileiro torne-se cada vez mais personalizada, ajudando a consolidar a cardiologia nacional dentro da chamada medicina de precisão. A área é hoje uma das mais importantes na assistência e está baseada no conhecimento mais profundo das características genéticas envolvidas no surgimento e evolução das doenças. Com as informações em mãos, os profissionais conseguem diagnosticar e traçar estratégias de tratamento dirigidas e, portanto, mais eficientes. Dados do gênero têm sido usados na criação de exames conhecidos como painéis genéticos, que detectam alterações no DNA vinculadas especificamente à doença. “A ideia é desenvolver testes do gênero adequados ao material genético do brasileiro”, explica Edgar Gil Rizzatti, diretor executivo Médico e de Negócios B2B do Grupo Fleury.
Além disso, conhecer o peso dos genes na manifestação das enfermidades permite o monitoramento mais próximo dos indivíduos. “Dependendo do impacto que eles têm em determinadas pessoas, pode-se recomendar o acompanhamento de toda a família”, explica Maria Carolina Tostes Pintão, Head Médica de Pesquisa e Desenvolvimento do Grupo Fleury.
Os achados terão de ser validados por outros estudos, como manda a boa ciência. Mas saber que as respostas já começaram a ser buscadas sem dúvida é uma ótima notícia.