Há exatos quatro anos, o mundo acordou sobressaltado com a notícia de novos e sucessivos casos de pessoas infectadas por um patógeno respiratório na cidade de Wuhan, na China. Ao alerta global deu-se o espanto emoldurado pelo pavor. A edição de VEJA com data de capa de 5 de fevereiro de 2020 estampava a chamada incômoda, mas necessária: “O vírus do medo”. O primeiro diagnóstico no Brasil seria registrado na Quarta-Feira de Cinzas de um Carnaval estranho. De lá para cá, em todo o planeta, ocorreram 7 milhões de mortes — das quais, 710 000 no Brasil. As cenas dramáticas das covas em Manaus, em maio daquele ano, viraram marco de um tempo de dor e descaso, alimentado pela irresponsabilidade do governo do presidente Jair Bolsonaro, que se referia à pandemia como uma “gripezinha”. Não foi, evidentemente.
A tragédia, aliás, só não foi maior porque houve rápida reação da ciência, com a orientação de quarentena e isolamento, nos primeiros tempos, e depois graças ao desenvolvimento de vacinas — sem as quais a emergência não seria suspendida pela Organização Mundial da Saúde, a OMS, em maio de 2023. A humanidade — forçada a viver de modo diferente, com o trabalho remoto, o uso de máscaras e cuidados como a limpeza por meio de álcool em gel, além de outras reviravoltas do cotidiano — transformou-se, compreendendo na marra a relevância do que ensinam séculos de pesquisa sobre o funcionamento do metabolismo humano. Mitos, teorias conspiratórias, cloroquinas e outras crendices estúpidas foram derrotados pelo conhecimento.
Lamentavelmente, vale ressaltar, o mal ainda não acabou. Na segunda semana de janeiro foram anotadas 196 mortes no Brasil (a título de exemplo, em um único dia de 2021, o 9 de abril, foram registrados 4 249 mortos). Contudo, parece não haver dúvida: a civilização venceu, ainda que tenha agora de aprender a conviver com o coronavírus de forma definitiva. É o momento no qual estamos — de muitas certezas, alguns pontos de atenção e a convicção de que o bom senso e a razão devem ser regras inegociáveis. Conseguimos apagar o incêndio, mas ainda existem centelhas e fagulhas espalhadas por aí. Provavelmente, a nossa relação com a Covid-19 será parecida com a convivência com outras doenças respiratórias, como mostra a reportagem do editor Diogo Sponchiato nesta edição. Uma enfermidade potencialmente grave para alguns grupos e que será controlada com vacinas atualizadas de tempos em tempos. Vigilância e imunização — eis as palavras-chave. Assim como alguns hábitos e costumes adquiridos durante os piores momentos da pandemia, elas vieram para ficar.
Publicado em VEJA de 2 de fevereiro de 2024, edição nº 2878