A cena é da sexta-feira 19, mas a polêmica que ela suscitou só se desenrolou na semana seguinte. O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral foi fotografado com algemas nas mãos (presas também à cintura) e nos pés enquanto era conduzido por meia dúzia de policiais federais para um exame de corpo de delito no IML de Curitiba. O advogado de Cabral se disse estarrecido e fez ironia declarando que “esqueceram apenas de colocar o capuz e a corda”. O juiz Sergio Moro, do Paraná, e a juíza Caroline Vieira Figueiredo, substituta de Marcelo Bretas, do Rio, que assinaram a transferência de Cabral de seu estado para um presídio paranaense, intimaram os responsáveis pela escolta a explicar o uso de algemas. Em 2008, o STF estabeleceu que esse instrumento de contenção física de detentos só deve ser utilizado “em caso de resistência e de fundado receio de fuga, ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros”. A última hipótese serviu de justificativa para a Polícia Federal: o fácil acesso do público ao IML poderia levar a desentendimentos com Cabral. As algemas serviriam, portanto, para “protegê-lo”. Moro, por sua vez, recomendou que se evite “o uso conjunto de algemas em pés e mãos, salvo casos de maior necessidade”. Sem dúvida, houve exagero na condução de Cabral, que tem quatro condenações em primeira instância por corrupção e foi levado para Curitiba porque no Rio estava se cercando de regalias na prisão. Ainda mais lamentável é saber que, quando meros suspeitos menos abastados e influentes recebem tratamento similar ou pior, ninguém se comove nem se move.
Publicado em VEJA de 31 de janeiro de 2018, edição nº 2567