De férias, o ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres não estava no país quando Brasília foi tomada por uma horda de bolsonaristas que depredou as sedes dos três poderes, na região central da cidade, mas diz ter deixado pronto um plano de isolamento completo da Esplanada dos Ministérios, avalizado pelas polícias Civil, Militar e Rodoviária Federal e pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin), para garantir a segurança da capital contra os movimentos que desde o final do segundo turno protestavam em frente a quartéis generais. Não adiantou. Foi demitido sumariamente pelo governador Ibaneis Rocha (MDB) e é alvo de um pedido de prisão feito pela Advocacia-Geral da União. “Não havia perspectiva de invasão”, defende-se.
Bolsonarista convicto e ex-ministro da Justiça do governo que se encerrou em dezembro, Torres compara o planejamento das autoridades de segurança para as manifestações de domingo ao projeto de contingência do governo do DF no feriado de 7 de Setembro, quando as instituições temiam que Jair Bolsonaro utilizasse seu capital político para insuflar atos de violência. Há dias as forças de segurança monitoravam grupos de apoiadores do ex-presidente, mas Torres diz que, vendo em retrospectiva, o diagnóstico é outro: “Havia um grupo de terroristas muito bem preparado”.
A seguir os principais trechos da entrevista de Anderson Torres a VEJA:
O que ocorreu em Brasília foi comparável à invasão do Capitólio nos Estados Unidos? Não admito que questionem minha lisura. Estou com minha família em Orlando, com férias programadas. Vim para os Estados Unidos para realizar o sonho das minhas crianças e estou vivendo um inferno. Estou muito triste, muito abalado.
O senhor fez um planejamento, mas os protestos descambaram para violência e depredação. Não conseguiram detectar o risco de invasões? Não havia perspectiva de invasão do Palácio do Planalto. Enquanto secretário de Segurança, meu papel foi aprovar um planejamento no Centro Integrado de Operações de Brasília e do qual participaram Polícia Militar, Polícia Civil, Bombeiros, Detran, a Polícia Rodoviária Federal, o DER (Departamento de Estradas e Rodagem) e a Abin (Agência Brasileira de Inteligência). Juntaram-se todos e fizeram um planejamento para o dia desta manifestação. Eu perguntei se era satisfatório e eles disseram que era um planejamento feito mais ou menos nos moldes do 7 de Setembro.
Ele previa o quê? Esse planejamento proibia o acesso de carros na Esplanada e de pessoas à Praça dos Três Poderes, além de desviar caminhões para a Granja do Torto. Este planejamento dizia o que cada órgão tinha de fazer, dando autonomia para cada instituição definir a melhor estratégia. Eu olhei o planejamento e disse: “Realmente, não vão entrar pessoas na Praça dos Três Poderes’. Se eu aprovei um planejamento que proibia entrar pessoas na Praça dos Três Poderes, como é que eu ia dizer que ia ter invasão de prédios públicos?
Houve corpo mole da Polícia Militar, tida como bolsonarista? Eu não sei se é corpo mole. Eu fui surpreendido pelo telefone. Cada órgão era responsável por definir quantos policiais seriam necessários para cumprir o planejamento de segurança. A PM faz isso toda semana. Não é uma coisa inédita para eles.
Se os principais órgãos de segurança e instituições sabiam previamente da manifestação, por que houve atos de vandalismo? Sabíamos que haveria a manifestação e foi feito o planejamento. É uma operação complexa. Não tem como dizer: “A culpa é de fulano”. Como secretário de Segurança, não fiz nada de errado. O planejamento operacional que eu concordei proibia todos esses acessos.
O fato de vários manifestantes portarem máscaras contra gás indica que os atos de depredação foram premeditados? Dessa vez os caras realmente sabiam o que eles queriam. Tinham máscaras, estilingues. Havia um grupo de terroristas ali muito bem preparado. É uma loucura.
Como reagiu ao pedido da Advocacia-Geral da União para sua prisão? Fiquei extremamente chateado. Prisão por quê? O que é que eu fiz? Nem em Brasília eu estava. Quem estava no comando da operação era o secretário-adjunto. Estou a 8.000 quilômetros de distância, vou ser preso por isso? Eu tenho culpa nisso?