Jogadores profissionais de futebol masculino têm 1,5 vezes mais chances de desenvolver Alzheimer e outras doenças neurodegenerativas do que o resto da população, de acordo com um estudo observacional publicado nesta sexta-feira, 17, na revista The Lancet Public Health. A pesquisa também concluiu que não houve relação para doença do neurônio motor – incluindo Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) – e risco menor para desenvolver doença de Parkinson.
Os dados foram baseados em mais de 6 mil atletas, que jogaram na primeira divisão sueca entre 1924 e 2019. Entre eles, 9% foram diagnosticados com doenças neurodegenerativas em comparação com 6% do grupo de controle populacional.
A suspeita pelo aumento de casos é clara: impactos leves na cabeça sofridos ao cabecear a bola. Inclusive, isso é sustentado pelo trabalho, pois, ao contrário dos jogadores de linha, os goleiros não tiveram um risco aumentado de demência.
Nos últimos anos, tem havido preocupações crescentes sobre a exposição ao traumatismo craniano no futebol e se isso pode levar ao aumento do risco de doença neurodegenerativa ao envelhecer. Um estudo anterior da Escócia sugeriu que os jogadores de futebol tinham 3,5 vezes mais chances de desenvolver doenças neurodegenerativas. “Como há apelos crescentes dentro do esporte para maiores medidas para proteger a saúde do cérebro, nosso estudo aumenta a base de evidências e pode ser usado para orientar as decisões sobre como gerenciar esses riscos”, relata Peter Ueda, professor-assistente do Karolinska Institutet, na Suécia.
Um caso emblemático de como as cabeçadas se tornaram uma das maiores preocupações do futebol é do zagueiro Hideraldo Luís Bellini, que ficou famoso tanto por levantar pela primeira vez a taça da Copa do Mundo para a Seleção Brasileira, em 1958, quanto por ter seu cérebro doado para estudos científicos, logo após a morte dele. No final da vida, Bellini havia desenvolvido sintomas típicos de demência, como esquecimentos frequentes e dificuldades de raciocínio, e a análise do órgão mostrou que, na verdade, ele foi acometido pela encefalopatia traumática crônica. Essa condição afeta pessoas que sofreram pancadas repetidas na cabeça ao longo da vida — como é o caso de boxeadores -.
Ao lado de outros ex-esportistas, a história do capitão do primeiro título mundial brasileiro jogou luz no impacto que os esportes de contato podem ter na saúde do cérebro.
Mudanças sugeridas
Seguindo evidências sobre o tema, certas organizações de futebol implementaram medidas para reduzir o cabeceio. Uma das primeiras foi o Conselho da Associação Internacional do Futebol (Ifab, na sigla em inglês), que passou a recomendar que as cabeçadas intencionais na bola devem ser proibidas nas partidas que envolvam crianças com menos de 12 anos. Nessa faixa etária, as jogadas aéreas serão paralisadas pelo juiz, que marcará uma falta para o time adversário.
Já entre os adultos profissionais, a tendência é que as coisas mudem aos poucos também. Um dos primeiros países a adotar medidas nesse sentido foi a Escócia, cuja associação de futebol proibiu treinos com cabeçadas um dia antes e um dia depois das partidas oficiais. A entidade também recomendou que os clubes limitem exercícios que envolvam cabeçadas repetidas a uma única sessão por semana.