O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), se tornou a maior pedra no sapato do presidente Jair Bolsonaro no tortuoso caminho rumo à reeleição em 2022. Moraes é relator do inquérito das fake news — que passou a investigar Bolsonaro por conta dos ataques infundados às urnas eletrônicas –, supervisiona a investigação sobre a interferência do chefe do Executivo na Polícia Federal e cuida da apuração “filhote” sobre a organização e financiamento de atos antidemocráticos. Nesse último caso, Moraes acolheu um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para arquivar o inquérito dos protestos contra a democracia, mas abriu uma nova frente de investigação, voltada para se debruçar sobre uma organização criminosa que atenta contra o regime democrático na esfera virtual. Os três casos fecham o cerco sobre o presidente da República, empresários bolsonaristas e aliados, principalmente os integrantes do chamado “gabinete do ódio”.
As preocupações do Palácio do Planalto, no entanto, não se limitam aos processos que tramitam no Supremo. Em agosto do ano que vem, Moraes vai assumir o comando do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Corte onde já atua — e será responsável por chefiar as atividades da Justiça Eleitoral durante o próximo pleito. No recesso de julho, Moraes compartilhou com o TSE as provas do inquérito dos atos antidemocráticos — Bolsonaro tentou obter acesso aos documentos, mas o pedido foi negado. O ministro também é defensor, há meses, de incluir o mandatário no rol de investigados do inquérito das fake news. Na tarde da última segunda-feira, Moraes, Barroso, Edson Fachin e Gilmar Mendes costuraram a resposta do Judiciário aos crescentes ataques de Bolsonaro. Depois, os ministros se reuniram com os colegas do TSE, no gabinete de Barroso, para afinar o discurso e acertar os detalhes. Não houve resistências.
Em dois placares unânimes, o TSE decidiu enviar a live de Bolsonaro do último dia 29 — em que ele admite não ter provas de fraudes, mas dispara uma série de ataques a Barroso e à Justiça Eleitoral — para ser investigada no inquérito das fake news, que tramita no STF. O pedido já foi acolhido por Moraes. Em outra ofensiva, os ministros também decidiram abrir um inquérito administrativo, dentro do próprio TSE. O objetivo dessa segunda investigação é apurar suposto abuso de poder econômico e político, uso indevido dos meios de comunicação, corrupção, fraude e propaganda eleitoral antecipada. “A investigação visa coibir abusos que estejam sendo cometidos. Os fatos apurados podem embasar uma ação futura, quando forem escolhidos os candidatos, podendo levar à cassação do registro ou do diploma, bem como gerar inelegibilidade por oito anos”, aponta o ex-ministro do TSE Henrique Neves.
Nos bastidores, Moraes também assumiu um papel-chave para desarmar a bomba do voto impresso. O ministro fez uma série de conversas — presenciais e a distância — com parlamentares para convencê-los dos riscos de retrocesso da medida. Inócuo e de custo bilionário, o voto impresso já foi testado em 2002, quando não agregou nada em termos de segurança nas seções onde foi implantado. Quando o cenário parecia favorável à aprovação da medida na comissão da Câmara, Moraes avisou a um interlocutor que viajaria para Brasília e entraria em campo. “Não me subestime”, disse.
Deputados ouvidos por VEJA avaliam que a abordagem de Moraes, que já atuou no Executivo e tem melhor traquejo político, deu mais resultados que a de Barroso, criticado reservadamente na Câmara pelo tom “professoral” nas conversas com parlamentares. Não à toa, o futuro presidente do TSE entrou na mira dos recentes ataques de Bolsonaro. “A hora dele vai chegar”, ameaçou Bolsonaro. Moraes não é o tipo de autoridade que se intimida com bravatas. O ministro costuma dizer que o “couro” ficou ainda mais resistente depois de ser secretário de segurança pública de São Paulo e ministro da Justiça do governo Michel Temer.