Até aliados de Jair Bolsonaro dizem que a postura dele durante a pandemia de Covid-19, marcada por negacionismo científico e falta de solidariedade às vítimas, contribuiu para que o capitão perdesse a eleição de 2022 e se tornasse o primeiro presidente da República a fracassar na tentativa de conquistar a reeleição.
Diante do precedente, Lula reagiu rapidamente ao maior desastre natural da história do Rio Grande do Sul. O presidente já visitou três vezes o estado, anunciou medidas bilionárias para socorrer os desabrigados e a economia local e até visitou um abrigo improvisado, como forma de fazer um contraponto à falta de empatia imputada ao seu antecessor.
O destaque dado à atuação do petista incomodou Bolsonaro, que não pôde viajar de imediato ao Rio Grande do Sul, onde bateu Lula no segundo turno de 2022, por ter ficado doze dias internado num hospital em São Paulo em razão de um tratamento para erisipela. Depois de receber alta, o ex-presidente anunciou uma espécie de contra-ataque.
Trincheira das redes sociais
Em seu canal no Telegram, que tem mais de 1,7 milhão de inscritos, Bolsonaro avisou que, “já recuperado”, fará um giro por seis municípios de São Paulo, entre os dias 27 de maio e primeiro de junho, para recolher doações para o Rio Grande do Sul. Ele até sugere itens, como colchão, cesta básica e materiais de limpeza e higiene pessoal.
Bolsonaro também prestou contas da atuação de dois de seus filhos parlamentares nos esforços de reação à tragédia no Sul. “Enquanto estive no hospital, meu filho Carlos Bolsonaro esteve no Rio Grande do Sul, na região serrana de Bento Gonçalves, revelando as peculiaridades dos problemas locais, expondo situação catastrófica do Vale, algo pouco exposto na mídia convencional, que está focada na região de Porto Alegre, Lajeado e Canoas”, escreveu o ex-presidente.
Ele ainda destacou que seu filho Eduardo Bolsonaro, deputado federal, remanejou parte de suas emendas parlamentares para áreas afetadas pela enchente. Não especificou quanto nem para quais municípios. Enquanto ainda estava hospitalizado, Bolsonaro divulgou um vídeo que, com o objetivo de reforçar a versão de que é perseguido pela mídia tradicional, ironiza a cobertura da imprensa. Na peça, um dublê de repórter de TV abre sua fala da seguinte forma: “O que está acontecendo aqui no Rio Grande do Sul é o que eu chamaria de novo genocídio do governo Bolsonaro. É um completo descaso desse governo fascista”.
A lacração e a ironia são armas conhecidas do ex-presidente. Segundo seus próprios aliados, ele talvez não precisasse usá-las se não tivesse adotado uma postura de descaso diante das mais de 700 000 mortes provocadas por Covid-19 no Brasil. Sua frase “Não sou coveiro, tá” custa caro para ele até hoje.