Passava pouco das oito horas da noite deste domingo, 21, quando o governador de São Paulo João Doria e o ex-prefeito Arthur Virgílio vieram a público após a tumultuada votação – suspensa por volta das 18 horas – das prévias do PSDB, que tinham como objetivo escolher o candidato tucano à Presidência da República. As declarações que se seguiram – de ambas as partes – escancararam o racha dentro do partido, que tem representantes a favor de uma candidatura própria, apoiadores de se abrir mão de uma cabeça de chapa caso um outro representante da terceira via se mostre mais viável e mesmo altos dirigentes que consideram a ideia se emplacar a candidatura a vice de alguém mais competitivo.
Internamente, o PSDB já sabia que era preciso ter um plano B caso o aplicativo desenvolvido para que cerca de 45.000 tucanos escolhessem o presidenciável do partido não funcionasse a contento. O projeto de uma votação alternativa, no entanto, não se viabilizou, e o fato de o programa ter sido feito em uma universidade de Pelotas, cidade onde o terceiro candidato nas prévias, Eduardo Leite, foi prefeito, apenas serviu de fermento para as críticas de Doria e Virgílio após a suspensão das prévias. Entre os correligionários, não conseguiram votar autoridades como Fernando Henrique Cardoso, José Serra, a senadora Mara Gabrilli e o próprio candidato Arthur Virgílio.
Ao se manifestar após a suspensão das prévias, Doria atacou “aqueles que querem melar as prévias do PSDB” e defendeu que o processo de escolha do candidato da sigla na corrida presidencial seja concluído no próximo domingo. Desafeto declarado do deputado e ex-presidente tucano Aécio Neves, o governador de São Paulo disse que “o PSDB vai passar naturalmente por um processo de depuração e isso está absolutamente claro durante o processo das prévias”. O recado não poderia ser mais claro: Aécio defendia que a legenda avaliasse a possibilidade de não ter candidato próprio em 2022 e direcionasse o caixa partidário para a formação de uma bancada robusta na Câmara dos Deputados, já que nos últimos anos os tucanos vêm perdendo seguidamente relevância como força de contraposição ao PT. Neste cenário, Leite seria apresentado como um possível nome a vice, o que ele nega publicamente.
“O PSDB será melhor sendo um partido transparente, um partido de oposição ao atual governo, como aliás foi definido e não é plenamente praticado, do que ser um partido em uma dimensão onde as divergências impeçam que ele tenha respeitabilidade e a dimensão que sempre teve”, disse Doria, para, na sequência, emendar que o aplicativo alvo de panes neste domingo é “circunstancialmente é de Pelotas, no Rio Grande do Sul”, berço eleitoral de Leite, candidato apoiado por Aécio nas prévias.
O ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio, que embora também seja pré-candidato tem feito dobradinha com Doria, foi ainda mais explícito nos ataques ao principal cabo eleitoral de Eduardo Leite. “É natural que nos unamos para impedir que a mediocridade e a mesmice tomem conta de uma vez por todas do PSDB. (…) Temos uma bancada que tem se comportado como bolsonarista nas mais importantes votações. Considero o PSDB um caminhão de maçãs boas, mas uma está estragando bastante as outras. E eu dou nome e sobrenome, Aécio Neves”, criticou.
Segundo Virgílio, Eduardo Leite, ao longo do dia, propôs que as prévias fossem retomadas apenas em fevereiro, o que foi negado pelo governador do Rio Grande do Sul. Ladeado pelos senadores Tasso Jereissati e José Aníbal – e sem a presença de Aécio – Leite defendeu que o processo de escolha do candidato tucano seja concluído em 48 horas e disse que o alto nível de rejeição de João Doria entre o eleitorado pode tornar proibitiva a participação tucana no pleito de 2022. Conforme mostrou VEJA, os índices de repulsa do eleitor aos principais postulantes na cadeira presidencial atingiram níveis recordes e mobilizaram as campanhas dos presidenciáveis a tentar reverter a aversão do brasileiro à classe política.
“Vou exigir um processo limpo de transparente. O PSDB tem que ter candidato que seja a cara do partido, e não o partido se tornar a cara do candidato pelas suas especificidades. As pesquisas acreditam que nossa candidatura é mais viável do que a do nosso principal adversário. A rejeição inviabiliza essa candidatura [de Doria]”, afirmou Leite antes de participar ainda na noite deste domingo de uma reunião onde os candidatos e a cúpula partidária decidirão quando ocorrerão os novos capítulos das prévias.
Um dia depois da pane no sistema de votação, Aécio Neves rebateu as críticas dos correligionários, não sem antes estocar os desafetos Dória e Virgílio. “Faz muito tempo que o Arthur Virgílio se transformou numa figura pouco relevante no PSDB, onde ninguém o leva muito a sério. (…) Poucos acreditavam que, dessa vez, ele se prestaria ao papel de linha auxiliar da candidatura de João Dória e, mais grave, com financiamento do partido para isso. Triste desfecho para uma longa trajetória. Por outro lado, eu até me diverti com a analogia com frutas que ele fez. Quando encontrá-lo vamos ter uma conversa no pomar. Da maçã do PSDB com o laranja do Dória”, disse o tucano. “Essa história de querer levar o PSDB para o Centrão é mais uma falsa narrativa criada para desqualificar o apoio ao Eduardo Leite que muitos tucanos têm dado. O que eu e vários companheiros do PSDB queremos, é uma candidatura forte na terceira via que possa aglutinar outras forças da sociedade. E eu sinceramente não consigo enxergar no governador Doria esse nome”, completou.