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Indefinição e intrigas marcam bastidores da disputa pela chefia da Câmara

Candidatos à presidência da Casa intensificam suas campanhas — para o governo Lula, a escolha é crucial para a garantia da estabilidade

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 14 jul 2024, 08h00
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  • “Alô, Antonio Brito!”, celebrava o cantor Dudu Nobre, intercalando entre um samba e outro uma homenagem ao anfitrião da noite. Abaixo do palco, um sorridente Brito, como é chamado o deputado do PSD, circulava entre figuras como Gilberto Kassab, presidente do seu partido, e Valdemar Costa Neto, o mandachuva do PL de Jair Bolsonaro, além de ministros e parlamentares aliados a Lula, numa festança regada a camarões, uísques e vinhos, num restaurante de Brasília, na última terça-feira, 9. “O negócio está bom, não está?”, comemorava o parlamentar, que promoveu o evento para, oficialmente, parabenizar os aniversariantes de sua bancada. No dia seguinte, foi a vez de o deputado Elmar Nascimento (União Brasil-­BA) figurar como a estrela da noite. Para comemorar os seus 54 anos, ele também preparou um cardápio etílico e gastronômico caprichado, com direito a costelão e churrasco a noite inteira. Embalada pelo batuque do grupo Timbalada, a festa recebeu a nata da política nacional, e ao menos doze ministros do governo, entre eles o vice-­presidente Geraldo Alckmin, marcaram presença. Os rega-bofes bem frequentados são comuns na capital federal, mas esses tinham uma motivação diferente.

    Tanto Brito quanto Nascimento, os donos das festas, foram chamados de “presidente” por alguns de seus convidados, numa referência à campanha, já na rua, para decidir quem vai assumir o comando da Câmara dos Deputados a partir do ano que vem. Ambos são candidatíssimos, disputam palmo a palmo o apoio dos colegas, promovem esse tipo de evento para demonstrar poder, mas sabem que a peleja pode acabar sendo decidida de maneira indireta. Se nada mudar, foi combinado entre os partidos que Arthur Lira (PP-­AL), o atual ocupante da cadeira, vai submeter ao presidente Lula o nome de quem vai sucedê-lo. Se o presidente der sinal verde, o escolhido será ungido ao cargo. Em contrapartida, garantirá uma vida tranquila ao governo e influência política a Lira, que quer manter o protagonismo quando deixar a função, a partir de fevereiro de 2025.

    Por esse roteiro, todos, em tese, sairiam ganhando. Ou quase todos. Há um movimento silencioso nos bastidores do Congresso. Alguns deputados veem os planos de Lira com desconfiança, traçam alternativas ao roteiro, aumentam a cobrança por barganhas e planejam uma reação caso não se sintam contemplados na escolha do cacique. Sabedor do movimento, o presidente da Câmara tenta costurar um acordo com os insatisfeitos para afastar surpresas mais à frente. O tal acordo, claro, passa por negociação de cargos relevantes, divisão de emendas parlamentares, promessa de dar guarida a pautas que atendam à esquerda e à direita e até mesmo uma cadeira de ministro do Tribunal de Contas da União. Lira quer evitar dissidências que possam minar o pacto que existe entre ele e os candidatos que já estão postos. Além de Elmar Nascimento e Antonio Brito, o deputado Marcos Pereira, presidente do Republicanos, é o terceiro nome na disputa — ele, aliás, foi o primeiro a promover uma “festa de campanha”, que reuniu centenas de autoridades para comemorar seu aniversário, em abril deste ano.

    FAVORITO - Elmar Nascimento (o segundo da dir. para a esq.): aniversário comemorado ao lado de ministros e deputados
    FAVORITO - Elmar Nascimento (o segundo da dir. para a esq.): aniversário comemorado ao lado de ministros e deputados (União Brasil/Divulgação)

    Hoje, o trio se esforça para aglutinar o apoio do maior número de partidos, o que vai ser decisivo para a definição de Lira. Amigo pessoal do presidente da Câmara, daqueles que frequentam a casa e juntam a família durante finais de semana e feriados, Nascimento é apontado como o preferido. Na última semana, a executiva do PDT aprovou um indicativo de apoio à candidatura de Elmar — antes, João Campos, o prefeito do Recife e um dos principais líderes do PSB, também anunciou apoio a ele, num gesto de flexibilização das legendas mais à esquerda ao nome do parlamentar. O deputado baiano também tenta se consagrar por meio de uma aproximação com o PT e o governo e até fez as pazes com o chefe da Casa Civil, Rui Costa, um antigo adversário na Bahia, mas que compareceu à sua festa de aniversário. Para Elmar, os problemas com o “meu amigo Rui” são águas passadas. Para políticos que acompanham a disputa de perto, a bandeira branca é apenas fictícia. Ou seja: Lula pode vetá-lo.

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    Em meio às articulações, os demais postulantes também são alvos de intrigas. Marcos Pereira, por exemplo, acumula versões de que estaria se distanciando de Lira, teria resistências do ex-presidente Jair Bolsonaro e que seu sonho, de fato, seja assumir uma cadeira no Supremo Tribunal Federal, e não o comando da Câmara. Antonio Brito, por outro lado, apesar de ser um “amigão” de deputados dos mais diferentes espectros políticos, é tratado como alguém que não aguentaria pressão do Palácio do Planalto diante de uma crise política e seria sempre tutelado pelo seu “chefe”, o dirigente do PSD, Gilberto Kassab. Todos, claro, negam divergências, embora eles mesmos às vezes alimentem as intrigas contra os concorrentes. Em público, se cumprimentam, se abraçam e frequentam as festas um do outro.

    Para o governo Lula, a escolha do próximo chefe da Câmara é crucial para a garantia da estabilidade no fim do terceiro mandato do presidente. Cada vez mais poderosos, os deputados direcionam o Orçamento federal e podem fazer avançar as temidas pautas-bomba ou engavetar projetos prioritários que renderiam ativos eleitorais à gestão petista. Hoje, entre os partidos com candidatos, inclusive uns de menor chance, como Isnaldo Bulhões (MDB-AL) ou Doutor Luizinho (PP-RJ), nenhum dá garantia de estar com Lula ou o PT nas eleições de 2026, apesar de todos serem formalmente aliados ao governo e ocuparem ministérios. Por isso, a cadeira da Câmara pode ser fonte de sossego ou de uma enorme dor de cabeça para o presidente da República.

    Publicado em VEJA de 12 de julho de 2024, edição nº 2901

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