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Acupuntura auricular pode diminuir sintomas da depressão, diz estudo

Pesquisadores da USP afirmam que a terapia é segura e reforçam o potencial como tratamento complementar da doença

Por Julia Moióli | Agência FAPESP
Atualizado em 7 Maio 2024, 16h56 - Publicado em 27 fev 2024, 14h15
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  • A acupuntura auricular, recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e já oferecida como prática integrativa pelo Sistema Único de Saúde (SUS) desde 2006, é segura em pacientes com depressão e foi capaz de reduzir sintomas da doença em um estudo feito por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul). Os resultados do trabalho foram publicados recentemente no periódico JAMA Network Open e reforçam o potencial da terapia como tratamento complementar de um problema que motiva cada vez mais atendimentos na rede pública, de acordo com dados do Ministério da Saúde.

    A depressão é uma das principais causas de incapacidade em todo o mundo, segundo a OMS. No Brasil, a prevalência ao longo da vida está entre as mais altas: em torno de 15,5%. É responsável ainda por 10,3% dos anos de vida perdidos (conceito utilizado para quantificar o número de anos de vida que uma população deixa de viver em caso de morte prematura).

    No entanto, menos da metade das pessoas afetadas no mundo recebe o tratamento considerado adequado, com psicoterapia e medicamentos – em alguns países, esse número é de menos de 10% –, por conta de entraves como alto custo e efeitos colaterais (por exemplo, desconforto gástrico e alteração na libido decorrentes do uso de fármacos). Esse cenário aumenta o interesse por opções mais em conta e não farmacológicas – nos Estados Unidos, um terço da população é adepta dessas alternativas.

    É o caso da acupuntura auricular, técnica milenar chinesa que utiliza agulhas de preço acessível – para ter uma ideia, a cartela com 50 unidades, número suficiente para dez sessões, custa menos de R$ 10 – para estimular nervos do pavilhão auricular, principalmente o vago, e ativar áreas do cérebro ligadas à depressão. Simples e rápida (dura de cinco a 15 minutos), também não requer longos treinamentos por parte dos profissionais de saúde (enfermeiro, médico, acupunturista, fisioterapeuta, naturólogo) que a realizam, ao contrário da acupuntura tradicional. No entanto, sua eficácia e segurança para tratar o transtorno psiquiátrico específico ainda não estão completamente estabelecidas.

    Foram evidências desse tipo que os pesquisadores buscaram no estudo financiado pela FAPESP, que acompanhou, entre março e julho de 2023, 74 pacientes com depressão moderada ou moderadamente grave (de acordo com pontuação no Patient Health Questionnaire-9, um questionário usado no diagnóstico, e sem aplicação prévia de acupuntura auricular ou risco de ideação suicida) submetidos a 12 sessões de 15 minutos cada durante seis semanas.

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    Os participantes, que tinham idade média de 29 anos e eram, em sua maioria, mulheres, foram divididos em dois grupos de 37 pessoas cada: enquanto o primeiro passou por acupuntura auricular específica, estimulando seis pontos no pavilhão auricular correspondentes ao diagnóstico de depressão pela medicina tradicional chinesa (Shenmen, subcórtex, coração, pulmão, fígado e rim), o segundo recebeu aplicações em áreas não associadas a sintomas de saúde mental – orelha externa, bochecha, face e quatro pontos da hélice (porção superior da orelha externa). Por questões éticas, todos os pacientes continuaram com seus tratamentos habituais. A eficácia e a segurança da terapia foram avaliadas em quatro semanas, seis semanas e três meses.

    Ao final do acompanhamento, 58% dos pacientes do primeiro grupo apresentaram melhora de pelo menos 50% nos sintomas depressivos. Esse número foi de 43% no segundo grupo, o que não indica uma diferença estatisticamente significativa. Apesar disso, o estudo traz achados promissores: após quatro semanas do início das aplicações, mais pacientes tratados com terapia auricular específica tiveram recuperação e remissão da doença e, após três meses, essa proporção foi ainda mais relevante.

    “Nossos resultados mostram que a acupuntura auricular específica para depressão recuperou quase 60% das pessoas, número semelhante à taxa de medicamentos, de acordo com outros estudos publicados sobre o tema”, diz Daniel Maurício de Oliveira Rodrigues, professor de naturologia da Unisul e primeiro autor do estudo. “Além disso, 46% desses participantes relataram não sentir mais sintomas, em contraste com 13% do grupo que passou pela técnica não específica – para efeitos de comparação, essa taxa gira em torno de 35% para fármacos.”

    Outro ponto positivo do tratamento foi a ausência de efeitos adversos severos, sem diferenças significativas entre os grupos. A maioria dos participantes (94% no grupo de acupuntura auricular específica e 91% no grupo da prática genérica) relatou apenas dor leve no local de aplicação da agulha. “Isso evidencia a segurança da intervenção por mais de seis semanas”, afirma Rodrigues.

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    Mais segurança

    “Vivemos uma verdadeira epidemia de transtornos de humor – acredito que nunca estivemos tão ansiosos e deprimidos como neste pós-COVID – e a aceitação do padrão-ouro de tratamento está longe de ser a ideal”, diz Alexandre Faisal Cury, pesquisador do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina (FM-USP). “Na prática clínica, nos deparamos com pacientes com depressão crônica, que tomam remédios há muito tempo, com efeitos colaterais e recaídas, e precisamos de opções complementares que tragam benefícios comprovados.”

    Faisal destaca as três principais repercussões do estudo: para o SUS, trata-se da validação de uma técnica já amplamente utilizada (é a prática integrativa mais realizada no sistema público); para o paciente, uma opção segura a mais no tratamento de saúde mental; e, para o profissional de saúde, a desestigmatização de uma terapia não alopática.

    Mesmo com os resultados animadores, os pesquisadores lembram que, para investigar melhor a eficácia da acupuntura auricular no tratamento da depressão, são necessários estudos mais prolongados e com maior número de participantes, uma das principais limitações do trabalho atual. “Acredito que a participação de mais pessoas traria resultados ainda mais favoráveis à intervenção”, finaliza Faisal.

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