Fundado em 1994, o PSL passou mais de duas décadas no ostracismo da selva partidária brasileira, até fazer uma aposta certeira: acolher o então deputado Jair Bolsonaro na corrida presidencial de 2018. A improvável vitória do capitão anabolizou o partido criado pelo empresário pernambucano Luciano Bivar. O PSL passou a contar, além do presidente da República, com a segunda maior bancada na Câmara (52 deputados federais, entre os quais o próprio Bivar), quatro senadores e três governadores. Mas a festa durou pouco. A escalada de sucesso foi interrompida devido a suspeitas de irregularidades em campanhas e disputas internas, sendo que a principal delas culminou com a saída de Bolsonaro da sigla. Apesar dos reveses, o período de alta ainda deixou um legado importante, que, em teoria, representa uma vantagem na disputa das eleições deste ano: 10,1% do tempo na propaganda gratuita e quase 200 milhões de reais de fundo partidário à disposição de seus candidatos. Tais recursos, no entanto, parecem insuficientes até aqui para evitar um vexame nas urnas em novembro.
A campanha está apenas começando, mas os primeiros sinais já acenderam o sinal vermelho de alerta. Nas treze capitais em que a sigla lançou candidatos, a mais bem colocada nas pesquisas é Vanda Monteiro, terceira posição em Palmas, com 8% das intenções de voto, segundo o Ibope. Em Curitiba, o instituto de pesquisas mostra Fernando Francischini em segundo lugar, mas com apenas 6% da preferência (Rafael Greca, do DEM, tem 47% e pode ganhar no primeiro turno). Nas duas maiores cidades do país, São Paulo e Rio de Janeiro, os deputados Joice Hasselmann e Luiz Lima têm 1% cada um — os dois tentam ganhar espaço entre o eleitorado de direita contra o deputado Celso Russomanno e o prefeito Marcelo Crivella, respectivamente, ambos do Republicanos e depositários da simpatia do clã presidencial. No caso de Lima, nem o fato de ser vice-líder do governo Bolsonaro na Câmara lhe garantiu o apoio do presidente.
A exemplo de outras siglas em má posição no início da disputa, o PSL aposta a maioria de suas fichas em uma virada com o início do horário eleitoral (veja matéria na pág. 44). Especialistas avaliam que o peso da propaganda gratuita e do dinheiro foi menor em 2018 porque a eleição foi atípica, com partidos e a política tradicional desgastados. “Com dinheiro e tempo de TV, o PSL não pode ser desprezado”, avalia o cientista político Carlos Pereira, da FGV. O partido quer convencer os eleitores de que também ficou mais longe das confusões. Depois das suspeitas sobre uso de candidaturas femininas laranjas, o PSL contratou a consultoria Alvarez & Marsal para criar regras de compliance internas e adotou um sistema que libera os recursos só depois de um cadastro detalhado dos postulantes.
Grande parte das dificuldades atuais do PSL está ainda relacionada à saída traumática do presidente, que abriu um rombo político difícil de ser resolvido no partido. Na esteira da deserção de Bolsonaro, os governadores de Rondônia e Roraima deixaram o partido, e o de Santa Catarina está seriamente ameaçado por um processo de impeachment. O PSL na Câmara rachou entre bolsonaristas e bivaristas, e metade da bancada do Senado evaporou, com a saída de Flávio Bolsonaro (RJ) e a cassação de Selma Arruda (MT). A passagem de Bolsonaro pelo PSL teve tamanho impacto na sigla que alterou o perfil de quem se candidata pelo partido. Nas eleições municipais de 2016, 55,5% dos 10 555 candidatos eram pretos e pardos e metade das 162 candidaturas a prefeito se concentrava no Nordeste. Na época, policiais civis, policiais militares, bombeiros e militares aposentados somavam apenas 137 candidatos. No pleito de 2020, o número total de concorrentes saltou para 21 979, dos quais 53,4% são brancos e 616 profissionais ligados à segurança pública. Depois da saída tumultuada do presidente, há negociações pela volta do capitão à sigla, mas elas foram suspensas até a eleição à presidência da Câmara. Nada é garantido. Ao mesmo tempo que manda mensagens de uma possível reconciliação, Bolsonaro flerta firmemente com o Republicanos. Ou seja, não há nenhum fato político no curto prazo que possa influenciar nas eleições de novembro e só uma improvável virada vai evitar uma derrota que pode significar o início de uma queda acelerada. O risco é o PSL caminhar rapidamente de volta ao ostracismo das siglas nanicas.
Publicado em VEJA de 14 de outubro de 2020, edição nº 2708