O negacionismo das vacinas é hoje um problema sério no Brasil. Principalmente após a pandemia da Covid-19 e a disseminação de fake news promovida especialmente pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro contra os imunizantes, as taxas de cobertura vacinal caíram vertiginosamente no país, com pais receosos em vacinar seus filhos pelos supostos efeitos colaterais, deixando assim crianças vulneráveis ao reaparecimento de doenças já erradicadas como a poliomielite e o sarampo.
O fenômeno é conhecido como hesitação vacinal. “Os pediatras nunca imaginaram que teriam que discutir com famílias sobre o porquê vacinar seus filhos. Era algo impensável há um tempo atrás”, diz Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SPB). “Mas agora, a verdade é que eles precisam ser acolhidos já que esses pais não querem o mal de seus filhos, só estão inseguros em vaciná-los.”
Exatamente para combater essas falsas notícias e ajudar os pediatras a mostrarem para essas famílias a importância da vacinação, a SBP, o Instituto Questão de Ciência (IQC) e o Instituto Cultural Mauricio de Sousa roteirizaram e produziram um gibi da Turma da Mônica chamado “Fake News da Vacinação”, que será lançado nesta quinta-feira 9, no 22º Congresso Brasileiro de Infectologia Pediátrica, em Curitiba (PR). “Esperamos, com essa e outras iniciativas, contribuir para que a ciência esteja sempre bem representada no debate público”, ressalta. Natalia Pasternak, presidente do IQC e professora de Comunicação de Ciência na Universidade de Columbia.
Informação de forma lúdica
O gibi, que terá versão digital nos sites do IQC e da SBP, explica em 20 páginas, a origem das fake news das vacinas, como elas se espalham e as suas graves consequências, como o risco de reaparecimento dessas doenças extintas por meio de passatempos e um roteiro que insere o tema da hesitação vacinal em uma história em quadrinhos com os personagens Cebolinha, Fernando e Luca, destacando o papel do pediatra no esclarecimento do funcionamento das vacinas e da sua importância para prevenir doenças.
“A desinformação não é uma mentira ‘inocente’, mas pode ser combatida por diferentes iniciativas e linguagens baseadas na ciência, a exemplo desse gibi, que alerta para as consequências terríveis das fake news”, afirma Luiz Almeida, doutor em microbiologia e diretor de Educação do IQC.
No gibi, os pais de Fernando decidem não vacinar o filho por terem visto na internet que era perigoso e poderia fazer mal a ele. Mas, ao sair para uma partida de basquete com Cebolinha, Fernando conhece Luca, personagem cadeirante que conta como seus pais, ao darem ouvidos a “boatos sobre as vacinas”, não o vacinaram e o deixaram vulnerável à poliomielite, doença conhecida como paralisia infantil, que erradicada há quase 35 anos no Brasil, tem preocupado os médicos pela queda na cobertura vacinal.
“Vacinar não é uma simples questão de opção individual. É um compromisso cívico coletivo. Quando a gente vacina nossos filhos, estamos protegendo não somente a eles, mas também diminuindo as chances de transmissão de doenças para toda a comunidade em volta. Entender e espalhar essa mensagem é uma missão de todos nós”, diz Clóvis Francisco Constantino, presidente da SBP.
Fenômeno que preocupa
Recentemente, as instituições apresentaram um estudo com 1.000 pediatras brasileiros para compreender a visão dos médicos a respeito da vacinação e das fake news. Segundo a pesquisa, o medo de possíveis eventos adversos (com 19,76%) aliado à falta da confiança nas vacinas (19,27%) são os principais motivos que levam pais e responsáveis a negligenciar a vacinação de crianças e adolescentes.
“Não vacinar é um ato grave, pois coloca crianças e adolescentes sob risco desnecessário. Está mais que comprovado que as vacinas são seguras e eficazes para evitar doenças. Ao longo da história, milhares de vidas foram salvas por conta da imunização em massa da população brasileira”, afirma Kfouri.