Em 1960, quando Vinicius de Moraes atribuiu a São Paulo a pecha de “túmulo do samba”, não estava dizendo que os paulistanos eram incapazes de composições dignas do ritmo, apenas que não havia bons lugares para apreciá-lo na cidade. Não se pode dizer que, quase sessenta anos depois, a explosão do Carnaval de rua em São Paulo seja suficiente para enterrar a expressão. Até porque samba é o que menos se escuta nos 491 blocos cadastrados para desfilar entre 3 e 18 de fevereiro. Competem frevo, axé, funk e até rock com levada de marchinha. Mas é com esse ecletismo que o Carnaval de rua paulistano caminha para se tornar neste ano o maior do Brasil. Foram quase 4 milhões de foliões só no primeiro fim de semana. Em comparação, no Rio de Janeiro o público do pré-Carnaval foi estimado em 1,7 milhão e, em Salvador, em 1 milhão. No ano passado, os blocos cariocas reuniram 5,9 milhões de pessoas durante todo o período de festa. O Galo da Madrugada, o maior bloco do país, no Recife, espera atrair 2 milhões no sábado 10. O gigantismo do folguedo paulistano, porém, expôs algumas falhas de planejamento da prefeitura e dos organizadores autorizados a faturar com os patrocínios da festa. Houve tumulto com o fechamento de estações de metrô e mortes em uma briga motivada pela falta de banheiros químicos. No bloco Acadêmicos do Baixo Augusta, com 1 milhão de pessoas (acima), um estudante morreu eletrocutado ao encostar em um poste com câmeras de segurança instaladas às pressas. O prefeito João Doria previa que 4 milhões de pessoas tomariam as ruas de São Paulo durante todo o Carnaval. Já está claro que a conta subestimou, e muito, o que estava por vir.
Publicado em VEJA de 14 de fevereiro de 2018, edição nº 2569