Memória: Aloysio de Andrade Faria, Shere Hite e Terence Conran
O modernizador dos bancos, a sexóloga americana e o designer inglês
A discrição e a paixão por cavalos e obras de arte eram as marcas de Aloysio de Andrade Faria, o gastroenterologista mineiro que ajudaria a construir a face moderna do mercado financeiro no Brasil. Em 1948, ele e o irmão mais novo, Gilberto, herdaram do pai o Banco da Lavoura — gênese do que seria o Banco Real, fundado em 1971 e vendido em 1998 ao holandês ABN Amro, depois comprado pelo Santander. Em mais de oitenta anos de intensa atividade profissional, Faria criou um grupo empresarial que incluía o Banco Alfa — erguido depois da venda do Real —, a rede de hotéis Transamérica, a cadeia de loja de materiais de construção C&C, a fabricante de água mineral Águas da Prata, a sorveteria La Basque e emissoras de rádio. Uma placa onipresente nas companhias do empresário indicava seu estilo de trabalho: “Ordem sem progresso é inútil, progresso sem ordem é falso”. Disse o ex-ministro da Fazenda Antônio Delfim Neto: “Ele pensou sempre em um sistema financeiro sofisticado e eficaz, como instrumento de um desenvolvimento seguro e mais equânime. Tinha aquela sabedoria que combinava o saber prático e um ideal de justiça”. Faria completaria 100 anos em novembro. Morreu em Jaguariúna, no interior de São Paulo, em 15 de setembro, de causas naturais.
Uma revelação feminina
Em 1976, um livro explodiu como manifesto em todo o mundo, O Relatório Hite — Um Profundo Estudo sobre a Sexualidade Feminina. Sua autora, a sexóloga americana Shere Hite, entrevistou 3 000 mulheres, de até 78 anos, para que relatassem suas experiências de prazer. A estrondosa revelação hoje soa quase ingênua: as mulheres podem atingir orgasmos sem relação sexual convencional, e mesmo sem a presença de um homem. Shere tinha 77 anos. Morreu em Londres, em 9 de setembro, de causas não reveladas pela família.
O inventor da elegância britânica
Cego do olho esquerdo de nascença, o designer inglês Terence Conran ajudou a construir a imagem do Reino Unido como um lugar de apreço por móveis e objetos caprichados, modernos mas sem exageros, como se tivessem sido retirados das salas domésticas para as prateleiras do comércio. A Habitat, a sua mais celebrada e bem-sucedida loja, influenciaria outros negócios pelo mundo todo, como a sueca Ikea e, no Brasil, a Tok&Stok. Conran foi sempre celebrado por ter suprido uma suposta falta de gosto da cultura britânica por ideias mais elegantes — introduziu a gastronomia francesa de estilo bistrô em endereços cafonas, apresentou as cadeiras escandinavas, as luminárias italianas e os móveis de linhas retas. Bem-humorado, ele mesmo pedia crédito por ter impulsionado a vida sexual dos ilhéus ao lhes apresentar o edredom. O centro de suas atividades era o bairro de Chelsea, entre a nobreza do Velho Mundo e a gentrificação. Tinha 88 anos. Morreu em Berkshire, na Inglaterra, em 12 de setembro, de causas não reveladas pela família.
Publicado em VEJA de 23 de setembro de 2020, edição nº 2705