Com a captura da pauta da segurança pública por campanhas eleitorais vitoriosas no campo da direita, o presidente Lula enfim reuniu governadores aliados e oposicionistas, no final de outubro, para apresentar o que é tratado como um ensaio de reação ao mau desempenho do PT nas eleições municipais: a oficialização de uma proposta de emenda constitucional (PEC) para criar um plano de coordenação nacional de todas as polícias do país e viabilizar um fundo único de financiamento para ações estratégicas de combate ao crime. Além da conhecida resistência de governadores, que temem perder o controle das polícias civis e militares, as ressalvas à PEC encontram guarida também em setores do próprio governo.
Interlocutores do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, responsável por colocar o texto da proposta de pé, identificaram entraves, por exemplo, na Casa Civil, cujo titular, Rui Costa, foi governador da Bahia e, a exemplo dos chefes de Executivo estaduais, teria postura crítica ao que vem sendo chamado de constitucionalização do Sistema Único de Segurança Pública (Susp).
Além de o primeiro rascunho da proposta ter ficado adormecido nos escaninhos da Casa Civil desde o início do ano, um outro episódio passou a ser lembrado por críticos do ministro: Costa era governador quando, em 2020, bateu às portas do Supremo Tribunal Federal (STF) para proibir o uso da Força Nacional de Segurança Pública em assentamentos agrários na Bahia sem o aval do Executivo estadual.
Na ocasião, o Ministério da Agricultura havia pedido socorro, mas o governo alegou na justiça que a presença das tropas nos municípios baianos era ilegal porque não tinha havido consulta prévia aos gestores estaduais. Na ocasião, Lewandowski integrava o STF e deu razão a Rui Costa. O episódio, porém, hoje é lembrado por interlocutores do Ministério da Justiça como exemplo da reticência de Rui em endossar propostas como a PEC da Segurança pelo suposto risco de tisnar na autonomia das policiais estaduais.
Pelo texto construído pelo Ministério da Justiça, o Sistema Único de Segurança Pública permitiria que a União definisse diretrizes nacionais de combate ao crime e concentrasse informações da Polícia Federal, Rodoviária Federal, polícias penais, militares e civis, além da Força Nacional para a troca de dados de inteligência e ações unificadas. Às polícias federal e rodoviária ficaria incumbido combater milícias e grupos armados nas principais cidades do país.
Atualmente os dois fundos federais que reúnem verbas para segurança pública e para o sistema penitenciário têm, somados, apenas 3,6 bilhões de reais em orçamento. É menos que o faturamento anual estimado do PCC, a maior facção criminosa do país, e também aquém dos quase 5 bilhões a que partidos políticos tiveram direito para as campanhas municipais nas quais a própria segurança foi uma das principais pautas.