Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana
Continua após publicidade

Quem é a infectologista que guia Pazuello no Ministério da Saúde

O braço direito do general defende o uso da cloroquina para tratar a Covid-19

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 15h36 - Publicado em 21 ago 2020, 06h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • No início de agosto, o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, conversavam, em transmissão ao vivo, sobre o aparecimento de novas doenças no mundo quando surgiu uma dúvida: o nome do medicamento utilizado para tratar a aids, causada por um vírus que assombrou o planeta na década de 80. “Eu sei que tu não é médico, mas (para) HIV, no passado, usava-se Tamiflu, é isso?”, perguntou Bolsonaro. Diante da resposta de que o citado remédio era usado, na verdade, para tratar a gripe influenza, o presidente insistiu em saber qual era o tratamento para a aids. Com alguma insegurança, Pazuello disse que era o AZT. Em meio às dúvidas, Bolsonaro se voltou para uma pessoa que não aparecia no vídeo. “Era Tamiflu? Tomava o quê?”, indagou. “Não, era Zidovudina”, respondeu uma voz feminina. Ele continuou confuso: “Fala, fala, traduz, está feio, está esquisito”, disse. “É o AZT!”, ela encerrou. Na sequência, Bolsonaro e Pazuello discorreram sobre a cloroquina, o remédio preferido do presidente da República, e a figura oculta do vídeo foi novamente acionada para explicar sobre as diferentes aplicabilidades da medicação. Dessa vez, Bolsonaro celebrou: “Olha a doutora ali!”.

    50196323083_90c7c5b1b6_o.jpg
    FORÇA NOS BASTIDORES – A médica Laura Appi: “Olha a doutora ali!” – (Erasmo Salomão/Ministério da Saúde/.)

    A tal doutora do vídeo tem sido constantemente acionada para solucionar dúvidas médicas — não só na live do presidente. Primeiro-tenente do Exército, a infectologista Laura Appi é uma guia para Eduardo Pazuello, general especialista em logística e que admite ser leigo na área da saúde. Ela é uma espécie de faz-tudo do ministro interino: atuou na prospecção para a compra de respiradores, acompanha-o em viagens e reuniões, ajuda desde a decifrar estudos científicos até que o general se adapte ao linguajar específico da medicina — bem diferente daquele empregado em um quartel. Appi já teve Pazuello como um paciente informal. Em julho, o ministro recorreu à infectologista nas primeiras horas do dia bastante preocupado. Dizia que estava com dificuldades para respirar e achava que tinha sido contaminado pelo coronavírus. A doutora, com toda a sua tranquilidade, recomendou a ele que inspirasse o ar tão forte quanto possível. Pazuello obedeceu e, diante da constatação de que ele respirava bem, a médica disse que o ministro, que havia exagerado no jantar no dia anterior, deveria sofrer apenas de uma indigestão. O diagnóstico foi acatado — e, ao que tudo indica, estava correto.

    Pazuello costuma apresentar a auxiliar da seguinte maneira: “Eu sou o porta-voz dela, entendeu? O que ela fala, eu falo”. As declarações da doutora Appi, no entanto, nem sempre são uma unanimidade no meio médico. Ela defendeu, por exemplo, a tese de que pacientes assintomáticos da Covid-19 não transmitem a doença — hipótese que a Organização Mundial da Saúde (OMS) já ventilou, mas acabou recuando. A parceria dos dois vem de antes do ministério. A infectologista de 32 anos trabalhou com o general em Manaus, quando ele comandava uma região militar, e também em Roraima, ajudando a estruturar o hospital de campanha que recebe refugiados venezuelanos. Formada em medicina em 2014 e começando a residência médica no ano seguinte, Appi viu sua carreira dar um salto com a ida do general a Brasília, em maio passado: ela foi nomeada num dia e, no dia seguinte, já estava reunida com Jair Bolsonaro e ministros do governo para discutir a incorporação da cloroquina aos remédios usados para tratar a Covid-19.

    49909498971_7f1f0bf0dc_o.jpg
    EMINÊNCIA PARDA – Pazuello, brincando: “Eu sou o porta-voz dela” – (Erasmo Salomão/Ministério da Saúde/.)
    Continua após a publicidade

    Sob as orientações da doutora, o controverso medicamento, de eficácia não comprovada cientificamente, foi incluído na lista de manejo da pasta logo depois, passando a ter sua dosagem indicada para cada fase da doença. O ministro, por sinal, mantém em sua mesa um relatório, elaborado por Appi, com estudos sobre possíveis benefícios da cloroquina para ajudar o tratamento na fase inicial da doença. Apesar do endosso ao medicamento, ela é cautelosa ao falar sobre o assunto: diz que o ministério não aderiu a nenhum protocolo e que cabe ao médico a recomendação. E dá um exemplo: ela jamais indicaria o remédio a Pazuello, caso ele tivesse sido contaminado, já que o ministro apresenta problemas no coração.

    Entre março e agosto deste ano, o Ministério da Saúde distribuiu mais de 5 milhões de comprimidos de cloroquina a todos os estados brasileiros — o triplo do que foi repassado ao longo de todo o ano de 2019 para o tratamento de malária, cuja eficácia, nesse caso, é comprovada. Na lista estão inclusive governos que fazem oposição a Bolsonaro e à pregação oficial do uso do medicamento. São Paulo, por exemplo, está no topo: já recebeu quase 700 000 comprimidos. Na sequência vêm Pará e Alagoas. O ministério informa que o repasse é feito sob demanda das Secretarias de Saúde e que, atualmente, não há disponibilidade para atender todas. Ao que parece, além do ministro, a “doutora” vem expandindo sua influência Brasil afora.

    Publicado em VEJA de 26 de agosto de 2020, edição nº 2701

    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Semana Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    Apenas 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

    a partir de 35,60/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.