O super-herói do presidente: um dia ao lado de Roberto Kalil Filho
VEJA acompanhou o cardiologista que cuida da saúde de Lula e presenciou ação de Natal dele como Batman presenteando pacientes pediátricos do InCor
Já passavam das 9h30 de uma das quartas-feiras mais agitadas da República. Na véspera, dia 10, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinha sido submetido a uma cirurgia de emergência durante a madrugada para drenagem de um hematoma intracraniano e sua saúde era a principal notícia do dia.
Em meio à missão de orientar a equipe médica e acompanhar outros pacientes, o cardiologista Roberto Kalil Filho tinha em sua agenda presentear pacientes da ala pediátrica do InCor, o Instituto do Coração, em uma ação de Natal.
Na festividade, surgiu com o traje completo de seu super-herói favorito desde a infância, o Batman, um respiro lúdico dentro de uma rotina quase sem pausas. A reportagem de VEJA acompanhou parte do dia do “médico dos presidentes”, aquele que acompanha Lula há 33 anos e cuidou de quase todos os mandatários desde a redemocratização do país.
Havia uma grande expectativa pela chegada do Batman. Crianças e profissionais do InCor estavam reunidos no Espaço Marisa Monte, área na Pediatria do hospital, localizado na capital paulista, preparados para posar ao lado do super-herói.
Presidente do conselho diretor do instituto, Kalil Filho chegou ao lado do Papai Noel e de um duende encarnando o personagem diante de 30 crianças que tratam doenças cardíacas e pulmonares no local.
Diante dos olhinhos brilhantes dos pequenos pacientes, mantinha o porte altivo do “Cavaleiro das Trevas”, mas também demonstrava carinho a cada pedido de foto, abraço ou mesmo para passar alguns minutos de mãos dadas. E também sorria. Batman nenhum resistiria àquelas carinhas de encantamento e felicidade.
Foram 30 minutos de interação com os pequenos e seus acompanhantes, médicos, enfermeiros e demais profissionais da unidade. O tempo foi suficiente para levar alegria e viver o personagem adotado há mais de dez anos durante as festividades de fim de ano.
Não é a única fantasia. Na Páscoa, o médico se veste de coelho para divertir os pacientes. Como hobby, é saxofonista da banda InCordes, formada por profissionais da unidade, que é o maior hospital cardiológico público do Brasil.
“As crianças e a música ajudam a trazer serenidade. É preciso ser sereno ao trabalhar como médico”, afirma.
Encerrada a atividade, ele rapidamente se trocou e apareceu com a tradicional roupa branca para se dirigir ao Hospital Sírio-Libanês, onde Lula está internado. Na rua, a caminho do carro, retornou e atendeu ligações, andando com o que o cantor Chico Buarque, lá nos anos 1990, definiu tão bem como “sotaque paulista nos pés”. Dr. Kalil anda rápido demais e, se o passo de quem o acompanha se distrair um instante, o médico já estará longe.
O tempo também corre e, na porta do Sírio, o cardiologista passa para ver o paciente ilustre e também os anônimos, que recebem o mesmo nível de atenção. Diante do aglomerado de jornalistas, ele faz uma pausa e, sim, fala com a imprensa. Kalil tem experiência com as perguntas em série sobre diagnósticos e boletins médicos de chefes de Estado, afinal, acompanhou Michel Temer, Dilma Rousseff, Fernando Collor, José Sarney e Lula.
São décadas à frente de decisões e quadros complexos, no entanto, uma máxima do médico é tratar sempre a pessoa, não o cargo. O cargo, segundo ele, fica sempre do lado de fora do consultório. A transparência diante de momentos complicados é defendida por ele e ainda um pedido do petista.
Conhecido por ser firme e decidido, é ainda incansável. Mesmo quando faz uma pausa para o lanche, avalia resultado de exames e não deixa os pacientes sem respostas. Ao caminhar pelos corredores, não passa despercebido. Cumprimenta e brinca com os funcionários, acena para as pessoas. Sempre apressado, nunca desatento.
“Além de ser competente, é um ser humano protegido. Veja o que ele faz”, exclama o infectologista David Uip, amigo de longa data após um forte abraço e alguns minutos de conversa.
‘Um caso difícil, mas bem sucedido’
Kalil já tinha visitado Lula, que estava bem e se alimentando. A nova intervenção, a embolização da artéria meníngea média realizada com sucesso nesta quinta-feira, 12, ainda não tinha sido anunciada.
Naquele momento, os holofotes estavam voltados para a trepanação, a pequena perfuração no crânio para drenar o sangramento.
À VEJA, o cardiologista relatou a decisão unânime da equipe médica de transportar o presidente de Brasília para São Paulo na noite de terça e como se sentiu enquanto aguardava a chegada do voo.
“Demorou uma hora e meia até eu encontrá-lo no aeroporto. Sem dúvida, esse tempo de espera foi um dos mais angustiantes da minha vida. Um caso difícil, mas bem-sucedido.”
A despedida ocorre de maneira breve, com sorriso e o olhar profundo que os médicos que inspiram confiança costumam ter. Kalil cumprimenta e, assim como o Batman que interpreta, não nega um abraço. O super-herói do presidente segue com seu passo apressado até desaparecer no corredor.