“O afeto é revolucionário”. “O amor cura”. Essas frases presentes no dia a dia em grafites e diálogos reforçam o conceito universal de que o amor tem efeitos benéficos. Isso é comprovado pela ciência, que tem explorado os impactos do sentimento principalmente para o coração, seu órgão símbolo. Estudos costumavam ter como foco os relacionamentos amorosos, mas, neste ano, a Associação Americana do Coração (AHA, na sigla em inglês) voltou no tempo e analisou a primeira referência de amor que temos na vida: o recebido em casa pelos familiares. A conclusão foi de que o afeto tem importante papel na prevenção de problemas cardiometabólicos na vida adulta, como doenças cardiovasculares e diabetes.
Os pesquisadores analisaram 3.478 voluntários na faixa dos 16 anos por mais de duas décadas, entre 1994 e 2018, para verificar os impactos de cinco ativos psicológicos: sentimento de ser amado, pertencimento, felicidade, autoestima e otimismo. Com essas respostas, o grupo cruzou os dados com medidas de saúde que são fatores de risco para doenças cardiovasculares e metabólicas, como colesterol, pressão arterial e o índice de massa corporal (IMC) quando os participantes estavam na faixa etária de 20 a 30 anos.
Segundo o levantamento, adolescentes com quatro a cinco ativos positivos de saúde mental tiveram 69% mais chances de manter a saúde cardiometabólica positiva quando adultos jovens.
“Por muito tempo, pensamos que dieta e exercícios eram as chaves para manter a saúde do coração, mas nosso estudo sugere que a saúde mental pode ser tão importante quanto, especialmente entre os jovens”, explica a VEJA Farah Qureshi, uma das autoras do estudo e professora assistente na Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health. “Reservar um tempo do dia para lembrar nossos filhos de que os amamos e cuidamos deles pode ajudar bastante para que eles mantenham o bem-estar emocional”, completa.
Segundo ela, a sensação de se sentir amado e demais ativos para o bem-estar mental são importantes para a saúde cardiovascular não só por proteger as pessoas contra os efeitos nocivos do estresse – um importante fator de risco para várias doenças -, mas por ajudá-las a manter comportamentos saudáveis, como praticar atividades físicas, e evitar hábitos prejudiciais, como fumar e se alimentar mal.
Estudos nessa linha, que avaliam fatores que vão além da alimentação e hábitos, devem se tornar uma tendência, de acordo com o médico cardiologista Álvaro Avezum, diretor do Centro Internacional de Pesquisa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. “Cada vez mais, a ciência compreende o papel do amor e também da espiritualidade para a saúde do coração. Quando falo de espiritualidade, não falo de religião. São os propósitos de vida, relacionamento com familiares e amigos, capacidade de perdoar.”
E achados como esses podem nortear, no futuro, programas de promoção à saúde na adolescência e atuar na esfera dos riscos modificáveis, como já é feito com consumo de álcool, tabagismo e sedentarismo. Com o amor dos pais ou cuidadores, essa ferramenta tão poderosa, é possível imaginar um mundo com jovens mais felizes e adultos mais saudáveis.
Entenda o estudo
Pontos analisados
- Otimismo
- Felicidade
- Autoestima
- Pertencimento
- Sentimento de ser amado
Biomarcadores medidos na fase adulta
- Pressão arterial
- Proteína C reativa (que mede inflamação)
- Colesterol
Resultados do estudo
55%
tinham nenhum ou apenas um dos ativos psicológicos
29%
tinham três a quatro ativos
16%
demonstraram quatro ou cinco ativos
12%
percentual de participantes que mantiveram a saúde cardiometabólica até o fim da fase adulta
69%
foi o índice de chances a mais de manter saúde cardiometabólica entre jovens com quatro a cinco ativos
18%
percentual maior de chance de preservar a saúde cardiometabólica em jovens com dois a três ativos