A curiosidade como modo de vida
Os smartphones e os tablets não existiriam sem o trabalho do alemão Peter Gruenberg, ganhador do Prêmio Nobel de Física em 2007, em parceria com o cientista francês Albert Fert. Nos anos 80, a dupla descobriu a magnetorresistência gigante, que permite armazenar mais dados em menos espaço nos discos rígidos. Foi o atalho para que os discos que equipam os aparelhos eletrônicos se tornassem cada vez menores. O estudo que os levou à premiação baseia-se nos princípios da nanotecnologia. Camadas de cobalto e cobre aplicadas aos leitores fazem com que eles se tornem extremamente sensíveis, aptos a detectar gravações em áreas muito menores do que nos sistemas convencionais. Fert, o parceiro de Gruenberg, saiu-se com uma tirada ao cruzar com alguns de seus alunos no dia do Nobel, há onze anos. Eles levavam iPods. “Vocês se queixam de estudar física? É ela que permite a vocês escutar música nesses aparelhos.”
O iPod saiu de linha, mas os benefícios do achado de Gruenberg, não — e certamente perdurarão por décadas, num belo casamento entre a ciência e a realidade das coisas práticas e cada vez mais diminutas. Ele gostava de recordar, sempre que possível, como se dera seu primeiro contato com o mundo dos laboratórios e como o interesse infantil o entusiasmou durante toda a vida. Ainda criança, dizia ter se encantado com a forma como os planetas orbitam o Sol. Buscou entendê-la e nunca mais abandonou esse tipo de procura pela compreensão do que parecia insondável, com a curiosidade a alimentá-lo. Em um comunicado sobre a morte de Gruenberg, o Centro de Pesquisa Juelich, na Alemanha, um dos maiores da Europa, ao qual ele era vinculado e onde deu aulas até 2004, afirmou: “Sem exagerar, pode-se dizer que sua descoberta mudou nossa vida”. Os motivos da morte de Gruenberg não foram revelados. Ele tinha 78 anos.
Canções para arrochar
![Fossa – A rainha de um estilo tratado como uma versão moderna da seresta](https://veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2018/04/nira-guerreira_c2a9correio-da-bahia.jpg?quality=70&strip=info&w=650)
Surgido na Bahia no início da década passada, o arrocha é uma versão moderna da antiga seresta. As baladas românticas ganharam a adição de teclado eletrônico e de saxofone. Os temas se assemelham aos contos de amor perdido do universo sertanejo. O termo surgiu do inevitável agarra-agarra (ou “arrochar”) do público que ia se esbaldar ao som de artistas do gênero. Uma das mais queridas era Nira Guerreira, que morreu, na segunda-feira 9, por complicações de um câncer de pulmão. A cantora, de 56 anos, era uma das principais vozes do estilo, ao lado de Nara Costta, Pablo e Silvanno Salles. Seu repertório, além das inevitáveis canções de fossa, tinha sucessos pop vertidos para a eletrônica baiana — ela cantava, por exemplo, Apenas Mais Uma de Amor, de Lulu Santos.
A carreira de Nira começou em 2001, quando ela se apresentava nas noites de Salvador. A cantora inclusive criou uma iguaria para acompanhar suas performances: um cozido de carnes, verduras e pirão. O cozido de Nira Guerreira, como foi apelidado, virou combustível de um evento que percorria a capital baiana. Embora seu trabalho nunca tenha passado a fronteira da Bahia, Nira emplacou alguns hinos. Um deles, A Culpa É Sua, sobre uma mulher traída, foi entoado em seu funeral por uma multidão de fãs.
Publicado em VEJA de 18 de abril de 2018, edição nº 2578