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Sputnik V: Anvisa veta pedidos de estados para importação de doses

Decisão foi baseada em análises técnicas que detectaram inconformidades em testes e etapas de produção ligadas a segurança e eficácia do imunizante

Por Mariana Rosário Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 26 abr 2021, 23h55 - Publicado em 26 abr 2021, 23h03

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) rejeitou nesta segunda-feira, 24, os pedidos de importação da vacina russa contra Covid-19 Sputnik V, do Instituto Gamaleya, realizados por dez estados brasileiros. São eles Bahia, Acre, Rio Grande do Norte, Maranhão, Mato Grosso, Piauí, Ceará, Sergipe, Pernambuco e Rondônia. As doses encomendadas por esses governos somam cerca de 29,6 milhões de aplicações.

A decisão unânime foi embasada em uma série de pareceres técnicos que levantaram dúvidas sobre falhas em etapas de produção e estudo que comprometem a análise da  segurança e eficácia do fármaco. A eventual autorização nas atuais circustâncias, ressaltaram os especialistas, colocaria em risco a saúde de pelo menos 14,8 milhões de brasileiros. O aval negado vale somente para o atual pedido.

O relator do pedido de importação da vacina Sputnik V na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa),  Alex Campos, fez uma longa fala em que descreveu um a um os países que aprovaram o fármaco, mas que em sua maioria não haviam iniciado aplicações. Em sua fala, a diretora Meiruze Sousa Freitas, afirmou que é “inadmissível” a falta de apresentação de dados à agência brasileira — e que não se trata de um pedido burocrático. A fala faz referência a falta de informações por parte dos desenvolvedores do antígeno, sempre alegado pela agência para a falta de avanço das tratativas para uso da Sputnik V no país. A diretora Cristiane Jourdan Gomes utilizou sua fala para ressaltar que a análise dos documentos obtidos não encontrou dados mínimos que aplaquem todas as inconsistências levantadas pelos técnicos da agência. Romison Mota, outro diretor, afirmou que “a empresa não conseguiu demonstrar que o processo em escala comercial (…) é representativo da escala piloto utilizado em estudos clínicos”. Por fim, o diretor-presidente Antonio Barra Torres disse que o andamento da reunião cumpriu a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal  (STF), Ricardo Lewandowski, de que as decisões da Anvisa não fossem baseadas somente na ausência de documentos. Além disso, ele afirmou que diante das atuais circunstâncias “é impossível endossar a alegada eficácia e o perfil de segurança da vacina”.

Análises técnicas

A gerência-geral de medicamentos e produtos biológicos foi a primeira a não recomendar a importação. Gustavo Mendes, gerente-geral do setor na agência, afirmou que — entre as deficiências detectadas nos relatórios disponibilizados— há uma inconformidade na composição da vacina. Há a presença de um adenovírus com capacidade de replicação — o oposto do que se espera em uma vacina do tipo. “Essa especificação não foi justificada”, disse o gerente. Mendes afirmou que a presença desse adenovírus replicante pode causar problemas de segurança, causar infecções, até prejuízos de segurança a quem foi vacinado. Essa variação foi detectada em todos os lotes avaliados pela Anvisa.

A condução dos estudos também foi criticada pela falta de informações relacionadas. Houve, por exemplo, quatro mortes ao longo do estudos, alegadas como não relacionadas às vacinas, mas com informações limitadas sobre a não relação entre as aplicações e os óbitos. Os relatórios também não demonstraram avaliação padronizada dos participantes, sem definição do período aceitável para coleta de amostras do exames diagnósticos a partir do início dos sintomas. “Não se pode excluir a possibilidade de terem ocorrido casos que foram considerados negativos durante o estudo quando, na verdade, poderiam estar positivos para Covid-19”, está incluso na apresentação da gerência de medicamentos.

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Além disso, a agência ressaltou que não houve determinação detalhada do perfil de segurança, como impacto do uso por diferentes faixas etárias, por comorbidades e para pessoas com positividade para Covid-19. Também houve incertezas sobre o controle de qualidade da vacina. Portanto, não seria possível garantir que a vacina testada tem as mesmas propriedades das que seriam enviadas ao Brasil diante dos pedidos dos estados.

Em relação à inspeção e fiscalização sanitária, área em que a importação também não foi recomendada, a gerente-geral de inspeção e fiscalização sanitária, Ana Carolina Marino Araujo, afirmou que houve impedimento para que os técnicos acessassem as dependências do Instituto Gamaleya, em Moscou, a capital russa — onde há parte da finalização da vacina. Para remediar a questão, foi realizada somente uma análise documental.  Foi possível apenas visitar duas outras plantas de fabricação, também na Rússia. Antes da viagem dos técnicos, foi proposto o cancelamento da inspeção presencial, transformando a inspeção em virtual — o que a Anvisa recusou. Com o que foi possível analisar, a pasta afirmou que há riscos detectados na produção do insumo, do produto finalizado em frasco de cinco doses ou ampola de fase única.

A gerência-geral de monitoramento de produtos sujeitos à vigilância sanitária também foi contrária a importação do medicamento. A gerente Suzie Marie Gomes pontuou que, apesar de ser aprovada em cinco dezenas de países, segundo ela, o imunizante é efetivamente usado em somente catorze desses. O único país que ofereceu informações ao Brasil foi a Argentina, que detectou no uso do imunizante o maior número de eventos adversos pós-aplicação, em comparação com os outros lá utilizados.  Ainda que o número não seja determinante, foi apresentado pela agência.  Suzie afirmou que, com as deficiências já detectadas, a aprovação do imunizante colocaria um número de 14,8 milhões de brasileiros sob risco.

Decisão

A decisão ocorre próxima ao fim do prazo de 30 dias estipulado pelo ministro Ricardo Lewandowski,  do Supremo Tribunal Federal (STF), para que a agência dê um parecer em relação à importação — e, por consequência, uso, da vacina Sputnik V. Caso a Anvisa não se pronunciasse dentro desse período iniciado em 29 de março, os estados poderiam importar e aplicar os medicamentos.

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Ainda hoje, Lewandowski recusou um pedido da agência de ampliação de prazo para analisar os documentos — parte deles ainda faltantes. Na decisão, o ministro afirmou que cabe à Anvisa não autorizar o pedido de importação ou uso emergencial da vacina, mas que tal decisão deveria ser estar embasada tecnicamente, “não se admitindo a mera alegação de insuficiência da documentação ou a simples alusão a potenciais riscos”, escreveu o ministro.

A decisão, afirmou a Anvisa em nota, está ancorada na lei n º 14.124, publicada no dia 10/03, determinou que os entes que solicitarem autorização para uso emergencial e temporário de vacinas contra a Covid-19 devem apresentar uma série de informações à Anvisa. Entre as exigências consta o relatório técnico da avaliação da vacina emitido por determinadas autoridades sanitárias internacionais capaz de comprovar que a vacina atende a padrões de qualidade, de eficácia e de segurança pré-estabelecidos. Na ausência do relatório técnico, o prazo de decisão da Anvisa será de até 30 dias.

Até o momento catorze estados enviaram pedidos de importação da vacina Sputnik para a Anvisa: Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rondônia, Sergipe e Tocantins, além dos municípios fluminenses de Maricá e Niterói. As analises realizadas hoje ocorreram antes por conta da decisão do STF.

Confira o avanço da vacinação no Brasil:

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