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Cientistas brasileiros detectam vírus da Covid pela lágrima

Pesquisa da USP indica que o teste é uma alternativa ao swab nasal e oral e tem riscos menores já que a transmissão do vírus é mais difícil

Por Luciana Constantino | Agência FAPESP
Atualizado em 4 jun 2024, 10h59 - Publicado em 23 jan 2023, 11h47
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  • Pesquisa liderada por cientistas da Universidade de São Paulo (USP) concluiu que o vírus da Covid-19 pode ser detectado em lágrimas por meio de testes com swab, haste flexível com algodão na ponta usada na coleta de material para exames.

    Ao analisar amostras de pacientes internados no Hospital das Clínicas de Bauru (SP) com diagnóstico da doença confirmado por métodos convencionais, os pesquisadores detectaram o SARS-CoV-2 na superfície ocular utilizando esse tipo de teste em 18,2% dos casos. O resultado indica uma alternativa ao swab nasal e oral, que causa desconforto no nariz e na garganta, e sinaliza a necessidade de medidas de proteção para os profissionais de saúde já que, apesar de baixo, há risco de transmissão do vírus pela lágrima.

    Além disso, a combinação de dois fatores – mais comorbidades e maior taxa de mortalidade – entre pacientes com teste positivo na lágrima sugere que a detecção viral pode auxiliar no prognóstico da doença.

    Os resultados foram publicados em artigo no Journal of Clinical Medicine.

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    “No início da pesquisa, pensamos em buscar um método de diagnóstico fácil, com a coleta de material sem tanto incômodo para os pacientes. O swab nasal, além de provocar desconforto, nem sempre é usado da maneira correta. Para pessoas com desvio de septo nasal, por exemplo, pode ser um problema. Achávamos que a lágrima seria mais fácil de executar, mais tolerável. Conseguimos mostrar que é um caminho. Uma limitação nesse estudo é que não sabemos se a quantidade de lágrima coletada influencia na positividade ou não”, afirma o autor correspondente do artigo, o professor Luiz Fernando Manzoni Lourençone, da Faculdade de Odontologia de Bauru e do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais, ambos da USP.

    Segundo o pesquisador, é possível inferir que a probabilidade de detectar o vírus em amostras lacrimais é maior em pacientes com carga viral alta, que pode levar a um quadro de viremia disseminada por diversos fluidos corporais.

    O trabalho recebeu apoio da FAPESP por meio de Bolsa de Iniciação Científica concedida a Luís Expedito Sabage, aluno de graduação, orientando de Lourençone.

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    Técnica

    De 61 pacientes internados, foram analisadas amostras de 33 deles com diagnóstico de Covid-19 e de outros 14 sem o vírus, obtidas durante o primeiro semestre de 2021, quando as principais variantes que circulavam no Estado de São Paulo eram a gama e a delta.

    Os cientistas utilizaram duas formas para coletar as lágrimas – o swab conjuntival e as tiras de Schirmer (exame para avaliar se o olho produz quantidade suficiente de lágrimas). As avaliações foram realizadas entre julho e novembro do mesmo ano.

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    Do total, o SARS-CoV-2 foi detectado em 18,2% das amostras coletadas por swab e em 12,1% das obtidas por meio de tiras de Schirmer. Por outro lado, como esperado, nenhum dos pacientes negativos para COVID-19 em exames feitos com swab nasofaríngeo teve amostra de lágrima positiva.

    Para avaliar as comorbidades, o grupo adotou o Índice de Comorbidade de Charlson (ICC), composto por 20 fatores e desenvolvido como forma de padronizar e ajustar indicadores de risco, discriminando o prognóstico de um paciente em termos da mortalidade no período de até um ano.

    Segundo a pesquisa, os indivíduos cujas lágrimas testaram positivo para o SARS-CoV-2 tiveram ICC inferior em relação ao restante (apontando maior probabilidade de óbito em dez anos) e taxas de mortalidade mais altas.

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    Independentemente do diagnóstico de Covid-19, a maioria dos indivíduos apresentou baixa produção lacrimal e desconforto ocular, indicando a necessidade do uso de lágrima artificial durante a internação.

    Além de dados demográficos, clínicos e de sintomas oculares, os cientistas trabalharam com análises de RT-qPCR (sigla em inglês para Reação em Cadeia de Polimerase de Transcrição Reversa). O método requer a extração do material genético; um processo de transcrição do RNA em DNA e, por fim, a multiplicação do DNA. Considerado padrão-ouro para diagnóstico da Covid-19 e amplamente usado em vários laboratórios pelo mundo, o exame é capaz de detectar a presença de até mesmo uma única cópia do material genético do vírus na amostra.

    Ao contrário de estudos anteriores, em que genes virais (N e RdRp) não foram considerados nas análises de RT-qPCR, nesse caso a pesquisa identificou diferentes partes do vírus, resultando em uma melhor taxa de detecção.

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    Em julho de 2021, foi publicado o resultado do trabalho de um grupo da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (FCM-Unicamp) que acompanhou 83 pacientes internados no Hospital de Clínicas da cidade, dos quais 8,43% tiveram amostras de lágrimas ou da superfície ocular positiva para a doença.

    “Quando começamos, no início de 2021, não tínhamos tecnologia para fazer o cruzamento de alguns tipos de dados, saindo da ciência básica para a prática clínica. Nesse intervalo, o Sabage fez um estágio no Byers Eye Institute, do Departamento de Oftalmologia da Universidade Stanford [Estados Unidos], uma referência em estudos de fluidos oculares complexos. Com a tecnologia de lá, foi possível fazer vários pareamentos e constatar a presença de SARS-CoV-2 em lágrimas das nossas amostras. A associação com outra equipe trouxe resultados para nosso campus e abriu uma nova linha de pesquisa”, completa Lourençone à Agência FAPESP.

    O estágio em Stanford recebeu apoio da FAPESP.

    Possibilidades

    Agora, o grupo de pesquisadores iniciou uma nova linha com foco na detecção de doenças por meio de testes e exames ligados aos olhos. O objetivo é trabalhar com outros tipos de vírus, além do SARS-CoV-2.

    “Existem outros vírus ainda pouco estudados no Brasil. Pretendemos nos dedicar a encontrar soluções e melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Vamos analisar também outras condições virais que se tornam sistêmicas”, diz o professor.

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