Nesta sexta-feira, 22, a Princesa de Gales, Kate Middleton, revelou estar com um câncer, descoberto logo após a cirurgia abdominal que fez em janeiro. Sem muitos detalhes sobre o tipo de tumor ou onde ele está localizado, ela apenas diz estar “em estágio inicial de tratamento, fazendo uma quimioterapia preventiva” em vídeo divulgado pelo Palácio de Kensignton, nas redes sociais oficiais dela e do Príncipe William.
“Em janeiro, eu passei por uma grande cirurgia abdominal e, na ocasião, pensou-se que minha condição não era de câncer. A cirurgia foi bem-sucedida, no entanto, exames após a operação notaram que havia câncer. Minha equipe médica aconselhou a me submeter a uma quimioterapia preventiva, e agora estou nos estágios iniciais desse tratamento.”
No entanto, esse tipo de terapia preventiva, segundo especialistas, não existe. O que a Princesa de Gales quis dizer, é que está fazendo uma quimioterapia adjuvante. “Quimioterapia não previne câncer, ela trata câncer, ainda que seja em estágio inicial”, afirma Rachel Riechelmann, head de oncologia clínica do A.C. Camargo Cancer Center. Segundo ela, a quimioterapia adjuvante é aplicada nesses casos de tumores localizados, descobertos em cirurgias, desde que não haja metástase. “Nesse contexto, o tumor pode liberar células malignas para outros órgãos através da corrente sanguínea, chamadas de micrometástases. A quimioterapia adjuvante mata essas células que não são detectadas por exames de imagem e de sangue, erradicando esse problema, aumentando a chance de cura e diminuindo a possibilidade de recidiva do câncer”, diz a médica, sobre esse tipo de tratamento, que pode ser indicado para vários tipos de câncer, entre eles, colorretal, de ovário, de mama, de pulmão, de bexiga, de estômago e de pâncreas.
Sobre o caso de Kate, como a cirurgia foi abdominal, pode se tratar de cancros em vários órgãos distintos. E para cada órgão, existe um tratamento mais adequado, mas a maioria deles envolve cirurgia para a retirada do tumor. “Nas mulheres, principalmente nessa faixa etária, o tipo de câncer mais comum abdominal é o colorretal ou câncer do intestino, que se trata com cirurgia e pela quimioterapia adjuvante, no intuito de diminuir as chances de o tumor voltar no futuro, caso já tenha afetado outros órgãos ou linfonodos”, explica Murillo Lobo, médico cirurgião do aparelho digestivo da Clínica Sartor e médico da Universidade de São Paulo (USP).
Princesa Jovem
Além da Princesa de Gales, o Rei Charles III também trata um câncer não revelado. No caso dela, porém, chama a atenção o fato de ser muito jovem, ter apenas 42 anos. “Isso foi um grande choque. Eu e o (príncipe) William estamos fazendo tudo que podemos para gerenciar isso de forma privada pelo bem da nossa família”, disse.
Mas a idade não é fator decisivo. De acordo com um grande estudo recente realizado por pesquisadores da Universidade de Edimburgo, no Reino Unido, e da Universidade de Zhejiang, na China, o número de casos de câncer entre pessoas com menos de 50 anos aumentou 79% nas últimas três décadas. O trabalho, publicado na revista científica “BMJ Oncology”, em outubro de 2023, analisou dados de 29 tipos de câncer em 204 países e regiões, incluindo o Brasil.
“O aumento de casos de câncer em pacientes mais jovens é uma realidade no dia-a-dia do oncologista e o maior desafio do médico é fazer o diagnóstico em estágios iniciais, pois, com frequência, esses pacientes estão fora da idade de início de rastreio com exames”, comenta Daniel Musse, oncologista clínico da Oncologia D’Or.
Os motivos que levam a esse aumento ainda não são completamente conhecidos e são alvos de pesquisas ao redor do mundo. “O intuito é descobrir qual a participação de fatores externos como alimentação, estilo de vida sedentário, sobrepeso, tabagismo e outros. Há também os testes para saber se esses tumores acontecem por causa de alguma alteração genética na família”, explica o médico, que acrescenta. “Mas, já se sabe que o comportamento desses tumores é diferente. Em geral, são agressivos, como os de intestino e de mama, o que leva a muitos pacientes receberem tratamentos como quimioterapia após cirurgias para evitar o retorno do tumor.”
A boa notícia é que nesses casos, a pessoa tem uma melhor recuperação e maior chance de cura. “Se faz uma cirurgia num paciente jovem, consegue se reabilitar da cirurgia rapidamente e logo entrar num esquema de quimioterapia adequado, com as medicações mais potentes para o tratamento desse tumor. Assim, temos uma possibilidade de remissão muito maior”, completa Lobo.
Informação é Essencial
Outra questão essencial sobre o câncer, apontada por especialistas, é desmistificar a doença e não apontá-la como uma sentença de morte, especialmente quando vem à tona por meio de uma figura mundialmente conhecida como a princesa Kate Middleton, futura Rainha da Inglaterra.
“É muito importante termos a consciência de que, mesmo com tantos avanços e casos de cura, ainda temos o desafio de desmistificar o diagnóstico de câncer e o tratamento dessa doença. Temos a obrigação de informar corretamente e preservar a individualidade dos pacientes, sejam pessoas públicas ou indivíduos comuns”, alerta Mariana Laloni, oncologista e diretora médica da Oncoclínicas. “Médicos, profissionais de saúde, jornalistas e pacientes devem entender que informar com precisão é uma prestação de serviço e significa cuidado.”
Segundo a médica, no caso dos pacientes, sejam eles, figuras públicas ou não, que recebem um diagnóstico de qualquer doença, devem ter o direito à sua privacidade e ao seu tempo. Algo que a própria Kate chamou a atenção em seu comunicado. “Eu precisei de tempo para me recuperar da minha cirurgia e começar meu tratamento, mas, ainda mais importante, levou tempo para explicarmos para George, Charlotte e Louis (os filhos dela), de uma forma apropriada para eles, e garantir a eles que eu vou estar bem”, disse a Princesa de Gales.
É preciso lembrar também que existe um arsenal de estratégias médicas possíveis, a maioria delas muito avançadas e com altas taxas de cura: cirurgia, quimioterapia, radioterapia, imunoterapia e terapias alvo, alguns dos pilares de tratamento, que mudaram o panorama de uma doença que, no passado, já foi tão temida. “Por muito tempo isso ocorreu por desconhecimento de que o câncer não é uma doença única e por ausência de recurso terapêutico. Situações assim, onde todo o contexto não é conhecido e especulações surgem, infelizmente, contribuem para gerar mais desinformação e tabus”, reflete a oncologista. “Isso expōe pessoas públicas e demais pacientes, que acabam passando por um sofrimento desnecessário. E em nada contribui para a informação adequada e correta que pode salvar vidas“, finaliza a diretora médica da Oncoclínicas.
Veja o vídeo de Kate Middleton: